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Comportamento

Aos 60, Cléia abriu negócio depois de viver até ilegalmente fora do Brasil

De modelo até imigrante ilegal, a empresária conta que nunca quis sossegar e foi assim que se encontrou

Aletheya Alves | 21/06/2022 08:48
Aos 60 anos, Cléia Moreno Brandino abriu sua própria marmoaria. (Foto: Aletheya Alves)
Aos 60 anos, Cléia Moreno Brandino abriu sua própria marmoaria. (Foto: Aletheya Alves)

“As pessoas ficam ansiosas dizendo que precisam definir o que querem da vida logo, mas eu só me encontrei aos 60”. Orgulhosa de mostrar que idade não é limitação, a empresária Cléia Moreno Brandino conta que já foi de modelo a imigrante ilegal antes de se realizar de um jeito que nunca havia imaginado: como proprietária de uma marmoaria.

Hoje, com 63 anos, ela brinca que a idade fica em um patamar tão desimportante que chega a esquecer dos números. Mesmo assim, quando se lembra, faz questão de destacar que não tem vergonha nenhuma, mas que ser chamada de “senhora” vem como um uso até estranho.

Sobre sua longa lista de aventuras, Cléia conta que a marmoraria veio como a decisão mais recente, aos 60 anos. “O engraçado é que eu cresci com uma tia que tinha uma marmoraria no Mato Grosso, mas nunca imaginei que fosse ter uma minha. Nunca passou pela minha cabeça”, explica.

A empresária conta que idade não faz diferença alguma. (Foto: Arquivo pessoal)
A empresária conta que idade não faz diferença alguma. (Foto: Arquivo pessoal)

Antes de empreender, ela detalha que muita coisa precisou acontecer e que um conjunto de fatores inesperados a levaram até os dias atuais. Já com os filhos criados e depois de uma separação é que tudo realmente começou a se movimentar, como Cléia relata.

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Com 38 anos eu fui embora para o Japão. Estava fazendo arquitetura aqui e não tinha dinheiro para pagar a faculdade. Aí uma amiga perguntou por que eu não ia para o Japão tentar a vida. Depois disso vendi meu carro, comprei a passagem e fui embora, explica.

Na época, desempregada e sem saber o que fazer, a viagem ao Japão foi o que pareceu mais atrativo. “Fui com a cara e coragem, hoje não faria de novo. Eu não sabia nada de japonês, comprei um dicionário no aeroporto de São Paulo e fui”.

Por não ter dinheiro, Cléia conta que o jeito foi encontrar uma empresa no Brasil que conseguisse fazer com que ela chegasse ao outro lado do mundo ilegalmente. Sabendo dos riscos, ela quis tentar do mesmo jeito e entre altos e baixos, permaneceu no país por quase quatro anos.

Período em que passou no Japão coincidiu com a Copa do Mundo. (Foto: Arquivo pessoal)
Período em que passou no Japão coincidiu com a Copa do Mundo. (Foto: Arquivo pessoal)

Lá trabalhou como garçonete, atendente e operária em uma fábrica de arame. Longe de ter sido uma experiência 100% positiva, ela explica que os primeiros meses foram os mais difíceis, mas que depois acabou se acostumando com a nova vida.

“Você vai condicionado a trabalhar para a empresa que te leva até pagar o total da passagem. Enquanto você não paga, eles ficam com seu passaporte. Para mim foi mais tranquilo porque em dois meses eu tinha conseguido pagar tudo”, diz.

Apesar das dificuldades, Cléia conta que conseguiu aproveitar momentos no Japão. (Foto: Arquivo pessoal)
Apesar das dificuldades, Cléia conta que conseguiu aproveitar momentos no Japão. (Foto: Arquivo pessoal)

Pouco mais de três anos se passaram até que ela decidisse retornar ao Brasil e até neste momento os episódios se misturaram com aventura. Cléia conta que já estava com saudade da família e ao saber que sua filha estava grávida quis voltar, mas antes disso precisou ser presa.

“Como minha documentação era ilegal, só voltei definitivamente e fui deportada. Tive que passar pelo consulado e fiquei dez dias presa. Inclusive fiz aniversário na prisão”, conta rindo.

De volta ao Brasil

Já no Brasil, ela ficou em Campo Grande por pouco tempo e em seguida se mudou para Naviraí. Sem conseguir ficar parada, decidiu voltar a estudar e foi assim que iniciou a nova etapa de aventuras.

Aos 54 anos, ela se formou em Serviço Social, já em Mato Grosso do Sul. (Foto: Arquivo pessoal)
Aos 54 anos, ela se formou em Serviço Social, já em Mato Grosso do Sul. (Foto: Arquivo pessoal)

De acordo com Cléia, foram dez anos na cidade e, aos 54 anos, se formou em Serviço Social. “Ali é que eu descobri os lados mais ruins do mundo. Antes eu dizia que conhecia o mundo, mas só conheci mesmo com o Serviço Social. Vi coisas horríveis, avô estuprando neta, eu tendo que tirar a criança da família porque o pai assassinou a mãe”, relembra.

Mesmo com todas as dificuldades, ela conta que ainda insistiu na profissão até que se viu sendo obrigada a mudar de rumo mais uma vez. “Perdi meu cargo porque não concordei com questões políticas e resolvi que ia tentar algo diferente. Vim para Campo Grande e comecei a trabalhar com minha filha”.

Foi neste momento, retornando para a Capital, que ela começou a se envolver com o empreendedorismo. Ao trabalhar com a filha, Cléia teve contato com uma marmoraria e passou a prestar serviços para a empresa.

Longe de ficar apenas no escritório, ela conta que se diverte nas obras. (Foto: Arquivo pessoal)
Longe de ficar apenas no escritório, ela conta que se diverte nas obras. (Foto: Arquivo pessoal)

Já sabendo como lidar com os serviços, ela chegou a sair da empresa, mas retornou como sócia. “Eu voltei a trabalhar com o dono da marmoraria, mas não deu certo e ao invés de abandonar, resolvi abrir a minha própria”.

Destacando que durante toda sua vida, desde a separação, não quis ficar parada, Cléia narra que a idade só veio como um número sem muitos significados. “Eu brinco que sou fora do meu próprio tempo, que comecei minha vida tarde. Mas isso não foi ruim, demorei, mas me encontrei e hoje sou feliz”.

Registro em um dos canteiros de obras em que sua empresa trabalhou. (Foto: Arquivo pessoal)
Registro em um dos canteiros de obras em que sua empresa trabalhou. (Foto: Arquivo pessoal)

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