Caminhando juntos: economia e meio ambiente
“Na espaçonave Terra não há passageiros. Todos somos tripulantes”.
Herbert M. McLuhan (1911-1980)
Inequivocamente, a primeira condição para mudar a realidade é conhecê-la. Os dados disponíveis, concernentes à agressão ambiental em escala mundial em nome do “progresso econômico (?)”, não deixam dúvidas: o forte desequilíbrio ambiental manuseado por mãos humanas que respondem aos ditames do deus-mercado precisa ser freado.
À medida que o consumo ganha maiores proporções e torna-se sinônimo de prosperidade material, os recursos naturais vão sendo dilapidados e o meio ambiente, eixo de todo o sistema vida, sofre as consequências: desequilibra-se o sistema de chuvas, altera-se radicalmente o clima, desmata, polui, agride-se os lençóis freáticos, chove onde deveria fazer sol, há seca onde deveria ter água.
A “salada química” é intensa: monóxido de carbono, dióxido de enxofre, eutrofização (degradação do ambiente aquático), pesticidas.
Na busca desenfreada pelo bem-estar, pelo conforto, o homem se fecha numa visão míope e rompe seus laços com a Mãe Natureza. Quem bem-estar é esse que degrada o ambiente? Que melhoria de vida é possível num ambiente natural caótico, desequilibrado, dilapidado? Isso é progresso? A expansão industrial, o ritmo alucinado do crescimento da economia somente fez violentar a natureza.
Em nome disso, passamos a valorizar mais o som da buzina dos automóveis ao som do canto dos pássaros. A fumaça das fábricas passou a ter mais valor que o cheiro do mato. A palavra de ordem dada pelo deus-mercado é CRESCER; pouco importa se a consequência disso seja DESTRUIR.
Urge inverter-se essa lógica. O relacionamento entre a Terra e a Economia tem de ser harmonioso, visto que a segunda parte da primeira. Aqui reforçamos a ideia de que a economia nada mais é que um subconjunto do meio ambiente. É necessário, portanto, criar-se, em todos os aspectos, a boa sincronia entre a economia (atividade produtiva) e o ecossistema (a base dos recursos naturais) para se chegar ao verdadeiro progresso; o progresso que se sustentará ao longo do tempo sem ter feito os estragos em sua base de sustentação.
Dito isso, é importante reiterar que o crescimento da economia (o crescimento físico) não pode acontecer sobre as ruínas do capital natural. O que tem acontecido é o oposto: de 1950 a 2000, a economia global foi multiplicada por sete, aumentando a produção de bens e serviços de US$ 6 trilhões para US$ 43 trilhões (dados de 2000). Conquanto, o que não foi respondido nesse mesmo período é a que “preços” ecológico e social esse crescimento elevado foi alcançado.
Enquanto a economia (atividade produtiva) que sustenta essa produção/consumo tem sido feita em benefício de poucos, na outra ponta, essa mesma economia é sustentada (em termos de produção e não de consumo) por muitos que jamais terão as mesmas as oportunidades dadas aos primeiros.
Disso advêm, certamente, as gritantes distorções no sistema de distribuição/consumo de bens e isso condena, de uma vez por todas, a economia (também enquanto ciência) a se desviar de seu pressuposto essencial: melhorar as condições de vida de todas as pessoas.
Definitivamente, a economia e a natureza não nasceram para condenar alguém à humilhação, à exploração, à pobreza material. Economia e Natureza, juntas, podem representar uma via de acesso às melhorias que levam ao almejado padrão de bem-estar social, desde que caminhem juntas, numa “parceria” sem exploração voraz, mas numa sintonia de contemplação. A esse respeito, Jean-Michel Cousteau assim ponderou: “a economia e a ecologia não devem ter conflitos porque hoje são exatamente a mesma coisa”.
O curioso é que no passado não muito distante, a ecologia chegou a ser chamada de “a economia da natureza”, dada sua estreita e íntima relação entre o produzir e o retirar da natureza.
O fato é que, desse argumento de Cousteau, resulta afirmar, a título de reiteração, que a economia e o meio ambiente devem caminhar juntos, pois uma é o complemento da outra, apesar de ser a economia um subconjunto do meio ambiente. Para tanto, o crescimento econômico deve ser revisto, pois esse não pode ser praticado à custa dos recursos naturais explorados à exaustão. A própria palavra exaustão (na origem: extremo cansaço) já determina como será no futuro: é algo que vai acabar.
Portanto, não se deve, não se pode, não se recomenda crescer além dos limites. O certo é que há limites e esses devem ser respeitados. A Terra não aumentará de tamanho, estejamos certos disso. Na prática, continuar explorando sem respeitar os limites implicará em sérias perdas para todos. Outrossim, isso significa perdas que serão irrecuperáveis, visto que há recursos que são finitos, vão acabar. A mensagem é única: usou, esgotou, não teremos mais.
Dessa forma, essa história entre a economia e a natureza em conflito pode assim ser resumida: mais economia (crescimento) é sinônimo de menos ambiente (degradação). Logo, crescimento sem regras e sem ponderações aponta para profundos impactos ambientais. Ambiente (ecossistema) degradado é vida mal vivida. Muitos vão se defender desses argumentos alegando ser possível a prática do tal “desenvolvimento sustentável”. Conquanto, isso é oximoro (dois conceitos opostos numa só expressão): se é desenvolvimento (evolução) é impossível ser sustentável (preservação). Isso não se coaduna. Um fere o outro e, ambos, feridos, degradam a qualidade de vida.
Nas palavras de Lester Brown, essa história fica assim: “A economia global atual foi formada por forças de mercado e não por princípios de ecologia. Infelizmente, ao deixar de refletir os custos totais dos bens e serviços, o mercado presta informações enganosas aos tomadores de decisões econômicas, em todos os níveis. Isso criou uma economia distorcida, fora de sincronia com os ecossistemas da Terra, uma economia que está destruindo seus sistemas naturais de suporte”.
Para o bem de todos, urge retomarmos sempre que possível esse debate em torno da economia e sua relação com o meio ambiente. Que ambos caminhem juntos; a preservação das espécies irá agradecer. Por fim, é forçoso ressaltar que não estamos na Terra; somos a Terra. Não ocupamos a natureza como meros partícipes dela; somos a própria natureza.
(*) Marcus Eduardo de Oliveira é economista e especialista em Política Internacional.
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