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Meio Ambiente

Pantanal vai se recuperar, mas como e em quanto tempo?

Pesquisador analisa bioma e realiza expedição que pretende colher resultados para entender a capacidade de resiliência da planície

Lucia Morel | 25/09/2020 08:47
Há uma luz no horizonte para o Pantanal, mas ela ainda é carregada de incertezas. (Foto: Marcos Maluf)
Há uma luz no horizonte para o Pantanal, mas ela ainda é carregada de incertezas. (Foto: Marcos Maluf)

O impacto e as perdas na planície pantaneira com as queimadas, ainda ativas, são incalculáveis e muito difíceis de medir. A chuva, por enquanto, é a esperança mais efetiva para que o fogo cesse. Enquanto isso, centenas de homens e mulheres fazem um trabalho de “formiguinha”, tentando ajudar o Pantanal.

Um desses é o professor mineiro, mas lotado na UECE (Universidade Estadual do Ceará), Hugo Fernandes, que chegou ao bioma esta semana e em uma expedição científica, tenta responder algumas perguntas. Entre elas, como a planície poderá se recuperar dos estragos históricos de 2020.

O foco são as onças pintadas, já que o trabalho é realizado em parceria com o projeto Onçafari, mas pode ir além, como ele mesmo relata, dizendo que busca entender um pouco da força de recuperação do próprio Pantanal. A primeira área visitada foi o Refúgio Ecológico Caiman, em Miranda, que teve 60% do território devastado pelo fogo em 2019.

Pata bastante queimada, de uma onça encontrada morta no Pantanal por amigos do pesquisador. (Foto: Arquivo Pessoal)
Pata bastante queimada, de uma onça encontrada morta no Pantanal por amigos do pesquisador. (Foto: Arquivo Pessoal)

“Estou aqui para analisar os dados científicos e mostrar o que aconteceu para que isso pudesse ser mitigado e, principalmente, mostrar o quanto a fauna pode ser recuperada”, disse à Revista Piauí.

Ao Campo Grande News, o pesquisador relatou o que já viu até agora, explicando que há sim, esperança diante do cenário desastroso que já consumiu cerca de 20% do bioma, o mesmo que 3 milhões de hectares de março até agora. Vale dizer que a flora se recupera mais rápido, mas a vida animal deve sofrer por mais tempo.

“As plantas (via de regra) demoram menos tempo para se reproduzir. A flora basal, as forrageiras, é de recuperação mais rápida. As árvores mesmo, naturais do bioma, têm cascas mais grossas e suportam o fogo. Com as primeiras chuvas, será já possível ver uma mudança na paisagem”.

No entanto, para a fauna, desde os grandes aos pequenos animais, a melhora é lenta, porque depende, principalmente, da reprodução dos que sobreviverão aos incêndios.

“Alguns animais demoram dias pra se reproduzir, já outras espécies, anos e isso faz uma grande diferença”, afirma, comparando que “se temos problemas com a onça, que é um animal ágil, que corre e nada e ainda assim vemos registros de óbitos, o impacto pros animais menores é muito maior”.

Essa esperança de recuperação, no entanto, é carregada de incertezas.

“A paisagem, a vegetação, o verde, muito em breve vamos ver voltando aos poucos. Mas não volta como era. Embora as queimadas na região sejam comuns, esta é histórica e todo bioma será fortemente afetado. Precisamos lembrar que quando temos qualquer alteração profunda, não tem como estimar com precisão o impacto, nem a recuperação.”

Biólogo Hugo Fernandes durante a captura de uma onça para implantação de rádio-colar. (Foto: Arquivo Pessoal)
Biólogo Hugo Fernandes durante a captura de uma onça para implantação de rádio-colar. (Foto: Arquivo Pessoal)

Uma das ações do biólogo, que vão ajudar na futura recuperação, foi a de acompanhar a captura de uma onça para instalação de um rádio-colar. Isso, segundo ele, "é muito importante no contexto das queimadas do Pantanal porque, uma vez que uma área pega fogo e uma onça com o equipamento consegue fugir e se abrigar em um lugar, aquilo pode indicar que ali é uma área de refúgio para várias espécies da fauna. Assim, é possível agir localmente em prol dessas espécies", detalha.

Pós-fogo – O pesquisador, que neste fim de semana fará sobrevoo na região, sustenta que o impacto não fica apenas no incêndio. “Quando o fogo passa, é aí que os problemas começam a aparecer”, afirma.

Ele explica que haverá uma busca dos animais pelas áreas não atingidas, mas ressalta que “os recursos são escassos”. Ocorre que uma variedade de espécies sobreviventes, em quantidade não prevista, buscarão comida e água em uma mesma área.

“Assim, o alimento vai rapidamente”, obrigando a busca por novos espaços, ou mesmo a aniquilação de espécies não tão comuns de serem usadas para alimentar outras, como está ocorrendo com a arara-azul. Leia mais aqui.

Há ainda a ocorrência certa de decoada – que é a redução de oxigênio na água dos rios – o que vai matar milhares de peixes. “Com as primeiras chuvas, vai diminuir o oxigênio da água, com a ida das cinzas acumuladas para as águas. Então, vai ter um impacto muito grande na cadeia alimentar dos animais”, analisa.

Soluções – Fernandes afirma que algo que já ficou claro até o momento em sua expedição, é que o Pantanal precisa ter brigadas permanentes e mais articuladas, além de mais brigadistas treinados e prontos para ação assim que o fogo começar.

Ele cita que as brigadas nas fazendas ficam, basicamente, desmontadas, à espera que o fogo chegue para entrarem em ação. Para isso, o ideal seria que o serviço fosse centralizado e houvesse uma central de comando para o início das atividades. “Isso até existe, mas é pouco articulada e pouco numerosa”, avalia.

Apesar disso, ele sustenta que os grandes guerreiros e guerreiras em toda essa situação são os homens e mulheres pantaneiras, que não medem esforços para tentar fazer o que podem para apagar o fogo. “Cada hectare salvo, importa”.

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