TRF anula despejo de índios e determina perícia antropológica em Passo Piraju
Reintegração de posse concedida há nove anos nunca foi cumprida e índios vão permanecer em 40 hectares às margens do Rio Dourdos
Os guarani-kaiowá que ocupam 40 hectares na margem da rodovia MS-156, em Dourados, a 233 km de Campo Grande, poderão permanecer no local até a conclusão de uma perícia antropológica, reivindicada para analisar se as terras são de posse tradicional indígena. A decisão é do TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região (São Paulo), que aceitou parecer do MPF (Ministério Público Federal) e anulou a sentença de reintegração de posse da área, ocupada pelos índios há 11 anos e denominada aldeia Passo Piraju.
De acordo com a assessoria do MPF, o Tribunal Regional Federal determinou que durante o processo de identificação os índios não poderão ser retirados das terras que ocupam às margens do Rio Dourados.
Ainda conforme o Ministério Público Federal, a anulação da sentença de retirada desfaz o “clima de apreensão constante” vivido pelos indígenas nos últimos nove anos, tempo em que a ordem judicial de reintegração de posse permaneceu válida. “A qualquer momento ela poderia ser cumprida. A Justiça Federal de Dourados também havia desconsiderado o pedido para realização de perícia antropológica”, informa nota divulgada pela assessoria do MPF.
De acordo com a nova decisão do TRF, “havendo dois direitos em conflito, um precisa ser sacrificado. Logo, se há dois direitos assegurados pela Constituição – a manifestação da propriedade e outro o direito à subsistência, direito à vida – não há como dar prevalência a direito de conteúdo econômico”.
Em 1º de março de 2004, a reintegração de posse foi cumprida e os índios da comunidade de Passo Piraju se deslocaram para o corredor existente entre a propriedade rural e a rodovia MS, na região conhecida como Porto Cambira. “Ali ficaram em condições precárias, decidindo então pelo retorno à antiga ocupação”, diz o MPF.
Policiais mortos – A área ocupada pelos índios foi palco de uma tragédia em 1º de abril de 2006. Quando investigavam um crime ocorrido no perímetro urbano de Dourados, os policiais civis Ronilson Magalhães Bartie, 36 anos, e Rodrigo Lorenzatto, 26, entraram em confronto com um grupo de índios da Passo Piraju e foram mortos a tiros, golpes de faca e pauladas. O também policial Emerson José Gadani, na época com 33 anos, foi ferido a golpes de faca, mas sobreviveu e está aposentado.
Cinco índios são réus pela morte de dois policiais e tentativa de homicídio contra o terceiro. Entre os acusados está o cacique índios Carlito de Oliveira, 73 anos, apontado como líder do grupo. Os índios alegam legítima defesa.
Em fevereiro deste ano, a defesa dos índios pediu o desaforamento (transferência) do julgamento deles para São Paulo. A solicitação ganhou apoio do MPF. O procurador da República, Manoel de Souza Mendes Junior, que faz a acusação, apontou que a imparcialidade do julgamento poderia ficar comprometida devido à disputa de terra entre índios e fazendeiros.
Na época, o advogado douradense Maurício Rasslan, assistente da acusação, protestou contra a manifestação do MPF e disse que o procurador, que no processo tem a função de acusador, assumiu papel de defensor dos índios. Até agora não houve manifestação do TRF sobre o pedido de desaforamento.