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Artes

Fotógrafo aprendeu a fazer da câmera uma arma para se defender de ataques

Paula Maciulevicius | 04/03/2016 06:45
Indígenas Guarani Kaiowá em roda do túmulo do indígena Semião Vilhava, assassinado durante ataque em Antônio João. (Fotos: Dionedison Terena)
Indígenas Guarani Kaiowá em roda do túmulo do indígena Semião Vilhava, assassinado durante ataque em Antônio João. (Fotos: Dionedison Terena)

O processo de fotografia o qual Dionedison exerce hoje tem uma razão por trás. Motivado pelo que acontece com a população indígena em Mato Grosso do Sul, o terena viu que não bastava enxergar a transformação do Estado num grande e sangrento palco de violação dos direitos humanos, era preciso testemunhar, registrar e criar mecanismos de defesa de um povo. 

Ao entrar para os movimentos indígenas em 2007, Dionedison Terena, hoje com 38 anos, encontrou pela fotografia um meio de se armar. "Durante a minha caminhada eu percebi que faltava algo dentro do movimento: era exatamente fazer isso, o registro dos fatos que vem ocorrendo", explica. Através da câmera ele também tem uma segunda missão: a de tentar mudar a forma como os indígenas são vistos e tratados, em especial, pela mídia.

O que os olhos só viam e hoje clicam são torturas, espancamentos, ataques armados e assassinatos que ocorrem nas fazendas, aldeias e áreas retomadas por indígenas. Dionedison é nascido na aldeia Bananal, tem oito irmãos e se viu dentro do movimento depois que a família deixou a aldeia e chegou à cidade.

Mobilização indígena ocupando principais ruas de Campo Grande contra PEC 215.
Mobilização indígena ocupando principais ruas de Campo Grande contra PEC 215.
Imagem da retomada do povo terena no município de Aquidauana.
Imagem da retomada do povo terena no município de Aquidauana.

Em 2007, ele passou a conhecer o trabalho da Rede de Educação Cidadã, que trabalha a formação de indígenas. "A partir desses processos, passei a conhecer a importância de a gente ter o domínio dessas ferramentas dos meio de comunicação", conta. Foi na mesma época que Dionedison passou a participar ativamente das mobilizações indígenas, exatamente para registrar cada fato que acontece quando olho nenhum quer ver.

"Já vivenciei algumas reintegrações de posse, que me dá a oportunidade de fotografar e acompanhar todo esse processo. Um deles foi muito tenso e até hoje não apaga da minha memória, na aldeia Buriti, o Oziel Gabriel, assassinado pela Polícia", recorda.

Foi com fotógrafos de guerra, conectados via internet, que Dionedison aprendeu que teria de deixar a emoção de lado para focar na razão. "Às vezes eu não conseguia me concentrar, era um sentimento de dor, misturado com ódio e isso me atrapalhava um pouco a fazer esse trabalho de fotografia", descreve.

Mulheres indígenas vítimas de violência nos acampamentos.
Mulheres indígenas vítimas de violência nos acampamentos.
Crianças Guarani Kaiowá após ataque no acampamento Kurusú Ambá em Coronel Sapucaia.
Crianças Guarani Kaiowá após ataque no acampamento Kurusú Ambá em Coronel Sapucaia.

"Eu passei a conhecer o fotógrafo André Liohn e a trocar contato com ele nas redes sociais, ele que me passava orientação, de que forma proceder em várias situações dolorosas. É muito difícil quando você se depara com indígenas sofrendo, sendo o principal alvo numa reintegração de posse", exemplifica.

Até hoje não é fácil de ver e nem de clicar momentos de tensão assim. Ele também se vê perseguido por fotografar e filmar e alerta que é preciso cautela, assim como qualquer profissional numa cobertura mais delicada. "Eu sempre procuro chegar nesses locais de ataque recente, colher depoimento das pessoas. Elas relatam tudo o que acontece", explica.

O primeiro contato com a câmera foi ainda no Pontão de Cultura Guaicurus, que alguns anos atrás oferecia cursos de vídeo e foto, mas só nos últimos dois que uma câmera semiprofissional tem acompanhado Dionedison. Um pouco antes do equipamento, as imagens capturadas já eram expostas na rede, pensando em relatar o "lado indígena", por tantas vezes massacrado na imprensa, o terena criou a página no Facebook "Resistência do Povo Terena", onde posta fotos e comenta, baseado no que vive e no que lê, das notícias.

"Eu não tenho uma formação em fotografia, em jornalismo. Toda essa aprendizagem, esse conhecimento que eu tenho é do que eu vivi mesmo". E o motivo de soltar suas fotos ao mundo é contrapor o que os jornais insistem em estampar, diz ele. "Quando faz retomada, a primeira coisa que aparece é invasão. Eu tento contrapor a fala da mídia. Não é invasão quando os indígenas retomam suas terras, que são consideradas terras tradicionais", frisa.

Sobre quem é Dionedison por trás das câmeras? Ele resume como descreveu em sua página: "Dionedison Terena é um fotógrafo indígena abrangendo questões sociais, principalmente questão indígena em Mato Grosso do Sul / BRASIL".

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Crianças indígena se abrigando da chuva na área de retomada.
Crianças indígena se abrigando da chuva na área de retomada.
Após ataque contra indígenas Guarani Kaiowá, foto de uma criança na retomada Ñhanderú Marangatú em município de Antonio João.
Após ataque contra indígenas Guarani Kaiowá, foto de uma criança na retomada Ñhanderú Marangatú em município de Antonio João.
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