A vida é complicada, mas com crochê parece ficar mais fácil na Vila Almeida
Na rua calma da Vila Almeida, não dá para passar sem um dedinho de prosa com duas senhoras risonhas, fazendo crochê na calçada. A parada começa pela curiosidade, mas acaba se justificando pela lição de vida.
A cena tem Leonilda Marquês Hervas, 70 anos, e Maria Lucia Almiron, 64, irmãs e vizinhas, que passam as tardes debaixo de uma árvore na rua Presidentes Antônio Carlos.
As aposentadas têm a diversão em frente de casa, sem hora para acabar. "Só damos uma pausa para chupar laranja", brinca Leonilda, a mais simpática e faladeira.
Nem parece que a vida foi dura. Maria Lúcia tem 9 filhos, 15 netos e duas bisnetas. Ficou viúva e agora os maiores companheiros em casa são dois filhos com uma doença que até hoje é mistério para a família.
Roberto, de 48 anos, parou de andar na adolescência e Anderson, de 34, enfrenta agora o mesmo problema. “O Roberto, por exemplo, andou até os 17 anos, depois começou a sentir muita câimbra e dor nas pernas, quando pensei que não ele já estava entrevado em uma cadeira de rodas”, diz Maria Lúcia.
O mais novo também já não consegue caminhar sozinho. “As pernas dele estão entortando. O médico disse que é uma doença hereditária e que os netos poderão ter a mesma coisa no futuro”, relata.
O jeito foi passar anos pedindo uma solução a Deus e se apegando à irmã. Maria Lúcia é a caçula de 9 irmãos, mas foi em Leonilda que encontrou o maior apoio na vida. “Quando ele cai (Roberto) ela é a primeira a correr para a rua pedir socorro e às vezes também o acompanha ao médico”, diz.
A troca é evidente. A dureza guardada para Maria serve de motivo para Leonilda não reclamar da vida.
A mais velha contabiliza 8 filhos, 18 netos e 19 bisnetos. Ficou viúva cedo, mas se casou de novo com um homem 22 anos mais novo. A combinação que ao preconceito parecia uma receita fadada ao fracasso, há 30 anos dá certo.
Uma ao lado da outra, as duas vão aprendendo a enfrentar as dificuldades com a conversa em horas de crochê, quando o importante passa a ser o ponto perfeito.
As duas fazem de tudo, toalha de mesa, tapete, vestidinho para crianças, jogo de banheiro...mas nada é vendido. Quase sempre, vira presente. “Em vez de ficar pensando bobeira a gente faz crochê. É uma terapia para a cabeça”, afirma as irmãs.
No meio da conversa descontraída, das senhoras de aparência impecável, o riso só desapareceu uma vez. Maria diz que precisa de uma cadeira de rodas para Roberto, porque o filho engordou e precisa de outra mais reforçada. Quem quiser ajudar, pode ligar para 3361- 8305 (Leonilda).