Entidade de pastores terá R$ 40 mil da prefeitura para "Semana da Criança"
A organização do evento é restrita aos evangélicos. Igreja Católica não foi convidada.
A Prefeitura de Campo Grande repassará, a titulo de "fomento", R$ 40 mil para entidade que congrega pastores para custear atividades entre os dias 10 e 15 deste mês, na Semana da Criança, na antiga Cidade do Natal, hoje Vila Morena, no prolongamento da Avenida Afonso Pena.
As atividades foram anunciadas ontem, durante evento com a prefeita Adriane Lopes (PP) e o presidente do Conselho de Pastores do Mato Grosso do Sul, Wilton Acosta, candidato derrotado a deputado federal pelo Republicanos.
Depois, no fim do dia, foi publicada edição extra do Diário Oficial do Município com extrato de termo de fomento com a Sociedade Evangélica Beneficente, a ser firmado com dispensa da exigência de chamamento de outros eventuais interessados, que é a modalidade de seleção para este tipo de vínculo.
O valor foi informado por Acosta à reportagem. Conforme repassou, via mensagem de Whatsapp, o orçamento total do evento é de R$ 250 mil, vindo o restante de igrejas e patrocínios.
A programação inclui atividades culturais, como teatro, música, contação de história, envolvendo pastores. Haverá ainda, diariamente, palestras sobre prevenção à violência sexual contra crianças, suicídio e também sobre os desafios das redes sociais.
A programação consta no site soscrianca.com.br. Além dos eventos, a página contém somente outras três publicações, datadas de 17 de agosto.
A alegação de impossibilidade de realizar a licitação é assinada pela secretária de Cultura e Turismo, Mara Bethânia Bastos Gurgel de Menezes, com o argumento de que a entidade religiosa seria a única capaz de realizar a celebração, tendo “comprovada experiência na realização do evento objeto da parceria, dada sua notória expertise e experiência acumulada ao longo dos anos, especialmente no que diz respeito ao teor religioso do evento.”
O arcebispo de Campo Grande, Dom Dimas, disse que desconhecia a parceria da prefeitura com representantes religiosos. Nessa época, a Igreja Católica se concentra em sua agenda própria, diante do Dia da Padroeira, Nossa Senhora Aparecida, comemorado no dia 12, junto com o Dia das Crianças, e a Semana da Vida.
A Lei federal Nº 13.019, de 2014, que trata de formas de parceria com organizações da sociedade civil, admite a possibilidade de dispensa de licitação em situações excepcionais, como guerra, calamidade ou para proteção da integridade de pessoas sob ameaça. Considerar a seleção inexigível, somente quando for inviável a competição, “em razão da natureza singular do objeto”.
O município também criou regramento próprio para os chamamentos, o decreto nº 14.969, de 2021, estabelecendo o passo a passo para a tramitação e aprovação das parcerias, incluindo apresentação prévia dos projetos de interessados. No Diário Oficial da prefeitura, a única publicação é a do afastamento da exigência da seleção, feita na noite de ontem.
O vereador André Luís (Rede) estranhou a parceria divulgada às vésperas do evento. “Isso é falta de gestão. Algumas coisas são realmente urgência. Caiu um prédio, uma barragem rompeu, teve uma tempestade, isso são situações de urgência. Então a negligência do poder público em fazer as coisas não é dispensa de licitação.”
Já o líder da prefeita na Câmara, Beto Avelar (PSD), pontuou que a administração municipal atua respeitando a legalidade. A reportagem tentou obter mais informações sobre a tramitação da iniciativa com a prefeitura, mas não obteve resposta até o fechamento da matéria.
Proteção às crianças – Embora estejam previstas várias atividades culturais, no anúncio feito ontem, a prefeita destacou a necessidade de união de esforços entre a administração e religiosos para combater a violência contra criança.
Ela chegou a falar em uma missão, aliada à oração e à resistência, e o evento representar oportunidade para despertar as pessoas para a prevenção. Uma das ações da semana, no dia 10, é o lançamento de um abusômetro, para contabilizar casos de violência.