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Interior

MS volta a ter invasão e confronto por terra 50 dias após posse de Lula

MST anunciou reorganização de acampamentos; Em Japorã, sem-terra da FNL foram expulsos por fazendeiros

Helio de Freitas, de Dourados, e Renata Volpe | 23/02/2023 12:28
Sem-terra em fazenda no município de Japorã; famílias foram expulsas por fazendeiros (Foto: Direto das Ruas)
Sem-terra em fazenda no município de Japorã; famílias foram expulsas por fazendeiros (Foto: Direto das Ruas)

Menos de 50 dias após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a tensão entre trabalhadores rurais sem-terra e fazendeiros voltou a imperar em Mato Grosso do Sul.

No fim de semana de Carnaval, propriedade rural localizada em Japorã (a 467 km de Campo Grande) foi ocupada por trabalhadores rurais da FNL (Frente Nacional de Luta). No dia seguinte, mesmo sem ordem judicial, os invasores foram expulsos por fazendeiros da região e os barracos queimados. Não há registro de feridos.

Ao mesmo tempo, o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) anuncia a arregimentação de famílias para retomar a luta pela terra. A ideia é reunir pelo menos 400 famílias em dois acampamentos que serão montados no município de Ponta Porã e na região de Rochedo e Corguinho.

“Estamos retomando a luta pela terra. Estamos começando a organizar as famílias para a conquista do assentamento. Por enquanto o MST não promoveu nenhuma ocupação, estamos organizando os acampamentos”, afirmou ao Campo Grande News um dos coordenadores do movimento em MS, conhecido como Zeca do MST.

Segundo ele, no distrito de Nova Itamarati, na região de fronteira com o Paraguai, o acampamento já foi aberto para começar a organizar as famílias. Os barracos estão sendo montados em área de uso coletivo, onde existia uma escola, dentro do assentamento instalado há 21 anos.

“Queremos produzir comida, matar a fome do povo, garantir a subsistência dos nossos acampados e acampadas na região, mas não estamos ocupando nenhuma área”, declarou. Segundo ele, o MST não tem ligação com a FNL, liderada nacionalmente por José Rainha Junior.

Acampamento do MST que está sendo montado em área no distrito de Nova Itamarati (Foto: Divulgação)
Acampamento do MST que está sendo montado em área no distrito de Nova Itamarati (Foto: Divulgação)

Tensão em Japorã – Conforme boletim de ocorrência registrado na Polícia Civil em Japorã, a propriedade ocupada sábado (18) fica na estrada entre Japorã e Mundo Novo. Pelo menos 70 pessoas, entre crianças e adultos, entraram na fazenda e estenderam bandeira da FNL na porteira.

Policiais de Japorã e de Mundo Novo foram ao local para conversar com os invasores e informados que se tratava de ocupação. Duas mulheres e um homem, que se identificaram como líderes do grupo, afirmaram que a área invadida seria parte da fazenda de narcotraficantes, confiscada pelo Poder Judiciário.

A propriedade é formada por dois sítios, um de 190 hectares e outro de pelo menos 100 hectares, totalizando 290 hectares. Uma das líderes alegou aos policiais que a propriedade estaria abandonada há cinco anos e que não havia qualquer pessoa residindo no local.

Segundo a PM, as pessoas se recusaram a deixar o local pacificamente e que só sairiam com ordem judicial. Devido ao número de invasores, como já estava de noite e para resguardar a integridade física dos policiais e de idosos e crianças, “os quais eram utilizados como escudo dos manifestantes”, segundo a ocorrência, a PM deixou de conduzir os invasores.

Expulsos - No domingo, a Polícia Militar foi informada sobre grupo de pelo menos 20 pessoas reunido nas imediações da Fecularia Mundo Novo, na margem da BR-163. Eles esperavam a chegada do proprietário dos sítios para retomar a posse por conta própria.

Novamente as equipes da PM das duas cidades foram reunidas e se deslocaram à área ocupada, para evitar confronto entre os sem-terra e fazendeiros. Entretanto, quando chegaram ao local, por volta de 18h, a fazenda já tinha sido desocupada. A casa da sede e os barracos montados pelas famílias estavam em chamas.

Homem identificado no boletim de ocorrência como Sidenei Delbem se apresentou como proprietário da fazenda e confirmou que o grupo tinha usado de força física para expulsar os invasores, mas que ninguém teria ficado ferido.

Ele disse à polícia ser dono legal da área e prometeu apresentar cópia da matrícula registrada em cartório para comprovar ter comprado as terras em 2015, de homem chamado Ponteli.

As equipes da PM fizeram buscas nas imediações, mas não localizaram os sem-terra. Outras equipes da PM e policiais do DOF (Departamento de Operações de Fronteira) foram enviadas ao local como reforço, mas não há registro de outros confrontos.

Agredidos – Em sua página na rede social Instagram, a FNL denunciou agressões contra os trabalhadores rurais e apontou como autores grupo de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro.

“O grupo que se concentrou com caminhonetes e armados agrediu fisicamente de forma violenta companheiros da ocupação e incendiaram os barracos e imóveis da propriedade. O acampamento foi desfeito e as trabalhadoras e trabalhadores despejados. Toda nossa solidariedade aos companheiros que ousam lutar nesse ambiente hostil, que é o Estado de MS”, afirmou o movimento social.

A ocupação em Japorã fez parte da campanha “Carnaval Vermelho”, desencadeada pela FNL também em outros estados brasileiros. Além de Mato Grosso do Sul, houve ocupações no Paraná e no oeste de São Paulo.

O deputado estadual Zeca do PT (Foto: Marcos Maluf)
O deputado estadual Zeca do PT (Foto: Marcos Maluf)

“Não pode invadir por invadir” – O deputado estadual Zeca do PT comentou hoje (23) sobre o recrudescimento da tensão no campo em Mato Grosso do Sul, pediu calma aos movimentos sociais e disse que não é hora de invasões.

“Sem nenhum problema acampar, mecanismo de pressão absolutamente democrático, o que não pode é invadir por invadir, ocupar por ocupar. Até porque o governo do Lula recebeu terra arrasada, não tem dinheiro para comprar terras. O Lula quer comprar terras de forma pacífica para fazer os assentamentos, ainda não tem”, disse ele ao Campo Grande News.

Zeca do PT disse que tanto o governo federal quanto o governo de Eduardo Riedel (PSDB) estão dispostos a apoiar os assentamentos, para gerar riquezas e melhorar a vida dos assentados.

“Não sei porque tanta celeuma em torno dos acampamentos, o povo deles teve acampado, os ditos patriotas, por 60, 90 dias, proibindo o direito de ir e vir da população, fazendo anarquia, pedindo ditadura e nós não falamos nada”, afirmou o deputado, se referindo aos acampamentos bolsonaristas, que duraram de 30 de outubro de 2022 até 8 de janeiro deste ano.

A reportagem procurou a assessoria da Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul), mas a entidade ruralista ainda não se manifestou.

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