A semana da mulher e o trabalho das gestantes na pandemia
Nesta semana que se passou lembramos uma data que nos traz importantes reflexões: o Dia Internacional da Mulher, anualmente celebrado todo dia 8 de março.
A data foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1975 e guarda intrínseca relação com o Direito do Trabalho. Suas origens remontam às greves e às lutas das trabalhadoras no início do Século XX.
Em 1908, aproximadamente 15 mil mulheres foram às ruas em Nova York postulando a redução das jornadas de trabalho, melhores salários e o direito ao voto. Pouco tempo depois, o Partido Socialista da América declarou o primeiro Dia Nacional das Mulheres.
As discussões para a instituição de um Dia Internacional das Mulheres prosseguiram e, durante a revolução socialista em 1917, mulheres russas exigiram “pão e paz” em meio a uma greve, cujo início ocorreu em 8 de março (23 de fevereiro pelo calendário juliano, adotado na época na Rússia). A data foi, então, proclamada posteriormente.
Neste ano, no Brasil, mais especificamente no dia 9 de março, uma importante lei, relativa ao trabalho das gestantes durante a pandemia da COVID-19, foi sancionada: a Lei 14.311/2022.
Para entender a relevância da lei, é necessário, antes, explicar o contexto de outro diploma legal, qual seja, a Lei 14.151/2021.
Essa última foi publicada em 13 de maio de 2021 e estabelecia, basicamente, que durante a emergência de saúde pública decorrente da pandemia da COVID-19, a empregada gestante deveria permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.
Desde então passou a ser proibido o trabalho presencial das gestantes, sendo facultado o trabalho em domicílio, por meio de teletrabalho ou outra forma de labor à distância.
A despeito da boa intenção do legislador, a referida lei trouxe muita insegurança jurídica.
Empregadores questionavam, por exemplo, uma série de situações que a lei não havia excepcionado.
Por exemplo: era possível que uma empregada gestante, de um pequeno escritório onde há baixa movimentação de pessoas e que já estava com ciclo vacinal completo, pudesse retornar ao trabalho?
A cuidadora gestante de um idoso, que trabalhava na residência deste último, e que, evidentemente, não poderia trabalhar remotamente, poderia retornar ao trabalho se já estivesse com o ciclo vacinal completo e sabendo-se que não havia intensa movimentação de pessoas no local de trabalho?
Por que o empregador deveria arcar com a remuneração de empregada afastada se ele já contribuiu com a Previdência Social? Não seria mais adequado que o legislador tivesse previsto que o afastamento remunerado fosse custeado através da concessão de um benefício previdenciário?
A gestante poderia ser remanejada para o teletrabalho mediante a atribuição de atividades distintas daquelas para as quais foi contratada?
Como a lei previa o afastamento remunerado da gestante sem qualquer exceção que não fosse o trabalho remoto, a resposta era negativa para todos os questionamentos.
Ou seja: caso não fosse possível exercer suas atividades em teletrabalho, não havia opção que não fosse o empregador custear a remuneração da gestante e afastá-la do trabalho.
A Lei 14.311/2022 autorizou, a partir da sua publicação, ocorrida em 10 de março de 2022, o retorno ao trabalho da gestante que (a) estiver com o ciclo vacinal completo, de acordo com os parâmetros estabelecidos pelo Ministério da Saúde e pelo Plano Nacional de Imunizações (PNI); (b) se não estiver imunizada, poderá retornar ao trabalho se assinar termo de responsabilidade e de livre consentimento para exercício do trabalho presencial, comprometendo-se a cumprir todas as medidas preventivas adotadas pelo empregador; (c) em qualquer hipótese (ou seja, imunizada ou não), quando houver o encerramento do estado de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, o que ainda não ocorreu.
Essa última lei ainda trouxe a previsão de que o empregador poderá, respeitadas as competências para o desempenho do trabalho e as condições pessoais da gestante para o seu exercício, alterar as funções por ela exercidas.
O ciclo vacinal completo, segundo a Nota Técnica 11/2022-SECOVID/GAB/SECOVID/MS, é verificado, no caso da gestante com mais de 18 anos e que não seja imunocomprometida, quando ela tiver recebido as 1ª e 2ª doses e a dose de reforço (3ª dose).
As gestantes que recusarem à vacinação e que não assinarem “o termo de responsabilidade e de livre consentimento para exercício do trabalho presencial” deverão permanecer, portanto, afastadas do trabalho recebendo a remuneração do empregador, já que permanece vigente o estado de emergência (Portaria 188/2020 do Ministério da Saúde) e a nova lei manteve ao empregador a responsabilidade de custear o afastamento.
(*) André Luis Nacer de Souza é juiz do trabalho e professor de Direito do Trabalho.