Desafios do teletrabalho dos professores na pandemia
Todo mundo foi atingido pelos impactos da pandemia de Covid-19, e eu não me refiro somente à saúde, acho que isso todo mundo concorda. No dia a dia do trabalho, como nos estudos e relacionamentos, as pessoas tiveram mudanças em suas rotinas.
Foram transformações mais superficiais, como ter que usar máscaras no dia a dia, à completa inversão na prática profissional. Quero abordar nesse artigo o que temos de novo no trabalho dos professores e professoras.
Sem preparação, de um momento para o outro, vários docentes precisaram trocar a sala de aula pela videoconferência, a aproximação física pela distância digital, e assim tiveram que enfrentar, como quase todo mundo, uma reviravolta profissional.
Essa mudança foi feita de maneira brusca e improvisada, até porque não havia como ser diferente. Com a pandemia os docentes foram para o trabalho à distância, digital, com aulas on-line e que acontecem em tempo real ou que são gravadas para depois.
Aqui entra um ponto importante, os professores tiveram que levar para dentro das suas casas parte da instituição de ensino, além de terem que aprender a utilizar equipamentos de tecnologia para as aulas.
Lembrando que a educação é um direito assegurado a todos.
Como era de se esperar, começaram a surgir problemas contratuais como o desrespeito à jornada de trabalho, adoecimento dos profissionais, responsabilidade indevida pelos equipamentos tecnológicos e abuso do uso da imagem e produção intelectual. Vamos começar por aí:
Quem se responsabiliza pela infraestrutura e equipamentos necessários para o teletrabalho?
A responsabilidade com a infraestrutura, despesas em geral e em adquirir ou fornecer os equipamentos tecnológicos para o teletrabalho é do empregador, da instituição de ensino.
Deve-se ressaltar que, nestes casos, a infraestrutura vai além das ferramentas como tablet, computador e celular. Inclui desde o mobiliário adequado, uma internet mais veloz a programas de computadores (softwares) que permitam, ou no mínimo, contribuam para que as aulas cheguem até os alunos com qualidade e didática.
Caso o empregado tenha todo o equipamento tecnológico necessário é possível que autorize a utilização dele por meio de contrato escrito e pagamento de um valor mensal definido com a escola.
Por fim, não se pode esquecer que o problema ultrapassa o fornecimento ou reembolso da infraestrutura, afinal, só investir em tecnologia não basta. É preciso formar os professores para usá-la da melhor forma com os estudantes, o que nem sempre acontece devido a vários fatores, dentre eles, a falta de apoio dos empregadores e o alto custo do desenvolvimento profissional.
A imagem e a produção intelectual podem ser livremente divulgadas?
Não! Para que seja utilizado a imagem, a voz e o material produzido é necessária uma autorização expressa dos professores. E, mesmo com esse consentimento, a divulgação não pode ocorrer de maneira livre.
Por isso é muito importante se atentar para os detalhes dessa autorização.
Primeiramente, deixar claro a sua vigência, ou seja, o tempo de uso do conteúdo. O ideal é que essa autorização se limite ao período de suspensão das atividades presenciais, estando automaticamente cancelado com a reabertura das instituições de ensino. Isso garante ao profissional que a aula gravada não seja reproduzida em momento posterior, de modo definitivo e/ou por prazo indeterminado pelo estabelecimento educacional. Afinal, a ausência de delimitação de uso das aulas virtuais perderia a sua finalidade de atender à medida de segurança de isolamento social decorrente da pandemia.
Outro ponto que merece destaque é a propagação do material gravado, devendo se limitar a uma única vez com a exibição para a turma que compõe a carga horária semanal contratada do professor. Caso haja outras reproduções, deve-se estimar um valor a ser recebido, um custo adicional.
E, por fim, a proibição de uso da imagem, voz e produção intelectual para qualquer outro fim que não seja a aula contratada.
Qual a jornada de trabalho a ser cumprida no teletrabalho?
A jornada a ser cumprida é a contratual, ou seja, a mesma que o professor realizava quando lecionava de maneira presencial.
E, não se pode esquecer que dentro desse horário contratual não está previsto apenas o tempo gasto com as aulas, mas também devem ser consideradas todas as demais funções como elaboração do conteúdo, a correção de tarefas, participação em bancas de trabalho de conclusão de cursos, reuniões, atendimentos aos pais, dentre outras.
Em caso de qualquer alteração para aumentar essa jornada, tem que haver o pagamento. Caso contrário, fica como realização de hora extra.
Aumento dos casos de adoecimento dos professores
Como relatado anteriormente, o isolamento social aconteceu de forma inesperada e os professores tiveram que readaptar a sua rotina em um curto intervalo de tempo, sem qualquer suporte das instituições de ensino e sem o domínio e preparo necessário para uso das novas ferramentas de trabalho.
Isso gerou uma enorme preocupação com a didática do ensino nessa classe de profissionais que acabam somando com outras preocupações do momento vivido, tais como, a instabilidade do vínculo profissional frente a redução das mensalidades, encerramento do ano letivo e rescisão de contratos dos alunos com as escolas, além das altas cargas de trabalho para transformar de forma rápida e completa o estudo presencial no modelo remoto.
Se não bastasse os problemas todos do momento, os professores também estão sofrendo com o futuro: como será a volta? Os noticiários mostram vários países permitindo que as escolas voltem ao presencial, logo depois avaliam a retomada dos contágios e acabam por terem que voltar atrás. A insegurança e o medo acompanham esses profissionais na incerteza do retorno ao modo tradicional.
Um levantamento feito pelo Instituto Península realizado entre abril e maio de 2020 apontou que, em uma escala de zero a cinco, educadores e educadoras classificaram, em média, como 2,15 (em uma escala de 0 a 5) o impacto desse cenário em seu bem-estar. Ou seja: a pandemia tem causado grandes e negativos impactos na saúde mental desses trabalhadores.
Como consequência, o número de doenças psiquiátricas relacionadas com o trabalho, as denominadas doenças ocupacionais, disparou.
Transtorno de ansiedade, crises agudas de estresse, depressão e síndrome de burnout passaram a fazer parte da realidade dos professores que sequer foram devidamente afastados de suas atividades e encaminhados à Previdência Social.
Nesses casos, o professor deve procurar tratamento médico e, caso queira, ir em busca de uma indenização moral e material (pagamento das despesas do tratamento médico, manutenção do plano de saúde e pensionamento) da instituição de ensino por ter lhe causado um adoecimento.
Essas situações muitas vezes são ignoradas pelos profissionais, mas nem sempre são simples de serem resolvidas com terapia e uso de medicamento, podem chegar a incapacitá-los por longo período. Por isso, a importância de se procurar uma ajuda profissional de confiança na área médica e na jurídica.
Teletrabalho não é bagunça
Diante desse cenário novo, desconhecido para muitos e desafiador para todos os professores, que sempre mantiveram suas atividades durante a pandemia, o ideal é que conheçam os seus direitos, procure saber se alguma coisa mudou frente ao teletrabalho implementado e, principalmente, que façam com que esses direitos prevaleçam, pois a falta de esclarecimento pode tornar o contrato de trabalho abusivo em vários aspectos.
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Priscila Arraes Reino, advogada especialista em direito previdenciário e direito trabalhista e Marcella Rocha de Oliveira, advogada trabalhista do escritório Arraes e Centeno, pós graduada em Direito e Processo do Trabalho. Visite nosso site clicando aqui