Resistência a antibióticos e métodos rápidos de detecção de bactérias
A resistência aos antibióticos é considerada uma das principais ameaças globais na atualidade. Nos últimos anos, bactérias resistentes a todas as classes de antibióticos disponíveis têm causado preocupação nos hospitais, já que não restam alternativas para tratar os pacientes que adquirem essas infecções. A identificação rápida da bactéria causadora da infecção e como ela se comporta frente aos antibióticos é um dos fatores determinantes para a eficácia do tratamento. As técnicas convencionais utilizadas em laboratórios de microbiologia de rotina, entretanto, costumam levar até 48 horas para a liberação do laudo com a identificação bacteriana e o teste de suscetibilidade in vitro – método que indica qual(ais) antibiótico(s) seria(m) efetivo(s) para combater a bactéria.
Diferentemente dos métodos tradicionais, a metodologia baseada na técnica de espectrometria de massas denominada Matrix-Assisted Laser Desorption Ionization – Time-of-Fly (MALDI-TOF) permite a identificação de microrganismos em questão de minutos. A técnica de MALDI-TOF se baseia na ionização da massa microbiana cristalizada em uma superfície por pulsos curtos de laser; as proteínas bacterianas ionizadas são aceleradas num campo magnético e migram em um tubo de vácuo. As proteínas são detectadas na parte superior do tubo de vácuo e, a partir do tempo de voo e da massa da proteína, é gerado um espectro proteico que é comparado a um banco de dados específico para cada espécie bacteriana, o que permite a diferenciação entre as bactérias.
A metodologia de MALDI-TOF, além de permitir a identificação rápida de microrganismos, tem sido avaliada para outras finalidades, como a detecção de mecanismos de resistência bacteriana e, recentemente, para a determinação do perfil de susceptibilidade aos antimicrobianos, a fim de permitir que o laboratório de microbiologia possa prover não somente a identificação do microrganismo, mas também sua resposta in vitro aos antimicrobianos em um tempo consideravelmente mais curto do que o tempo necessário por métodos convencionais.
Um estudo em 2018 desenvolveu uma técnica denominada de “Método de crescimento em microgotas direto na placa”, por meio do qual se faz o teste de susceptibilidade aos antimicrobianos diretamente na placa de MALDI-TOF. Resumidamente, a bactéria é colocada em contato com o antibiótico a ser testado nessa placa, a qual é incubada em estufa bacteriológica por 4 horas, a fim de promover o crescimento bacteriano. Após, a placa é inserida no equipamento de MALDI-TOF, e a interpretação se dá da seguinte forma: se o equipamento identificar a bactéria, significa que ela conseguiu crescer na presença do antibiótico testado, logo essa bactéria é considerada resistente ao antibiótico, e o mesmo não deveria ser utilizado no tratamento do paciente. No entanto, se o MALDI-TOF não conseguir identificar a bactéria, significa que ela não conseguiu crescer na presença desse antibiótico, logo ela é considerada sensível, e o fármaco poderia ser utilizado no tratamento deste paciente.
[…] para cada antibiótico e cada bactéria esse teste deve ser padronizado, considerando-se, principalmente, as diferentes concentrações que têm atividade inibitória contra a bactéria. Essa metodologia ainda não havia sido padronizada para a Polimixina B – antibiótico considerado de último recurso para tratar infecções por algumas bactérias (bacilos Gram-Negativos) multirresistentes.
Considerando isso, o Laboratório de Pesquisa em Resistência Bacteriana (LABRESIS) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, em parceria com o Programa de Pós-graduação em Ciências Médicas da UFRGS, desenvolveu um estudo de avaliação do método para Polimixina B. Com aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa, o estudo começou a ser executado em 2021. Atualmente a metodologia está padronizada para determinar o perfil de susceptibilidade dos bacilos Gram-negativos à Polimixina B através do MALDI-TOF, incluindo amostras direto de hemoculturas positivas (em caso de pacientes com sepse).
Como resultados, a metodologia padronizada para a determinação rápida da suscetibilidade à Polimixina B por MALDI-TOF demonstrou uma concordância categórica de 96% em comparação à metodologia padrão de teste de suscetibilidade (técnica de microdiluição em caldo – método que necessita de 24 horas). Nossa expectativa é que essa nova metodologia possa ser utilizada nos exames de rotina dos laboratórios que possuem o equipamento MALDI-TOF, e assim ser possível informar com um dia de antecedência ao médico se a Polimixina B seria adequada para a terapia, de forma que se consiga controlar o quanto antes infecções de difícil tratamento e auxiliar na cura desses pacientes.
(*) Patricia Orlandi Barth é aluna de mestrado no Programa de Pós-graduação em Ciências Médicas da UFRGS, sob orientação do professor Afonso Luís Barth e atua no Laboratório de Pesquisa em Resistência Bacteriana (LABRESIS) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.