Mosquito da dengue vira monstrinho moderno quando crianças aprendem com arte
Procurando a melhor maneira de chamar a atenção dos pequenos, de olho no registro fotográfico e empenhada em provar que as crianças aprendem, sim, as lições que vem em forma de arte, Ana Ruas não teve dúvidas. Deu alguns passos pelo ateliê, parou ao lado da mesa repleta de “tarecos”, pegou um carrinho e perguntou, em alto e bom som: “O que acontece se a gente deixar esse brinquedo do lado de fora da casa?”
- Pode acumular água, respondeu, sem pestanejar, um dos garotos que havia se juntado à roda.
Satisfeita, ela continuou. Manteve a ênfase e não perdeu o tom. Desta vez, segurava um pequeno vaso de planta, daqueles que a gente coloca em cima da mesa.
- E se eu colocar água nas folhas da planta?
No auge dos seus 7 anos, Maria Fernanda arriscou: “Acumula água”. Estava certa.
A artista, enfática, sorrindo como que satisfeita pela resposta e pelo resultado do esforço, continuou. Deixou a plantinha de lado, escolheu uma lata fechada de tinta azul - a mesma cor que parece dominar o ambiente - e proferiu a nova sentença, apontando para a parte superior do objeto.
- Está seguro por mais que esteja tampada?
- Não, porque pode acumular água aí em cima, explicou Mariana Silva Vanderlei, também de 7 anos.
A turminha se deu por satisfeita. A artista não. Ana caminhou para o computador instalado ao lado da mesa, abriu um vídeo em macro que mostrava em detalhes um “monstrinho” não muito simpático, e indagou:
- O que este mosquitinho faz?
- Chupa o sangue da gente.
Exagerou, sem medo de errar, a pequena Valentina, de 6 anos.
- Nossa! O “cabinho” dele começa a ficar cheio de sangue.
Disse, visivelmente impressionado, Pedro Esteves Gonçalves, de 8 anos.
A exibição chega ao fim, mas o menino continua a explicação à reportagem: “Ele pica e deixa um vermelhinho que faz mal e dá dengue. Se picar duas vezes é a hemorrágica”.
A discussão, com tanta perturbação do repórter, se prolonga e chega à sala ao lado. Gustavo Ruas Brandi, de 9 anos, filho de artista, se junta ao time e enfatiza:
- Só sei que o mosquito da dengue traz a dengue. É por isso que se chama mosquito da dengue.
- Não. Ele chama Aedes Aegypti, corrigiu Pedro.
Termina conversa.
Oficina – Durante dois dias consecutivos, o ateliê Ana Ruas, localizado no bairro Taymã Park, em Campo Grande, recebeu cerca de 20 crianças, com idades de 5 a 10 anos, para a oficina “Educando o olhar”. O tema, desta vez, foram os insetos.
Como a cidade vive uma epidemia de dengue, a artista plástica, que dá nome ao ateliê, resolveu inserir o mosquito transmissor na lista de insetos a serem desenhados e pintados pelas crianças.
O espaço recebeu livros de biologia ilustrados, revistas especializadas e até larvas do Aedes Aegypti. Tudo para a criançada e brincar e aprender.
No grupo das mais novinhas, Martina Cestari, de 5 anos, exibia com orgulho o cartaz que havia feito. Explicou onde estavam as patinhas no desenho quase incompreensível, que ela segurava de cabeça para baixo.
Da doença, a menina não sabe muita coisa, é verdade, mas já aprendeu que o mosquito transmissor não é tão simpático como imaginava. “Achei que era um passarinho”, revelou.
Fotógrafa, Lilian Mara Barbosa Barros, de 32 anos, chegou ao final para registrar o desempenho da filha, Sara Barbosa Barros, de 6 anos, uma das que desenhou um mosquito gigante, no principal painel do ateliê.
Questionada sobre a ação do “inimigo” que acabara de desenhar, ela respondeu: “Se ele me picar eu vou ficar doente. Só isso que eu sei”. Para a idade, é mais do que o necessário. É, talvez, o suficiente.