Bairro mais distante fica a 27 km do Centro e carta só uma vez por semana
Com cara de interior, o Bairro Chácara das Mansões, com cerca de 2,5 mil moradores, fica a 27 quilômetros do centro de Campo Grande e correspondências só chegam uma vez por semana. Lá é preciso procurar lugar estratégico a fim de encontrar sinal de celular e “gritar” por uma carona amiga para chegar ao posto de saúde mais próximo. O lazer praticamente não existe e só há uma rua de asfalto. Apesar das dificuldades, a maioria nem pensa em deixar o sossego para morar mais próximo da área central.
O acesso se dá pela BR-163, passando a Cidade das Abelhas. A rodovia acaba agilizando a “viagem” ao Centro da Capital. Quem tem carro leva em média meia hora para chegar à Praça Ary Coelho. Agora, quem depende de ônibus perde até duas horas para chegar ao destino final. O transporte passa três vezes por dia no bairro e, quem não gosta de perder tempo, embarca no das 6h30, que é o mais rápido.
Mesmo assim, quem tem filho não sai despreparado de casa. Mãe de seis e avó de outros dois, Aparecida da Silva, 38 anos, sai “de mala e cuia”. “Levo comida e agasalhos, porque tudo pode acontecer até o meu retorno, ainda mais com crianças”, comentou.
Ela mora há 19 anos no bairro e é apaixonada pelo local. “Aqui não tem violência, todo mundo conhece todo mundo, a gente dorme de porta aberta”, destacou. Mas, segundo Aparecida, nem tudo são flores. “A nossa maior dificuldade é levar os filhos e netos até o médico”, disse. O problema é unanimidade no bairro.
O posto de saúde mais próximo fica no Bairro Moreninha IV, distante 15 minutos da localidade. “Ainda bem que todo mundo aqui é amigo, então é só dar um grito para o vizinho acudir”, ressaltou Aparecida, que aciona amigos para conseguir chegar até o atendimento.
Caseiro a quatro anos de uma chácara, Demercino Moureira de Oliveira, 66 anos, mora sozinho e ponderou que, em caso de “coisa mais grave” não da tempo de aguardar o socorro de bombeiros ou do Samu. “A pessoa morre antes de eles chegarem”, avaliou.
Para minimizar o problema, o presidente da Associação dos Moradores do Bairro Chácara das Mansões, Edson Martins da Vida, 46 anos, pressiona o prefeito Alcides Bernal (PP) para levar pelo menos uma vez por semana atendimento médico à localidade. “Pagamos os mesmos impostos de quem mora no centro e o prefeito precisa governar para todos”, defendeu.
Às escuras - Ele frisou ainda que o bairro também não conta com agente de saúde e vive às escuras, por conta da iluminação precária. O caminhão do lixo passa três vezes por semana na localidade e o carteiro vem uma vez a cada sete dias e entrega as correspondências no “bolicho”, onde moradores vão retirá-las. “Às vezes a carta chega e a conta já venceu”, comentou Aparecida.
A distância também afasta a instalação de postos de pagamentos de conta, supermercados e lojas. A alternativa é ir às Moreninhas ou “viajar” até o centro. Por outro lado, três igrejas evangélicas e uma católica abriram sede no bairro, que também conta com uma escola municipal.
Dona de um pequeno supermercado, Ana Cleuza da Silva, 49 anos, fica de olho nas promoções das grandes redes para repor frutas e verduras, porque vendedores não vão até o bairro. Além disso, ela apela por mais rondas policiais e por mais alternativas de cursos. “Não troco aqui por nada, mas quem tem filho pequeno sofre por falta de opções de novos aprendizados”, ressaltou.
Lazer em falta – Se saúde é precária, lazer é ainda mais. Segundo o estudante, Wanderson Lucas Estanislau, 17 anos, a única opção é o Projeto Escola Viva, na Escola Municipal Dartesi Novais Caminha. “No sábado, tem jogo de futebol e, as vezes, abrem alguns cursos”, contou.
O bairro até tem o centro comunitário, mas, segundo Aparecida, o “mato tomou conta”. “O jeito é ficar em casa mesmo com a família”, comentou. O presidente do bairro confirma que lá o lazer se resume ao familiar e aos encontros nos botecos.
Quando da vontade de fazer algo diferente, como ir a um show, Wanderson disse que a alternativa é pegar o ônibus das 18h30 e voltar na madrugada do dia seguinte. “Às vezes a gente combina de um pai levar e rachamos a gasolina”, disse.
Apesar da falta de opções, o jovem é feliz onde mora. “Aqui tem pouca diversão, mas é muito mais tranquilo do que morar no centro”, destacou. “Adoro morar aqui, é muito gostoso e não tem bandidagem”, reforçou Demercino.