Quem sofre luto por suicídio também precisa de cuidados para sobreviver
Trabalhos de “pós-venção” para quem fica são necessários para prevenir pensamentos destrutivos
Falar sobre prevenção ao suicídio significa, também, reforçar a importância de dar voz e espaço para quem vive o luto. Psicóloga com formação em suicidologia e coordenadora do Gaes (Grupo de Apoio aos Enlutados por Suicídio), Elma Pacheco defende que quem fica pode enfrentar pensamentos destrutivos enquanto lida com um luto enraizado em tabus. Por isso, é preciso entender que essas pessoas enlutadas também precisam de cuidados para sobreviver e encontrar caminhos que ultrapassem o sofrimento.
Apesar de ser focado na chamada “pós-venção”, o grupo trabalha o princípio da prevenção de uma outra forma, como explica Elma. Isso porque pensando em sua experiência de atendimento em clínica, a percepção foi de que após o suicídio, quem fica e entra em luto não costuma ter abertura para falar e entender os sentimentos.
Consequentemente, o enlutado também pode enfrentar pensamentos suicidas e outros sentimentos destrutivos.
O luto por suicídio é solitário, duradouro e muito difícil porque grande parte das pessoas e da sociedade ainda não valida esse luto, as pessoas não reconhecem. Quando a pessoa perde o pai, por exemplo, por suicídio, ela prefere falar que o pai infartou porque se dizer que foi suicídio precisa lidar com o tabu que ainda existe”, argumenta a psicóloga.
Segundo Elma, a dificuldade para conseguir falar sobre é ainda mais prejudicial em um cenário em que é necessária a rede de apoio como nesses casos. E é nesse sentido que o Gaes foi criado dentro do Gav.
Durante os atendimentos pelo 0800, foi notado que parte das pessoas que buscavam a ajuda anônima era justamente os enlutados por suicídio. A questão é que, além do atendimento pontual, os planos de pós-venção envolvem um contato prolongado.
“Onde estão os enlutados por suicídio? Existe um estudo dizendo que quando alguém tira a vida, o impacto pode ser de seis a dez pessoas próximas, mas sabemos que muitas mais pessoas são impactadas”, explica sobre a necessidade de se olhar para o cenário e contexto de quem fica.
De forma geral, a psicóloga aponta que sentimentos de raiva e culpa são bastante presentes e, sem ver possibilidade de lidar com esse combo, o enlutado recebe ajuda do grupo para encontrar formas de atravessar o caminho.
Ele não vai ser mais o mesmo, mas uma pessoa diferente com possibilidades diferentes para sair e enfrentar esse luto. [...] Então, na pós-venção, trabalhamos com essas pessoas buscando a possibilidade de vida, entendendo os comportamentos autodestrutivos que ficam na família”, descreve.
Completando a ideia, como esse tipo de luto é bastante fechado, a preocupação é em saber o que pode acontecer com as pessoas que enfrentam os momentos pós-suicídio.
“Então, todas as ações são feitas nesse sentido com todo trabalho para as pessoas enlutadas por suicídio. Recebemos amigos, famílias, alunos de professores que tiraram a vida e fazemos esse trabalho no grupo de forma presencial e, agora, online”.
Aberto especificamente para enlutados por suicídio, os encontros são feitos presencialmente toda 3ª quarta-feira do mês, às 19h, na sede do Gav (Rua Vinte e Cinco de Dezembro, 924, 2º andar, Jardim dos Estados).
Já os encontros online serão na primeira quarta-feira de cada mês, começando no dia 4 de setembro.
Em ambos os casos, é necessário se inscrever através do site www.gaes.ong.br ou do 0800 750 5554. Isso porque existem regras a serem seguidas para manter o anonimato e segurança dos participantes.
Gav (Grupo Amor Vida)
O Gav como um todo também continua em funcionamento regular para pessoas em crise. Todas as ligações são anônimas e gratuitas, sempre das 7h às 23h, no horário de Mato Grosso do Sul através do 0800 750 5554.
Tanto no Gav quanto no Gaes há voluntários que são treinados para a escuta e para atuação nos encontros. Mais informações também podem ser consultadas no perfil do Instagram @grupoamorvida_cg.
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