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Comportamento

Já são 15 anos de Paulinho do Radinho na rua, mesmo com algumas tristezas

Ângela Kempfer | 14/03/2013 07:15
Paulinho e o rádio que o acompanha há 15 anos.
Paulinho e o rádio que o acompanha há 15 anos.

Os filhos não querem qualquer contato, ele já teve quatro motos e um rádio roubados, quebrou a tíbia ao ser atropelado, mas "Paulinho do Radinho" não larga as noites na rua. Dizem que toda cidade tem um louco, pois há 15 anos, ele é o maluco de Campo Grande.

O rótulo não parece incomodar, pelo menos é o que mostram a risada sincera e a resposta: “Acho bacana. Adoro o Raul Seixas. toco sempre”, brinca. É o preço que paga para viver a sua felicidade e aproveitar pequenas coisas, como acompanhar criança crescendo dentro dos carros que passam pela Afonso Pena. “Tenho um fã que agora traz a filha de 2 anos para me ver. Acompanhei ele crescer. Eu na rua e ele no carro. Agora diz que eu sou o Vovô do Radinho.”

Quando não está no canteiro, dançando, está na farmácia em frente, conversando com os funcionários, ou no ponto de táxi, de olho na TV em dias de futebol, principalmente, quando a disputa tem o Corinthians. Sabe ser um daqueles amigos que tem os nomes dos seus filhos na cabeça. Que te encontram no shopping e pagam um almoço, ou um café. Pelo menos comigo, sempre foi assim.

Funcionário Público da Fundação Estadual de Cultura, ele cumpre o horário de serviço e lá pelas 18h segue para a avenida. Na esquina com a 14 de Julho, coloca o rádio para tocar, ainda com fitas K7. “Agora comprei um novo, com CD”, diz, ainda com o antigo nas mãos.

O aparelho era da filha, hoje com 27 anos. Pai de arquiteta, de um quase médico e de uma estudante de Direito, desde 97 não vê os filhos. Nem pela Afonso Pena eles passam, para não “ter contato visual” com o pai, comenta.

Paulinho acompanha a vida dos 3 à distância, mesmo sabendo que o afastamento ocorreu por vergonha. “Não só por eu estar na rua, mas porque eu sou gay”, justifica, lembrando que quando entendeu o que sentia, falou diretamente sobre a escolha com a família.

Mas a vida começou a mudar bem antes, depois de um acidente, aos 30 anos de idade. De moto, foi atingido por uma caminhonete e acabou 40 dias em coma. Nunca mais foi o mesmo. A sequela é a dificuldade para falar e escrever ainda hoje.

A esposa pediu a separação depois de alguns anos, o pai morreu, ele foi passar um tempo em Portugal e quando voltou, em uma das noites mais tristes na lembrança, com o rádio da filha nas mãos, começou a cantar e dançar como louco na Afonso Pena, ao som de “Pra Dizer Adeus” dos Titãs. “Estava muito triste. Comecei a dançar e conversar com meu pai”, detalha.

A reação de mototaxistas e de quem passava pela avenida fez surgir o "Paulinho do Radinho". “Eles davam risada, paravam para conversar. No outro dia voltei e nunca mais parei.”

Uma maluquice, admite, mas que faz bem à alma. “Sei que não sou normal, mas antes eu era um babaca. Andava de terno, ia ao Rádio Clube. Não troco o que eu tenho hoje”. Anos depois, em 2005, outro atropelamento e a tíbia quebrada. Após dias no hospital, quando foi liberado, apareceu de muletas para dançar na Afonso Pena.

 Sobre a resistência, ele diz que não tem "orgulho", mas "felicidade". "Acho orgulho uma palavra muito arrogante. Denota superioridade."

O carinho de quem conhece o Paulinho do Radinho.
O carinho de quem conhece o Paulinho do Radinho.

Hoje, Paulo mora de aluguel, tem dois radinhos e nenhuma moto. “Eu estacionava ali na avenida e quando voltava não tinha mais, ai desisti”, explica. 

O que gosta mesmo de fazer, além de passar a noite na avenida, é ir ao cinema, algumas vezes na semana. "Já vi 'Os Miseráveis' 3 vezes e chorei nas 3", comenta.

Atento ao que acontece, ontem me recebeu falando do papa argentino, minutos depois da divulgação em Roma. "Pelo menos é da América do Sul. Vai ser bom para todos nós".

Paulinho já viveu muita coisa ali, no Centro. Viu, por exemplo, o Topo Gigio fechar, bar na Afonso Pena que reunia jornalistas, assim como tantos outros ali naquela região. "Essa parte da cidade perdeu a vida. De noite, não tem nada, morre. Até a praça foi cercada e agora parece um cemitério", reclama.  

Aos 53 anos, e com a “Ponte da Felicidade”, como chamava no início, construída na principal avenida da cidade, a chateação também muda o semblante do espalhafatoso Paulinho quando o assunto é a garotada "sem educação". “Guri de 18 a 20 anos me odeia. Fico chateado quando essa gurizada entra no meu Facebook ou passa por aqui e grita ‘seu velho’ diz que eu sou 'nojento' por ter essa idade é dançar na rua. Tão querendo me enterrar com 53 anos”, reclama.

Mas quase todos os dias ele aparece para dizer que está vivo e vai ser assim até a morte, jura por Deus. “Vou provar que mesmo velho eu posso ser feliz”.

Nesta quarta-feira, Paulinho soprou velinhas com o Lado B pela data que passou batida em 2012, mas em julho o aniversário será de 16 anos.

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