Regalias a preso eram tantas que incomodaram até chefões do PCC
Facção convocou teleconferência para que preso explicasse porque só ele tinha regalias
Ligações ilimitadas da sala do diretor do presídio, faltas justificadas por meio de atestados falsos e encomendas de drogas entregues na porta da unidade penal. O nível de regalias concedidas ao detento Pedro Antunes Chalega Filho era tão alto, que passou a incomodar outros detentos, membros do PCC (Primeiro Comando da Capital), também presos no Estabelecimento Penal de Corumbá – distante cerca de 419 quilômetros de Campo Grande.
Por conta das regalias particulares, o detento, que é membro da facção, foi chamado para uma teleconferência com líderes do PCC, a fim de esclarecer as desavenças com os demais faccionados, porque das regalias que ele gozava e os outros não.
As informações estão na denúncia da Operação Xadrez, realizada em 23 de janeiro, que aponta crimes de peculato, falsidade documentação e associação criminosa, num esquema com irregularidades na administração de cantinas, além de venda de pães e gelo clandestino.
Nesta teleconferência de criminosos, interceptada pelo MPE, Pedro deixa explícito que é integrante do PCC e que está disposto a acatar as ordens do “partido10”, ocasião em que outro integrante da organização, conhecido como “Da Kaiser”, tece vários elogios ao detento, informando aos demais comparsas que Pedro está ajudando vários integrantes da facção.
O detento, por sua vez, confirma não apenas o contato com o então diretor do presídio Ricardo Wagner Lima do Nascimento, como também revela que consegue a entrada dos produtos proibidos por meio dele.
Ainda na ligação, o preso diz aos líderes da facção que está para ajudar a massa carcerária, e não para favorecer a polícia. E que em todas as unidades que já passou (Máxima de Campo Grande e Estadual de Dourados) ele sempre fechou com o PCC. O preso também faz questão de deixar claro que se for para derrubar a cadeia ele derruba (rebelião) que a função dele é ver o que esta acontecendo na cadeia, e passar as informações para os demais presos.
Já no dia 9 de novembro do ano passado, Pedro Antunes liga para o então diretor do estabelecimento penal de regime Semiaberto, Aberto e Assistência ao Albergado, Doglas Novaes Villas.
Conforme a denúncia, ele pede a liberação de um preso do regime semiaberto para tráfico de drogas. Doglas também é citado por, em tese, autorizar que detento chegasse em horário diverso, não pernoitasse no presídio e apresentasse atestado falso.
Esquema - A denúncia do MPE aponta que se instalou na engrenagem do sistema penitenciário de Corumbá um lucrativo esquema de desvio de dinheiro que deveria aportar nos cofres públicos.
As irregularidades envolviam as vendas na cantina, comercialização dos pães produzidos no presídio e gelo clandestino, um item cobiçado na cidade marcada por altas temperaturas. No dia da operação, foram encontrados R$ 16.663 no caixa da cantina do Estabelecimento Penal.
A cantina ainda ofertava itens proibidos, como arroz (usado na produção de bebida artesanal), dois chips de celular e remédios para disfunção erétil. No presídio, também foram encontrados 400 sacos de gelo, cada um de três quilos, sem nota fiscal. O gelo era fabricado com água e energia elétrica pagos pelo poder público. Um agente relatou ao Ministério Público que o comércio do gelo rendia R$ 9.600 por mês.
Ainda de acordo com a promotoria, o dinheiro pela venda dos pães era pago diretamente a Ricardo, que fazia o saque na “boca do caixa”. A empresa informou pagamento de R$ 96 mil pelos produtos em 2016. O esquema ainda envolveria Gilson de Assis Martins (então diretor de Assistência Penitenciária).
Numa estreita ligação, Pedro Antunes, que também se autodenomina como “Cabeça da Cantina”, ligou para Ricardo em 25 de novembro de 2016 para saber o que fazer diante de um ofício do MPE sobre denúncias da cantina.
No último dia 17, o juiz da 2ª Vara Criminal de Corumbá, Deyvis Ecco, recebeu a denúncia e deferiu as prisões preventivas dos réus Antonio Batista Chalega, Pedro Antunes Chalega Filho, Ricardo Wagner Lima do Nascimento e Doglas Novaes Villas.
Inocência – A defesa de Doglas informa que ele alega inocência e não concorda com as acusações do Ministério Público. Segundo o advogado Rafael Medeiros Duarte, há um pedido de habeas corpus no TJ/MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul). A reportagem não conseguiu contato com os demais denunciados.
Alvo de duas operações do Ministério Público em 2017, a Agepen (Agência de Administração do Sistema Penitenciário) maneja um orçamento anual de R$ 234 milhões e é responsável por 15.310 presos. O valor não inclui os gastos com educação e saúde dos presos, custeadas pelas respectivas secretarias.