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Sobre a construção do Palácio da Justiça do TJ/MS

Josiberto Martins de Lima (*) | 08/02/2023 13:32

O Parque dos Poderes, inaugurado no ano de 1982, abriga os órgãos centrais dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de Mato Grosso do Sul, bem como as sedes do Tribunal de Contas, Ministério Público Estadual, Justiça Federal, Receita Federal, Procuradoria da Fazenda Nacional, entre outros.

A área do Parque é de 135,2573 hectares, contando com a reserva do Parque Estadual do Prosa. Em uma área contínua, a jusante das nascentes dos córregos Prosa, Joaquim Português e Reveilleu foi criado em 1993 o Parque das Nações Indígenas, pelo então governador Pedro Pedrossian, com uma área de 119 hectares.

Na parte superior, à leste do Parque das Nações Indígenas, tem uma reserva ecológica denominada Parque Estadual do Prosa, onde está situado o Centro de Reabilitação de Animais Silvestre, uma referência no assunto, que acolhe diversas espécies de animais vítimas de acidentes ou apreendidos de traficantes.

Ao todo, esse complexo Administrativo-Ecológico, soma 254,2573 hectares, onde além das sedes dos órgãos públicos referidos existem pistas de caminhadas, ciclovias, lagos artificiais, museus, Praça de Grandes Eventos, Concha Acústica, quadras de areia para jogos de vôlei e beach tennis, Pista de Skate e o Bioparque Pantanal, inaugurado em 2022. Essas instalações destinadas às atividades esportivas, lazer e shows artísticos são muito bem utilizadas pelos campo-grandenses e turistas, principalmente aos finais de semanas e dias de feriados.

Ao longo do tempo o complexo Administrativo-Ecológico experimentou muitas transformações, com melhorias da estrutura de lazer, mas sofreu outras intervenções indesejadas advindas da exploração imobiliária, sem as necessárias obras compensatórias ou mitigatórias, que provocaram o assoreamento e carreamento de sedimentos para os lagos artificiais do Parque das Nações Indígenas.

Os sedimentos foram retirados dos lagos em uma operação complexa e dispendiosa, mas devido à não execução de obras de contenção de forma satisfatória, já se nota a necessidade de outra operação no mesmo sentido.

Além disso, no entorno desse complexo, ao Sudeste e ao Norte, foram construídos vários condomínios residenciais e loteamentos de grandes áreas, com destaque para a região da Chácara dos Poderes, com a consequente supressão da mata nativa que servia de abrigos para animais silvestres, como antas, cotias, macacos, mutuns, quatis, tamanduás, tatus, entre outros. Boa parte desses bichos buscaram refúgios nas áreas remanescentes da mata nativa dentro do complexo Administrativo-Ecológico.

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, que tem uma ampla sede na área, e um bloco anexo com amplo estacionamento, inclusive outro estacionamento construído às pressas, quase que na calada da note, que está ocioso, anunciou no dia 14 de dezembro de 2022, que vai construir um novo Palácio em um terreno de 65 mil m², no Parque dos Poderes.

Deixando de lado as questões referentes a necessidade, adequação e prioridade do efetivo serviço Judicial aos jurisdicionados, que devem ser consideradas, mas que não é o escopo deste artigo, passo ao tema proposto, considerando três fatores que efetivamente preocupam, dados os efeitos e danos potenciais que poderão advir da execução de uma obra colossal, suntuosa, em uma área tão sensível.

Vou me ater a três fatores considerados tormentosos, quais sejam (i) supressão de 65 mil m² de vegetação nativa; (ii) eliminação de refúgios de animais silvestres; (iii) perda de área permeável com aumento de riscos de inundações.

A supressão de 65 mil m² de vegetação nativa em uma área a montante, na parte alta da cidade, que sofre com os efeitos da especulação imobiliária é causa de grande preocupação, uma vez que pode influir na mudança do clima na área e nas adjacências, e impactar o fluxo das nascentes dos córregos, visto que a área fica acima de onde nascem os córregos Prosa, Joaquim Português e Reveilleu.

A eliminação da vegetação nativa vai destruir refúgios dos animais silvestres e pássaros que habitam o complexo Administrativo-Ecológico. Muitos desses animais e pássaros que foram expulsos das áreas lindeiras ao complexo, onde foram construídos condomínios residenciais.

A perda de área permeável devido à construção da colossal estrutura trará como consequência o aumento do carreamento de águas pluviais e sedimentos para o fundo do vale com graves riscos de enchentes e inundações. A cidade de Campo Grande tem áreas sensíveis aos efeitos de alagamentos, e uma dessas áreas fica logo abaixo do complexo Administrativo-Ecológico.

Os tormentos causados por eventos de grandes chuvas ocorrem com frequência. No dia 4 de janeiro de 2023 foi registrada uma chuva em torno de 100 milímetros, que provocou alagamentos em vários pontos da cidade, especialmente na área que fica abaixo de onde o TJ/MS pretende construir o seu palácio.

Considerando esses fatores, afigura-se necessário uma melhor reflexão sobre a execução da noticiada construção do Palácio da Justiça pretendida pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. A sociedade Campo-grandense merece ser informada para exercer o direito de opinar sobre tal obra e seus efeitos adversos, que não são poucos.

As autoridades públicas, dentro de suas responsabilidades e competências, devem refletir sobre o tema, considerando os efeitos perversos que a obra pode ocasionar aos munícipes e ao meio-ambiente, que trará danos irreversíveis à fauna e flora, além do potencial aumento de riscos de alagamentos nas áreas que ficam à jusante do complexo Administrativo-Ecológico, densamente ocupada por residências, comércios e um complexo viário muito movimentado, podendo provocar danos materiais e perdas de vidas humanas.

(*) Josiberto Martins de Lima é advogado.

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