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Ninguém escapa das tangentes da vida

Por Cristiane Lang (*) | 20/11/2024 08:30

Na matemática, uma tangente é uma linha que toca uma curva em apenas um ponto, sem cruzá-la. No entanto, no cotidiano, “sair pela tangente” é uma expressão que remete à ideia de fugir do caminho original, desviar de um plano ou escapar de uma trajetória direta. E é exatamente isso que a vida nos proporciona: tangentes inevitáveis que desafiam nossos planos e certezas.

Mas o que significa lidar com essas tangentes e como elas impactam nossa jornada?

1. A ilusão do controle: o mito do caminho reto

Vivemos em uma cultura que valoriza o controle e o planejamento. Desde cedo, somos incentivados a traçar metas claras, com passos bem definidos para alcançar o sucesso. A expectativa é seguir uma linha reta, evitando desvios e obstáculos. No entanto, a vida real raramente se conforma a essa linha imaginária. Relacionamentos acabam, carreiras mudam, planos falham. As tangentes surgem quando menos esperamos, forçando-nos a reavaliar, adaptar e, muitas vezes, mudar completamente de rumo.

O desafio reside em aceitar que não temos controle total sobre nossa trajetória. Podemos traçar planos e direções, mas é preciso reconhecer que desvios e mudanças fazem parte de um caminho mais complexo e dinâmico.

2. Tangentes como oportunidades: o valor dos desvios inesperados

Enquanto muitas vezes encaramos as tangentes como desvios indesejados, elas podem ser, na verdade, portas para experiências transformadoras. Às vezes, o melhor que nos acontece não é o que planejamos, mas aquilo que nos é imposto ou revelado por circunstâncias inesperadas. Um emprego perdido pode levar a uma nova paixão profissional; um relacionamento encerrado pode abrir espaço para uma nova conexão mais autêntica.

As tangentes revelam novos horizontes que, em nossa tentativa de seguir uma linha reta, poderiam passar despercebidos. Quando abraçamos a mudança com abertura e curiosidade, nos permitimos aprender com os desvios e ampliar nossa visão.

3. O medo do desvio: por que resistimos às tangentes?

Há uma razão psicológica pela qual resistimos às tangentes da vida: o medo do desconhecido. Desvios representam o abandono do familiar, de nossos planos e de nossa zona de conforto. Isso desperta inseguranças, especialmente quando as tangentes surgem abruptamente, sem aviso. Queremos acreditar que nossas escolhas nos levarão diretamente a um destino previsível e satisfatório, mas isso raramente é realista.

Essa resistência ao inesperado pode nos levar à paralisia ou à negação, o que, por sua vez, nos impede de crescer e explorar novas possibilidades. Aprender a lidar com o medo do desconhecido é, portanto, um passo essencial para aceitar as tangentes como parte da jornada.

4. Encontrando propósito nas tangentes: transformando o inesperado em possibilidade

O segredo para lidar com as tangentes da vida não é apenas aceitá-las, mas encontrar um propósito dentro delas. Para isso, é necessário desenvolver a habilidade de enxergar além da frustração inicial e reconhecer o valor de novas experiências. Isso exige uma mentalidade de aprendizado e resiliência.

Exercício prático: Em momentos de desvio, faça perguntas a si mesmo como: “O que posso aprender com essa situação?” ou “Quais novas oportunidades podem surgir a partir daqui?”. Essas perguntas ajudam a redirecionar o foco da perda para o crescimento.

5. O papel das tangentes na redefinição do eu

As tangentes muitas vezes forçam uma reflexão sobre quem somos e sobre o que realmente importa. Ao sair da linha planejada, entramos em um território onde o antigo “eu” pode já não servir mais. Esses momentos são convites para reconsiderar nossas crenças, redefinir prioridades e expandir nossa visão do mundo e de nós mesmos.

Sair da rota original não é apenas uma questão de mudança de direção, mas uma oportunidade de transformação. As tangentes nos desafiam a reimaginar a vida e, muitas vezes, nos revelam aspectos ocultos de nosso potencial.

A beleza das tangentes e a aceitação da vida imperfeita

Ninguém escapa das tangentes da vida porque elas são a própria essência de viver. Ao invés de resistir, precisamos aprender a dançar com elas, reconhecendo que desvios fazem parte do percurso. A linha reta pode parecer segura, mas é limitada. As tangentes, por outro lado, expandem nossa visão, nos conectam com novas possibilidades e nos ensinam que o verdadeiro caminho não é o planejado, mas o vivido.

Aceitar as tangentes é aceitar que a vida é imperfeita, dinâmica e cheia de surpresas. E, ao final de nossa jornada, são essas surpresas, desvios e reencontros que nos dão as histórias mais ricas e os aprendizados mais profundos. Afinal, a beleza de uma trajetória não está em sua linearidade, mas em sua capacidade de nos transformar ao longo do caminho.

(*) Cristiane Lang é psicóloga clínica, especialista em Oncologia pelo Instituto de Ensino Albert Einstein de São Paulo.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.

 

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