Zagueiro chegou ao Corinthians e quando tinha tudo pra decolar, virou pedreiro
De Aral Moreira, Huliell hoje é servente de obras, depois de viver parte do sonho
Com a mesma intensidade em que sorri, Huliell enche os olhos d'água em um intervalo de minutos. Aos 22 anos, quando a vida tinha tudo para decolar, ele que já se via nos gramados dos grandes estádios, levou um tombo daqueles. Lidar com as frustrações exige um preparo até maior do que o de jogador pedia.
Nascido em Aral Moreira, o Lado B encontrou Huliell Kuskoski de Oliveira, um entre tantos outros garotos que teve o mesmo sonho, trabalhando como servente de pedreiro, na construção de um prédio na antiga Furnas, perto do Shopping Campo Grande. E perguntou: o que aconteceu com o menino que saiu de casa tão cedo para viver um sonho e hoje está tão diferente?
"Sempre gostei de futebol, em Aral Moreira, assim como em todo Estado, o esporte é muito fraco. Na época da escola, o treinador descobriu o 7 de Setembro de Dourados e me chamou para fazer teste lá", conta.
Em 2009, com 14 anos, ele se mudou de Aral Moreira para Dourados e lá para Mirassol, no interior de São Paulo, onde olheiros o viram e levaram para o Corinthians. "Fui para a categoria de base, assinei contrato profissional com 16 anos, disputei vários campeonatos", recorda.
Até os 18 ele jogou na categoria de base do Timão e de lá foi "emprestado" para o Corinthians Alagoano, em Maceió onde ficou um ano e no seguinte, jogou a copinha pelo CRB. "Nisso, um cara de São Paulo, se dizendo empresário, me fez uma proposta boa. E São Paulo é vitrine, não é?" argumenta.
Huliell só descobriu que foi vítima de um golpe quando tentou embarcar de Maceió para São Paulo. A promessa era dele jogar no Oeste, mas até a passagem que tinha nas mãos era falsa. "O cara sumiu, os times que me queriam em Maceió, não que me queriam mais, porque a hora que eles queriam, eu não fui", lembra.
As conversas com o tal empresário seguiram por mais de um mês e ele nunca desconfiou que nada daquilo se concretizaria. Não foi por vontade própria que Huliell trocou os gramados pelo cimento e a argamassa. Mas quando a necessidade bateu à porta, ele não teve escolha a não ser ver se enterrar - ainda que por um momento - o sonho de jogador.
"Resolvi voltar para ficar perto dos meus pais, foram sete anos morando longe de casa", comenta. A família hoje mora em Campo Grande. O pai que tinha uma conveniência, fechou e também trabalha em construções.
"É um baque... Você espera muito e de repente aparece um cara e acaba com seu sonho. Eu não podia ficar parado, tinha que trabalhar, ainda mais na situação que estava, não dava para ficar esperando..."
Tem exatos 1 ano e 4 meses desde que tudo aconteceu. Mesmo tempo em que ele não entra em campo. "Se eu enterrei esse sonho? Não, jamais. O que me faltou foi ter empresário, sem fica difícil. Alguém precisa vestir a sua camisa enquanto você joga", explica. A esperança dele é de que com o final do ano, às vésperas de início de campeonatos, ele consiga alguma oportunidade.
"A frustração é complicada, ainda bem que tem minha família que me apoia sempre e o principal é Deus. Agradecer pelo que tem e esperar o que tem por vir. O que eu sinto no campo é esquecer de tudo, eu só sei que está ali uma coisa que me faz feliz".
E não tem um dia em que trabalhando ali, Huliell não se lembre dos jogos que ficaram para trás.