Contra vontade de 11 filhos, seu Manoel comprou a primeira moto aos 81 anos
As flores e plantas da casa no Jardim das Mansões agora tem companhia. Isso quando seu Manoel para em casa. Desde sexta-feira da semana passada está até difícil achar o mais novo motociclista por ali. Aos 81 anos, contra a vontade 11 filhos, ele realizou o sonho de uma vida: comprou uma moto 50 cilindradas.
De longe se vê o velhinho na motoquinha vermelha e com capacete da mesma cor. Foram três anos juntando dinheiro. "De R$ 10 em R$ 10,00", como ele diz, para sair da loja motorizado. "Eu que comprei essa bichinha, era meu desejo. Os filhos falavam 'mas pai, por que uma moto?' Para mim andar uai", responde seu Manoel Coelho.
A 'cinquentinha' era o sonho mais recente do senhorzinho que é pai de 12 filhos, avô de 20 netos e de nove bisnetos. Quando chegou na loja, o sistema não aceitou nenhuma parcela de financiamento e para completar o restinho que faltava, ele teve de chamar a única filha de 'aceitava' a ideia.
"Por onde eu ando minha filha? Por aqui tudo. Vou daqui até a rodovia, 20 km pra cima, pra baixo, fui lá no Rouxinóis hoje, mostrar a moto pro meu filho", conta todo orgulhoso.
Seu Manoel nasceu em Getulina, no Estado de São Paulo e chegou aqui na década de 50. Primeiro para Fátima do Sul, depois Dourados, para então chegar a Campo Grande. Hoje aposentado, ele resume que o que fez a vida toda foi trabalho "ruim". "Fui lixeiro, carpi rua, era funcionário da prefeitura", descreve.
Há 16 anos, na vontade de morar mais perto de parte dos filhos, ele trocou - de olhos fechados - a casa que tinha em Dourados por essa daqui, de Campo Grande.
A conversa se dá quase toda pertinho da moto. Creio eu que se seu Manoel pudesse e a esposa Josefa deixasse, ele iria era dormir com ela no quarto. "É sonho né e meu Deus do céu, cada um falou uma bobeira... Mas pra mim isso é uma alegria, uma satisfação", responde.
Quando pergunto se a alegria tomou conta dele na hora de sair da loja, ele brinca que não. "Fui quietinho, para ninguém perceber... Até homem da loja não queria me vender, com medo..." relata. Isso porque seu Manoel não sabia pilotar.
"Agora está aí, igual um rapazinho de 18 anos", emenda dona Josefa. Esposa há 59 anos, ela anda de cadeira de rodas, por conta do mal de Parkinson e da série de AVC's sofridos. A vida ali parece não ser das mais fáceis. Seu Manoel leva a esposa de ônibus para os médicos e a motoca só entra na rotina depois que ele terminou todos os cuidados em casa, que incluem dar banho e trocar as fraldas de Josefa.
Pergunto se, ele tem noção do exemplo que é, de que quando se quer uma coisa, não tem idade que possa impedir. Ele, de quebra, responde: "oxe, sim. Quando tem vontade de possuir uma coisa e consegue é assim, eu estou tendo uma imensa alegria. É só querer aprender que tudo dá certo e também tem que pedir a Deus saúde, se não tiver saúde nada pode ser feito. Agora já aprendi a ligar e sair, porque eu nem sabia mexer".
Claro que a resposta preocupa quem ouve do outro lado. Seu Manoel, o que o senhor consegue enxergar hoje, quando anda de moto? "O que eu mais vejo na cidade minha filha? É o perigo, esse eu vejo bastante, em toda esquina..." Do lado do perigo, Manoel também vê a paisagem e sente o vento no rosto.
"Se eu vivo de sonho? Eu vivo sim. O meu sonho mais antigo - por isso esse era o mais recente - tem 30 anos. Casei, tive 12 filhos, criei tudo na pobreza. Meu sonho é possuir uma casa boa, ou reformar essa aqui, mas por enquanto tá bom. Meus filhos brincam que não ninguém fica velho de moto... Sabe por que? Porque morre logo". Seu Manoel só ri...