Fã de Vinícius Júnior, menino já teve de trocar de escola por conta do racismo
Mães contam como aprenderam a enfrentar a dor dos filhos em escolas públicas de Campo Grande
"Eu fiquei bem abalada, meu filho ficou bem abalado”, conta Thayanne Ferreira Bitencourt, de 29 anos. Mãe de uma criança de 6 anos, a autônoma viu de perto a dor que o meninho sentiu ao sofrer por ser preto. Desde então, ela faz o que pode para tentar inibir os efeitos desse preconceito na vivência dele.
Thayanne conta que o filho frequentava uma escola do bairro quando falou pela primeira vez que era tratado diferente por duas colegas. O caso ocorreu no ano passado, mas ela lembra claramente a raiva e dor que sentiu. “Ele já tinha questionado sobre as colegas desfazerem dele por ser negro. Um certo dia deixei ele na porta da sala e presenciei a cena, as colegas não deixaram ele sentar na cadeira ao lado delas. Fiquei p...! Retirei ele da sala, fui pra coordenação”, diz.
Como a queixa na direção não deu certo, a mãe preferiu mudar o menino de escola. Na nova instituição com novos colegas, está mais tranquilo, sem o preconceito. Mas o racismo, segundo Thayanne, segue sendo um assunto dentro de casa. “Eu converso bastante com ele, falamos para ele contar na hora se tiver acontecendo”, afirma.
Para trabalhar a confiança e autoestima da criança, a mãe e o pai, Vinícius, fazem elogios, o chamam por apelidos carinhosos, como “nêgo charmoso”. Além disso, a autônoma diz que recebe apoio constante da Cufa (Central Única das Favelas) para falar sempre sobre racismo com o filho e mostrar que não há nada de errado com o tom de pele dele.
O resultado tem surtido efeito e hoje o menino tem como inspiração outros homens negros. Fã do jogador Vinícius Júnior, ele celebrou o aniversário de 6 anos com uma festa inspirada no atleta brasileiro que atua pelo Real Madrid.
Vitoria Gabrielly Jara Lessa, de 21 anos, usa as ferramentas que tem para que a filha sinta orgulho dos traços genéticos que herdou. A educação racial é algo que a cantora, conhecida pelo nome de ‘Suburbia Única’, coloca em prática de forma lúdica coma filha de 3 anos.
“Tento passar de uma forma didática até porque não sou professora, mas sendo preta tenho minhas formas de ensinar sempre. A forma que encontrei de começar isso é estimulando ela a ver desenhos que tenham crianças negras, sempre presenteio com bonecas negras também”, explica.
Devido a pouca idade, a menina ainda não entende sobre racismo e como essa forma de violência é colocada na sociedade. “Minha família é muito miscigenada, então minha filha convive com muitas pessoas negras e não entende o conceito e nem vê diferença na cor de pele das pessoas”.
Filha de uma mulher branca, a compositora cresceu sem as referências que hoje tenta passar para a filha. No período que frequentava a escola, Vitória e as irmãs foram mais de uma vez alvos desse tipo de preconceito. Na época, ela não conseguia entender o porquê daquilo acontecer. “Todas as situações de racismo que passamos na infância minha mãe resolvia com barraco ou violência, mas nunca nos explicou o que estava de fato acontecendo, acho que pra nos proteger”, relata.
Um passo de cada vez, ela faz o que pode para fazer diferente com a filha. Nesse processo, a cantora está aprendendo, assim como a mãe. “Ela está sendo letrada junto comigo e minhas irmãs”, comenta.
Mãe de gêmeos, Rosenilda Gonçalves da Filha, de 47 anos, é mais uma mulher negra que sente os desafios de preparar os filhos para uma sociedade que ainda é preconceituosa. Os dois não puxaram o tom retinto da mãe. Ainda assim, Rosenilda conhece bem as diferenças. “Costumo falar que temos menos oportunidades por conta disso, Converso sobre o nosso cabelo também”, fala.
As crianças nunca foram vítimas de racismo na escola e a mãe dá graças a Deus por isso. “Nunca aconteceu, porque eles não são tão escuros”, explica. Durante a conversa, ela só lamenta a ideia que a filha teve de querer alisar o cabelo. “O cabelo dela era tão bonito e amarelinho, mas ela não gostava”, pontua.
Rosy Romualdo, de 54 anos, descobriu cedo que iria enfrentar dificuldades devido à cor da pele. Em casa, o alerta partiu dos pais que deram um jeito de preparar Rosy para situações que poderiam enfrentar. Seguindo esse exemplo, a bióloga conta ter feito o mesmo na hora de educar a filha Marina Romualdo, de 24 anos.
“Eu criei a minha filha do mesmo jeito que meus pais me criaram: sabendo que a qualquer momento poderia surgir uma coisa para as pessoas ofenderem”, conta.
Outra coisa que os pais de Rosy ensinaram é que a única forma de se defender era se impondo e estudando. “Eu passei para a minha filha esses valores que temos que ser os melhores porque quando a ofensa acontece, se você for boa, não irá te afetar tanto”, comenta.
A professora também fez questão de proteger a filha e minimizar os efeitos do racismo. “Como ela estudou numa escola particular só tinha ela de negra e indígena, mas nunca deixei ela passar por situações onde não conseguisse se defender. Eu nunca deixei que ela sofresse”, ressalta.
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