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Arquitetura

Lar preserva amor de casal que esperou sete anos para ficar junto

Sozinho, Alberto construiu a casa que tem mais de 60 anos de história e é cheia de afetividade

Jéssica Fernandes | 29/10/2022 07:35
Casa na Júlio Dittmar foi onde casal viveu na companhia da única filha. (Foto: Paulo Francis)
Casa na Júlio Dittmar foi onde casal viveu na companhia da única filha. (Foto: Paulo Francis)

Entrar na casa de Ana Célia Scudler de Araújo, de 61 anos, é encontrar um lar cheio de personalidade. Tudo tem história na residência que exala a arte dos quadros e porcelanas pintados por ela e preserva o amor de um casal que esperou sete anos para oficializar a união.

Nascida e criada no lugar, Ana, que prefere ser chamada de Célia, nunca viveu em outro canto. Na varanda, uma das primeiras curiosidades que compartilha sobre a casa é a forma como foi construída.

“Meu pai que fez a casa, ele era mecânico. Pelo que contava, quatro anos antes de casar ele começou a fazer a casa. Ela não tem cimento, é feita com cal e outra argila, porque parece que na época não tinha. Aí ele fez e a casa tá em pé até hoje”, explica Célia.

Quadro pintado por Célia é lembrança que fez para os pais. (Foto: Paulo Francis)
Quadro pintado por Célia é lembrança que fez para os pais. (Foto: Paulo Francis)

Segundo ela, o pai Alberto construiu a casa pensando na família que iria formar. “Ele achava muito errado um homem tirar a mulher da casa e não ter nem onde morar. Ele sempre falava. Aí eles construíram e vieram para cá”, conta.

Falar dos pais desperta lembranças que fazem Célia sorrir. Os dois esperaram sete anos para conseguirem ficar juntos. Isso porque a família materna colocou ao decorrer do tempo empecilhos para que a oficialização do relacionamento acontecesse.

“A minha mãe queria casar em maio ou setembro. Toda vez que marcava o casamento para maio a minha vó ficava doente, aí marcava para setembro e ela ficava doente. Foram sete anos. Meu pai foi conversar com meu avô porque não ia esperar mais, que já tinha feito casa e queria casar. Meu avô perguntou para ele o porquê da pressa, se eles tinham feito alguma coisa. A sorte é que nasci bem depois”, ri.

Sem cimento, casa foi construida com argila e cal. (Foto: Paulo Francis)
Sem cimento, casa foi construida com argila e cal. (Foto: Paulo Francis)

Nesta semana completou 1 ano do falecimento de Alberto que foi cuidado até os últimos dias pela filha. Já Terezinha, mãe da artesã, partiu há 28 anos. Após a morte da esposa, Alberto não quis se envolver com mais ninguém. “Ele dizia que só amou uma mulher na vida e que não queria se casar de novo”, fala.

Filha única, Célia cresceu brincando com os primos e os tios que possuíam idade semelhante à dela. Na infância, a falta de companhia nunca foi um problema. Contudo, hoje, ela garante que é difícil se ver sem irmãos com quem poderia compartilhar a dor do luto.

“É muito triste. Não aconselho nunca a pessoa ter só um filho. É muito egoísmo da parte dos pais, acho que eles pensam que vão viver para sempre. Eles nunca pensam, por exemplo, o que é eles morrerem e pro filho ficar sozinho. É terrível”, desabafa.

Na sala, porta-retrato mostra Célia sorrindo. (Foto: Paulo Francis)
Na sala, porta-retrato mostra Célia sorrindo. (Foto: Paulo Francis)

No Bairro Vila Rica, Célia mora no terreno que divide espaço com outro imóvel. Antes de Alberto erguer a estrutura aos fundos do terreno, a mãe e a irmã residiam na casa da frente desde 1940. Hoje, ela é alugada para outra pessoa, pois ambas também já faleceram.

Contudo, a moradora recorda as histórias que a avó contava sobre o terreno e como era o cenário na época. O nome da rua é uma das coisas que mudaram.

“Não era Júlio Dittmar, era Rua Cacequi. Não tinha asfalto, quando chovia era um barro terrível e só tinha a pracinha onde minha avó me levava para brincar. Minha avó dizia que quando comprou só tinha a igreja, a 26 de agosto e uma ou outra casa. Ela dizia que aqui no quintal passava o gado que ia para exposição”, comenta.

Sala é cheia de móveis e quadros pintados pela moradora. (Foto: Paulo Francis)
Sala é cheia de móveis e quadros pintados pela moradora. (Foto: Paulo Francis)

Em seguida, Célia faz um convite para mostrar a casa que tem duas salas, três quartos, copa, cozinha e uma varanda. Na sala estão as recordações dela com a família, a casa está cheia dessas fotografias de uma Célia no auge dos 30 anos sorrindo ao lado da mãe. Em outro porta-retrato aparece ela e o pai. No mesmo ambiente também tem uma recordação de Terezinha na juventude, quando já estava noiva de Alberto.

Os móveis de madeira estão em todos os ambientes. As peças são um dos orgulhos da moradora que garante que a maioria foi enviado da Alemanha por parentes. De relógio de parede, cristaleira, mesa, banco à janela, o material enriquece a decoração em cada ambiente.

Outro destaque são os quadros pintados por ela. As obras estão espalhadas na sala, sendo que numa delas Célia retratou a entrada do rancho que pertencia à família. No quarto do pai está outra peça colorida inspirada na foto que os pais tiraram quando se casaram no civil.

Itens de madeira são motivo de orgulho para a artista. (Foto: Paulo Francis)
Itens de madeira são motivo de orgulho para a artista. (Foto: Paulo Francis)

Há 20 anos, Célia desenvolve o trabalho artístico em telas e porcelanas. Ela começou por influência da mãe. “A minha mãe era professora de trabalhos manuais, então ela fazia de tudo. Ela queria que eu pintasse, eu não queria muito, então ela falava que não estava enxergando para eu fazer uma coisa e outra”, lembra.

No terreno, ela tem outro cômodo onde organiza as peças e materiais. O ateliê tem alguns dos pratos customizados e lembrancinhas enviadas por parentes. Próximo ao ateliê está a oficina de Alberto e a árvore de jabuticaba plantada por ele.  A árvore de 70 anos é só mais uma das várias espalhadas no jardim que tem a decoração dos bonecos da Branca de Neve e os sete anões.

Na visão dela, toda a casa reflete a própria criação, história e as pessoas que amou. Após pacientemente mostrar a casa, Célia destaca que ama o lugar e seus detalhes. Ao dizer que tudo reflete a família, ela explica o porquê. “As minhas origens. Tem a parte sentimental, porque foi meu pai que construiu e a parte bem alemã”, conclui.

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