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Comportamento

Sem chance no Brasil, crianças ganham nova história fora do País

Nos últimos 5 anos, 11 crianças e adolescentes de MS passaram pelo processo de adoção internacional

Aletheya Alves | 10/08/2023 07:33
Crianças e adolescentes ganham novos rumos fora do País quando não há chance por aqui. (Foto: Juliano Almeida)
Crianças e adolescentes ganham novos rumos fora do País quando não há chance por aqui. (Foto: Juliano Almeida)

Enquanto ainda existe o mito de que adoções internacionais podem gerar o tráfico de crianças e inúmeros outros problemas, quem trabalha na área em Mato Grosso do Sul narra sobre como histórias que não teriam chance no Brasil são construídas graças a esse direito. Conectadas a famílias estrangeiras após não se encaixarem nos "pedidos" das nacionais, nos últimos cinco anos, onze crianças sul-mato-grossenses ganharam famílias através do processo de adoção internacional.

De acordo com o TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), a última foi realizada em 2021, referente a um grupo de irmãos em Ponta Porã e que foram para a Itália. Ainda segundo o tribunal, hoje, em Campo Grande, há um processo também envolvendo grupo para pretendentes que moram na França.

Integrante da Coordenadoria da Infância e Juventude do TJMS, a psicóloga Renata Giancursi detalha que sendo um direito da criança e do adolescente, a adoção internacional ainda é envolvida em mitos. Mas que, durante seus 20 anos de trabalho na área, reúne histórias que mostram as mudanças de vida causadas por esse processo de construção familiar.

Antes de tudo, Renata pontua que as crianças e adolescentes inseridos no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento sempre são direcionados preferencialmente para famílias brasileiras. Apenas quando isso não é possível de ocorrer é que os processos de busca por famílias estrangeiras são iniciadas.

E, graças a essa modalidade, é que histórias que não teriam chance em solo brasileiro ganham novos rumos. Entre alguns dos exemplos que não se esquece, a psicóloga conta sobre grupos de irmãos, adolescentes já considerados “velhos” e vítimas de violências que, enquanto não tinham chance por aqui, ganharam uma família em outra cultura.

“Uma das histórias é de quatro meninas que foram vítimas de abuso sexual do pai. A mais velha, por ter sofrido toda essa situação, tinha um déficit mental, que não podemos dizer que é da criança ou do contexto. Enfim, negociamos para que fossem todas as meninas e elas foram para uma família italiana”, narra Renata.

Renata explica sobre como os processos são acompanhados rigidamente. (Foto: Juliano Almeida)
Renata explica sobre como os processos são acompanhados rigidamente. (Foto: Juliano Almeida)

Enquanto por aqui, o grupo e principalmente a menina mais velha iriam seguir em instituições de acolhimento, a narrativa foi alterada por lá.

Depois de um tempo, o pai faleceu e, hoje, quem toca o negócio é justamente a filha mais velha. Ela é o braço direito da mãe, mas no Brasil nenhuma tinha chance justamente pelo preconceito com vítimas de abuso sexual, comenta a psicóloga.

Explicando que há todo um preparo em vários âmbitos para entender se a família realmente está preparada para passar pelo processo de adoção, Renata comenta que a mesma dinâmica nacional é aplicada para candidatos de fora.

“Esses candidatos vão fazer um curso, passar por habilitação e se preparar nos aspectos jurídicos, sociais e psicológicos para vir adotar. Essa pessoa se desloca para o nosso país, passa por audiência e, após todos os trâmites necessários, a criança é entregue para ela”, detalha a psicóloga.

Ainda no Brasil, a criança ou adolescente passa por um período de adaptação com a nova família, tudo com o acompanhamento da equipe do Judiciário. Mas, antes desse contato, o trabalho já é iniciado.

De acordo com Renata, uma equipe composta por assistentes sociais e psicólogos apresenta a cidade, faz um trabalho de rua indo, por exemplo, ao aeroporto, tudo para elaborar as novas dinâmicas.

“Quando a família vem, há o estágio de convivência que acontece de 30 a 45 dias. Aquela família estrangeira fica por aqui durante esse tempo e nós acompanhamos o cotidiano e as interações”, explica Renata.

Apenas após esse tempo é que um parecer psicológico e judicial é elaborado dizendo que houve a adaptação. Para isso, muitos detalhes são observados, conforme a psicóloga comenta.

Durante o período de adaptação, a criança/adolescente costuma passar a se alimentar de forma parecida com a do novo país, é iniciada no novo idioma e questões culturais. E, tendo acompanhado cerca de mil processos, Renata exemplifica que justamente o sucesso na adaptação com uma nova cultura faz com que preconceitos ainda existentes caiam por terra.

São muitas especificidades por envolver outra cultura, mas já fiz adoções de adolescentes de 15 anos. Então, é um mito dizer que a criança não se adapta, comenta Renata.

Entre as dificuldades ainda encontradas para adoção por brasileiros, ela cita a questão da idade, grupos de irmãos e crianças/adolescentes que passaram por, por exemplo, violência sexual. Já tendo acompanhado processos internacionais com todos esses casos, Renata narra que observar o sucesso fora do País é um estalo para sobre como precisamos alterar a dinâmica também por aqui.

“O europeu, por exemplo, não é melhor do que nós. O que há é uma abertura maior, eles costumam saber que a criança faz vínculo em qualquer idade. Esse tipo de adoção é uma chance da criança não permanecer em unidades de acolhimento”, diz Renata.

E, apesar de ainda existirem muitos preconceitos, ela completa que os brasileiros têm se desconstruído em relação à adoção. "Houve uma queda nas adoções internacionais porque conseguimos muitos processos nacionalmente. Ainda há muito o que descontruir em relação aos preconceitos, mas é um avanço muito positivo".

Ainda sobre essa questão, a psicóloga pontua sobre a necessidade de construirmos vínculos e que, garantindo esse direito, as histórias são desenvolvidas.

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