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Sabor

Cheiro de rosquinha síria faz história de fila com netos se repetir por gerações

Receita da clichá não é segredo para família que acredita na maneira do preparado passada por quem já se foi

Guilherme Henri | 12/04/2018 07:24
Rosquinhas sírio-libanesas Clichás (Foto: Paulo Francis)
Rosquinhas sírio-libanesas Clichás (Foto: Paulo Francis)

Fim de semana e os ponteiros do relógio alcançavam a marca de 15h quando o cheiro adocicado por especiarias invadia todo o condomínio que ficava na rua Maracaju há pelo menos 20 anos em Campo Grande. Eram as fornadas da rosquinha sírio-libanesa Clichá, que saíam direto da cozinha da avó Ecilda Anache.

Desesperados para conseguir abocanhar mais de uma, a parentada chegava a formar fila na porta da senhorinha, que ficava uma “arara” ao saber que não conseguiria guardar nenhuma para presentear as amigas.

Porém, a tradição do doce estrangeiro na verdade começou na família com a matriarca sírio-libanesa Afif Anache, sogra de Ecilda. Quem conta a história são os netos de Afif, Luiz Anache, 57, e Maria Amélia Paiva, 43.

Ecilda ao lado dos filhos em tradicional café da tarde com clichá (Foto: Arquivo Pessoal)
Ecilda ao lado dos filhos em tradicional café da tarde com clichá (Foto: Arquivo Pessoal)

Os dois se divertem ao lembrar do “dejavu” que foi ver os filhos formarem fila na frente da casa da avó Ecilda, já que na infância eles faziam o mesmo. “Nossa avó preparava a massa pela manhã. Sempre sábado ou domingo. Mas, só íamos descobrir o que ela estava aprontando quando aquele cheiro inconfundível tomava conta de toda a rua. Era a clichá”, descreve Luiz.

Antes de partir, com 64 anos, Afif conseguiu passar o que livro de receitas algum conseguiria: os macetes de preparar a verdadeira rosquinha apreciada pela família para Ecilda.

E não deu outra. Os anos se passaram e ali naquele emaranhado de casas onde residiam os Anache, Ecilda vez novamente a história se repetir. “Era impossível ser outra coisa. As vezes a gente estava brincando na rua ou até mesmo trancado dentro de casa e aquele cheiro vinha e deixava tudo perfumado. Maravilhoso”, diz a neta Marcella Anache, 28.

Almoço árabe da família Anache (Foto: Arquivo Pessoal)
Almoço árabe da família Anache (Foto: Arquivo Pessoal)
Maria Amélia cozinhando com a mãe Ecilda (Foto: Arquivo Pessoal)
Maria Amélia cozinhando com a mãe Ecilda (Foto: Arquivo Pessoal)

E outra vez lá iam os netos formarem filha na casa da avó, que mal conseguia tirar os doces da forma antes que as crianças invadissem o lugar para garantir a sua clichá. “Ela ficava uma arara com a gente. Dizia que queria guardar algumas para dar de presente, mas nunca conseguia”, diz Marcella ao se lembrar da avó.

Quem sempre presenciava a cena era Maria Fernanda Tomitao, 28, que morava no mesmo condomínio, mas não pertencia a família Anache. “Cresci ali com todos eles e meu Deus não tinha como resistir aquele cheiro. Até hoje eu sou louca pela chichá e quando engravidei até senti desejo pela rosquinha”, conta a amiga.

Mais uma vez os ponteiros do relógio andaram e foi a vez de Ecilda deixar a família há dois anos. O antigo condomínio onde ali moravam os Anache foi desfeito. Cada irmão seguiu seu próprio caminho, uns aqui e outros fora. Mas, quando o assunto é clichá há distância se torna um mero detalhe.

Clichás dividem espaço com outras receitas sírias em balcão de empório da família (Foto: Paulo Francis)
Clichás dividem espaço com outras receitas sírias em balcão de empório da família (Foto: Paulo Francis)

A tradição passada por gerações hoje é seguida em Campo Grande por Luiz e a irmã Maria Amélia, no empório da família.

Lá, as terças e quintas são sagradas por serem os dias da clichá, mas também são os dias de boas lembranças e saudade. “As vezes postamos as fornadas recém-saídas e os que estão fora mandam mensagens ou ligam na hora pedindo que a gente mande até pelo correio. O incrível é que mesmo depois de dias confinadas, quando a caixa é aberta nossos parentes dizem que o cheiro dela é ainda mais forte. Como aquele no condomínio”, diz Maria Amélia.

Sobre se há algum segredo na receita, Luiz não faz mistério e dispara. “Não vejo problema nenhum em passar. O que ninguém entende é que a verdadeira receita está no jeito de fazer. Você só aprende assim, com o passado”, garante.

A clichá é feita com farinha, fermento, açúcar, canela, erva doce, pimenta síria, um pouco de leite, leite condensado e a especiaria síria macha. Quem prefere não se arriscar com a receita pode encontrar o doce as terças e quintas, no Empório Mansur, na Antônio Maria Coelho.

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