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Taxa de suicídio entre crianças é maior do que se pensa, diz psicóloga

Viviane Oliveira e Marta Ferreira | 04/11/2011 18:23

Em entrevista, a psicóloga fala que a depressão infantil não é tão facilmente identificável como na vida adulta

Segundo a psicóloga, a principal doença que pode levar ao suicídio infantil e adolescente é a depressão.(Foto: Arquivo/pessoal)
Segundo a psicóloga, a principal doença que pode levar ao suicídio infantil e adolescente é a depressão.(Foto: Arquivo/pessoal)

A morte de um garoto de 10 anos e a suspeita de que tenha se jogado da janela do 13º andar, após cortar a tela de proteção, provocou comoção, nesta sexta-feira, e, com certeza, acendeu uma luz de preocupação em cada pai ou mãe que lê essa notícia. Pode uma criança dessa idade cometer suicídio?

A Polícia Civil ainda está no início das investigações e não confirma, embora tenha dado sinais de que essa é a hipótese mais forte até agora, dadas as circunstâncias. E um dos delegados que foi ao local alertou: pais devem prestar mais atenção aos filhos e aos sinais que eles dão.

O Campo Grande News traz, abaixo, a conversa com uma especialista no assunto, para ajudar pais, mães, parentes e amigos sobre o assunto. A psicóloga Abigail Lago afirma, na entrevista a seguir, que o que a Polícia suspeita que tenha ocorrido com o menino Gabriel é mais comum do que se pensa.

Campo Grande News: A morte do garoto, com a suspeita forte de que tenha sido suicídio, surpreende e deixa perplexo por se tratar de uma criança de 10 anos. Crianças podem chegar a esse ponto?

Sim, segundo pesquisas, a taxa de suicídio entre crianças e adolescentes vem aumentando progressivamente nas últimas quatro décadas, um dado alarmante sobre o qual não se ouve muita discussão na sociedade. Segundo dados da OMS – Organização Mundial da Saúde (2000), no mundo inteiro o suicídio está entre as cinco maiores causas de morte na faixa etária de 15 a 19 anos. O suicídio tem sido considerado a segunda principal causa de morte de jovens entre 15 e 19 anos, perdendo apenas para os acidentes de carros e de motos por alguns autores, no máximo como terceira causa de morte, por outros autores.

Pelo conhecimento da psicologia, a que doenças psiquiátricas está ligado esse tipo de situação?

A principal doença que pode levar ao suicídio infantil e adolescente é a depressão. Outros fatores de risco são o abuso de drogas ou álcool, situações psicossociais recentes (como a mudança de escola e casa ou a separação dos pais, dificuldades na escola e o fim de um namoro), baixa auto-estima, acesso a armas de fogo, tentativas anteriores de se matar e a ausência de tratamento psicológico após a primeira tentativa. Portanto, a ansiedade, o motivo existencial e a depressão estão fortemente relacionados com a intenção suicida.

Que sinais os pais devem observar em seus filhos, para não ser vítima de algo do tipo?

Dentre os principais fatores estão a tristeza frequente, o desespero, a fácil irritabilidade e a manifestação do desejo de estar morto. Nem sempre esses sintomas são nítidos nas crianças. A depressão, a causa mais comum do suicídio, não é tão facilmente identificável na infância como é na vida adulta. Nem sempre a tristeza é aparente e por isso é importante observar se há na criança a perda de interesse pelas atividades que habitualmente eram interessantes.

Nas crianças e adolescentes é comum a depressão ser acompanhada também de sintomas físicos, tais como fatiga, perda de apetite, diminuição da atividade, queixas inespecíficas, tais como cefaléias, dor nas pernas, náuseas, vômitos, cólicas intestinais, vista escura, tonturas, etc. Na área do comportamento, a depressão na infância e adolescência pode apresentar dificuldades nas relações com os demais, familiares e colegas, perda de interesse por pessoas e isolamento. As alterações cognitivas da Depressão infantil, principalmente relacionadas à atenção, raciocínio e memória interferem sobremaneira no rendimento escolar.

Morte de garoto em edifício na Capital reacendeu debate sobre problemas psicológicos. Peritos usam boneco para simular queda. (Foto: João Garrigó)
Morte de garoto em edifício na Capital reacendeu debate sobre problemas psicológicos. Peritos usam boneco para simular queda. (Foto: João Garrigó)

Como lidar com uma notícia dessas entre crianças, como por exemplo, entre os alunos que são colegas de Gabriel?

É importante ter muita cautela, pois ainda não esta comprovado que foi suicídio. As explicações devem ser dadas pelos pais e professores com base nos dados de realidade. O suicídio infantil é um tema quase indiscutido e intocado, pois coloca em cheque o mito da inocência infantil. Por isso, na maioria dos casos se atribui o ato suicida a um possível acidente doméstico. Considero importante esclarecer todas as duvidas das crianças utilizando uma linguagem adequada a idade.

Há uma ética dentro do jornalismo, que é de não divulgar casos de suicídio, pra não incentivar. O que vocês, psicólogos, defendem neste caso?

Deixar de falar sobre determinado assunto não faz com que ele se resolva ou não aconteça. É fundamental esclarecer as causas e sintomas para que a população tenha acesso às informações e assim possa ter uma atitude de prevenção em relação ao suicídio entre crianças e adolescentes. A divulgação de casos como esse, acredito que deve ter por objetivo à prevenção do suicídio, que envolve uma série de atividades, abrangendo desde o tratamento efetivo dos distúrbios mentais até um controle ambiental dos fatores de risco.

O fim de ano é uma época mais preocupante?

Por ser um período de festas onde várias emoções afloram, as pessoas portadoras de transtornos tendem a agravar o quadro suicida, ou seja, o suicida sofre de um processo de adoecimento contínuo e prolongado, que pode manifestar crises nessa época.

É importante fazermos uma distinção entre idéias suicidas e tristeza de final de ano. Na primeira trata-se de pessoas acometidas de um comprometimento grave de sua estrutura, necessitando de atendimento especializado, sendo indicado tratamento psicológico juntamente com tratamento psiquiátrico. Tendo em vista que o acompanhamento e apoio familiar são imprescindíveis para a melhora do paciente.

No segundo caso, mais comum e frequente, o indivíduo ao repensar o ano que passou, se depara com perdas e frustrações, planos ou metas que não foram alcançados, mas a tristeza tende a diminuir conforme o passar dos dias e a proximidade do ano que se inicia, renovando esperanças e expectativas de dias melhores.

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