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Comportamento

Sem medir amor, família não faz escolha e adota duas crianças com deficiência

Essas e outras famílias que tiveram suas vidas transformadas pela adoção estão numa exposição fotográfica no Shopping Campo Grande

Thailla Torres | 24/05/2019 08:54
Clarice (ao centro) é responsável pelo sorriso da família desde que resolveu adotar para ensinar a duas crianças com deficiência o sentido de amor. (Foto: Allan Kaiser)
Clarice (ao centro) é responsável pelo sorriso da família desde que resolveu adotar para ensinar a duas crianças com deficiência o sentido de amor. (Foto: Allan Kaiser)

Clarice não esconde a emoção ao falar do amor de dois filhos, hoje, os caçulinhas da família. Sempre dedicada ao voluntariado e mãe de oito filhos, depois de ver todo mundo crescer e encontrar duas crianças com realidades totalmente diferentes pela deficiência, o amor no peito a fez levar todo mundo para casa.

A história de Clarice Maria Concio de Oliveira, de 61 anos, é uma das diversas famílias que tiveram suas vidas transformadas pela adoção e fazem parte de uma exposição fotográfica gratuita que começa hoje (24), no Shopping Campo Grande.

Há anos, Clarice não cansa de responder porque resolveu adotar crianças com deficiência. Nas ruas de Campo Grande, são muitos os olhares quando aparece com os filhos. O comportamento é carregado de receios, às vezes, preconceito, explica. Durante muito ouviu que tinha ficado “louca”. “Sempre me perguntam e acham isso. E eu não canso de responder o motivo”.

Clarice se tornou mãe por adoção de Daiane. (Foto: Paulo Francis)
Clarice se tornou mãe por adoção de Daiane. (Foto: Paulo Francis)

A resposta é única. “Só o amor é capaz de formar uma família, mesmo com qualquer dificuldade. E isso eu tenho de sobra para os meus filhos. Adoção só completou a felicidade da minha família”, explica.

A primeira adoção foi há quase 20 anos, quando morava com a família em Minas Gerais. Daiane que tem paralisia cerebral era filha de dois vizinhos que não tinham condições de criá-la. Clarice a conheceu ainda bebê, com um mês de vida, dois meses depois, a casa simples de poucos cômodos virou lar para a menina também.

“Ela era muito pequena e seus pais viviam situações muito delicadas naquele período. Inclusive, foi o pai que me pediu para ficar com ela, caso eu não quisesse, teria que dar um destino a história dela. Acho que se eu não tivesse ficado com Daiane, certamente ela teria ido para um abrigo”, conta.

Clarice diz que não conseguiu pensar muito tempo. O único destino que bateu forte no peito foi a adoção, mas até então não sabia como proceder. “No começo, achei que bastava levá-la para minha casa, mas recebi orientação de uma promotora que tudo deveria ser feito com amparo da justiça, para minha segurança e a dela”.

A mãe então foi à luta por Daiane, ainda com 2 meses de vida. No mesmo período, ela recebeu o diagnóstico de paralisia cerebral, mas a vontade de estender o carinho foi tamanha, que não houve limitação capaz de balançar o coração da mãe. “O único medo que eu tinha era em relação aos cuidados, mas em nenhum momento pensei em deixá-la. Decidi me informar sobre tudo para saber como dar a ela uma vida melhor e saudável”.

Quando finalmente a justiça decidiu pela adoção, Daiane ganhou oito irmão, uma nova mãe e um pai. “Ele (pai) só soube quando eu cheguei definitivamente com ela em casa. Mas ficou do meu lado e escolheu amar Daiane como todo os outros filhos”.

Em seguida, o coração bateu mais forte para chamar Marcos de filho. (Foto: Paulo Francis)
Em seguida, o coração bateu mais forte para chamar Marcos de filho. (Foto: Paulo Francis)

Um problema de saúde fez a família mudar de Minas Gerais para Mato Grosso do Sul, em 2000. Foi quando Clarice passou a fazer parte de grupos de apoio à adoção e conheceu a realidade de outras famílias dispostas a amar como ela amava Daiane.

Um dia, ao chegar em casa após o tratamento da filha Daiane, Clarice soube de um menino com deficiência e histórico de maus-tratos que vivia em um abrigo. A criança era Marcos, que tem fala comprometida e precisa de auxílio para se locomover. “Parece que alguma coisa apertou meu peito ao imaginar ele longe da nossa família. Foi quando mais uma vez eu decidi adotar”.

Dessa vez, o processo não foi fácil, lembra. “O juiz reforçou inúmeras vezes sobre o sentido da adoção e que ele não era um objeto para ser devolvido, isso porque ele já tinha sido adotado e devolvido por outra família. Aquilo me tocou profundamente e eu bati o pé na adoção, precisei mostrar para todo mundo que eu estava pronta para ser mãe de novo”.

Quase dois anos depois, Clarice conseguiu levar Marcos para casa. “Como eu fiquei? Chorando de emoção. Quando se sente amor por uma criança, não há dinheiro, dificuldade e nem deficiência que faça você desistir dela. Assim que eu sempre me senti”.

Desafios - Em Campo Grande, no Bairro Monte Castelo, a família leva uma vida simples. Clarice se dedica diariamente aos filhos que fazem tratamento na Apae e, no cotidiano, os irmãos dão provas de amor que fazem transbordar alegria no coração da mãe. “Eles brincam, dão risada, ajudam e defendem com unhas e dentes. Uma das minhas filhas já fez muito barraco dentro do ônibus em defesa deles, depois de sofrerem o preconceito”.

Esse, segundo Clarice, é o maior desafio. “Lidar com as pessoas para mim é o mais difícil. É que mais machuca o coração de qualquer mãe. Tem gente que não gosta que eu entre no ônibus com eles porque eu atraso o percurso, tem gente que se levanta quando eles sentam perto, além dos olhares”, descreve.

Clarice tem felicidade que não cabe no peito e uma força que faz bastar a vida. Isso faz com que o amor passe dos laços sanguíneos aos afetivos, sem necessidade de escolhas. “Desistir não faz parte do meu vocabulário. E cada dificuldade que eu enfrento junto com eles, me faz mais feliz e sinto que eles ficam felizes também, pois ninguém luta sozinho aqui em casa”, finaliza.

Exposição - A abertura da exposição será às 10 horas, no Espaço Gourmet do Shopping Campo Grande, e as fotografias ficarão em exposição até o dia 2 de junho.

Participam os fotógrafos profissionais Alexis Prappas, Allan Kaiser, Beatriz Terra, Beto Nascimento e Leonardo T. Vieira, que aceitram o convite do Tribunal de Justiça (TJMS), por meio da Coordenadoria da Infância e da Juventude (CIJ), para registrar o cotidiano de famílias em suas mais variadas formas de adoção. Famílias que tiveram suas vidas transformadas pela adoção.

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