Músicos elaboram lista com o que deve ser alterado na Lei do Silêncio
Audiência Pública sobre a Lei Complementar nº 8, de 28 de março de 1996, conhecida como a Lei do Silêncio, realizada nesta terça-feira (25), na Câmara Municipal, reacendeu uma discussão antiga, mas trouxe, também, possíveis soluções para um problema que os empresários, músicos, promotores de eventos, donos de bares e restaurantes vêm enfrentando em Campo Grande.
Fundado a menos de um mês, o Simatec (Sindicato dos Músicos, Autores e Técnicos de Mato Grosso do Sul) já mostrou a que veio. O diretor administrativo da entidade, Marcos Ayla, entregou propostas concretas, elaboradas, segundo ele, ontem (24), “por músicos de diversas vertentes” e representantes da Comissão de Cultura.
Trata-se de uma carta com pontos a serem discutidos e que, inclusive, foram citados na audiência. Ayla afirma que a classe não tem intenção de ser anarquista e nem pretende brigar contra lei, afinal de contas, todos têm direito.
O que querem, destacou, é “correção de alguns distanciamentos sociais que a aplicabilidade da lei tem”. Para isso, o Simatec pede, em resumo, alterações de vários pontos que podem refletir, inclusive, na conduta e a ética dos fiscalizadores.
Entre outros pontos, no artigo 89, o sindicato quer seja conceituado os termos música, arte e cultura. Atualmente o texto elenca, para efeito da lei, apenas as definições de som, poluição sonora, ruído, ruído impulsivo, contínuo, intermitente, de fundo, distúrbio sonoro e por vibrações.
O artigo 90, que diz respeito aos horários, também está na mira. Eles pedem alteração, já que a Lei do Silêncio, como está, vigora por 24 horas, “sem brecha”. Os limites devem ser estabelecidos, claro, mas isso não pode valer para liberação de alvarás especiais, aqueles destinados a grandes eventos, diz o sindicato.
Essa é outra reivindicação da classe, declarou Ayla, ao comentar que os sertanejos Munhoz e Mariano gastaram, recentemente, R$ 3 milhões fora porque não conseguiram autorização para realizar um show em Campo Grande.
Ainda se falando nisso, o Simatec pede um prazo máximo de 90 dias para liberação do documento e a criação do alvará integrado. Só assim evitaria a burocracia de depender de um para retirar o outro. Solicita, ainda, a criação de uma comissão especial para resolver os problemas pendentes relacionados à “papelada”.
No campo da fiscalização, o sindicato entende que a medição deve ser acompanhada por um representante do estabelecimento. Denúncias anônimas, pontuou Ayla, não devem ser aceitas. “Como você vai chegar na casa do cidadão que reclamou se a denúncia é anônima? Isso também abre precedente para maldade. Nem moro no bairro, mas não gosto daquele bar...”, exemplificou.
Ainda no caso das medições, a produção de contraprova, no entender do Simatec, é outra necessidade. “É a única forma de saber quão vilão é a música ao vivo”, disse. O ponto considerado polêmico pelo diretor do sindicado é o que obrigaria o denunciado “ser posto a prova”.
É ele mesmo quem explica: Se o morador denuncia um local por não ter isolamento acústico, a casa dele também deve ser fiscalizada. A justificativa é que toda residência, segundo ele, deve ter tratamento acústico porque isso “está na lei”.
Os decibéis permitidos, norma que tem atormentado os empresários, precisam ser revistos. Devem estar de acordo com o último plano diretor, de 2010. “O atual é de 1996. A lei não acompanhou”, destacou.
O sindicato pede, ainda, a criação de uma linha de financiamento em caso de adequações; a transferência de fiscalização da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano para Fundação de Cultura (em casos de arte, música e cultura), e a criação de uma comissão mista formada por representantes da Semadur, Simatec, Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) e Fundac.
Prejuízo e atraso cultural – Além de apresentar as propostas, Marcos Ayla falou do prejuízo e atraso cultural em Campo Grande: “Temos uma estimativa de 5 mil empregos perdidos por conta da aplicabilidade dessa lei”.
Na avaliação do diretor, o trabalhador noturno está sendo tratado como bandido. O pensamento ganhou o apoio de empresários e representantes de entidades, que também participaram da audiência e, como ele, mostraram indignação.
Diretor do sindicato dos músicos, Raimundo Galvão não economizou nas palavras. Disse que a Semadur “é o cão chupando manga”. “Queremos que cada macaco fique no seu galho. Quem tem que fiscalizar músicos e cultura são os mecanismos de cultura”, afirmou.
Produtor cultural, Jonas de Paula questionou o poder público – “Capivara não ouve música, mas tem show no Parque das Nações. O Governo do Estado precisa de alvará?” – e convidou a todos para uma reflexão: “Que cidade nós queremos?”. Entre outras observações, o empresário, Henrique Rezende perguntou: “Aonde isso vai dar? Acabar em pizza?”.
A audiência pública dessa terça-feira contou com a presença de representantes de vários setores, inclusive daqueles que, visto de longe, parecem inatingíveis, como é o caso do Instituto Sócio Cultural, voltado às religiões de matrizes africanas.
O poder público, no entanto, deixou a desejar. Notou-se a ausência da Deops (Delegacia Especializada de Ordem e Política Social), Planurb (Instituto Nacional de Planejamento Urbano) e Ministério Público.