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Artes

Grafismos da pele são levados até para calçados como luta de Aline

Artista guarani-kaiowá, de Dourados, encontrou no vestuário e nas telas formas de levar a militância

Por Aletheya Alves | 16/11/2023 07:25
All Star personalizado por Aline com grafismos repassados por seus ancestrais. (Foto: Divulgação)
All Star personalizado por Aline com grafismos repassados por seus ancestrais. (Foto: Divulgação)

Seja em telas, roupas ou calçados, Aline de Souza da Silva, decidiu levar sua militância enquanto guarani-kaiowá para o maior número de espaços. Utilizando os grafismos tradicionais que são inseridos na pele, ela narra que é através deles que transmite as mensagens de seu povo para o mundo.

“Meu nome de batismo indígena é kunatai yvotyju, que traduzido para o português é moça das flores amarelas. Tenho 25 anos de idade, sou acadêmica e artista plástica. Na minha família, há uma miscigenação do povo guarani, kaiowá e terena, mas me afirmo como guarani-kaiowá”, se apresenta Aline, nascida na aldeia Jaguapiru, em Dourados.

Apesar da arte estar presente em sua vida desde a infância, já que os grafismos integram o cotidiano enquanto parte de sua cultura, ela narra que sempre gostou de desenhar de forma geral. “Porém, é todo um processo para a gente se auto reconhecer enquanto artista e esse processo, para mim, começou no ano de 2019, mas mesmo assim era bem sutil”.

Desde então, Aline passou a se entender como artesã, estilista e artista plástica, tudo se unindo à forma com que entende sua luta. “Pinto os grafismos em tela e também coloco nelas aquilo que me atravessa naquele momento. É a forma como eu traduzo o mundo que vejo”, explica sobre as telas.

Já a parte do vestuário integra seus caminhos a partir de uma necessidade, em suas palavras. De acordo com a artista, ela sempre viu  nas cidades peças que não são culturais de seu povo, mas devido às políticas de integração, o uso dessas roupas se tornou algo não opcional.

“Então, com as roupas queria passar a imagem e mostrar para o mundo sobre mim. Sou uma indígena militante e ativista que defende as causas indígenas, era isso que eu também queria transmitir no que usava e uso. Por isso, comecei a produzir as peças que usava com grafismos e tinha um significado para meu povo”, detalha.

Além das roupas e sapatos, artista leva a simbologia para as telas. (Foto: Divulgação)
Além das roupas e sapatos, artista leva a simbologia para as telas. (Foto: Divulgação)

Ainda sobre os grafismos, Aline narra que justamente esse tipo de escrita é algo que conecta o presente e o passado, “o grafismo sempre esteve sobre as nossas peles. Os tempos mudaram, mas a nossa essência não”.

Observando o cenário de possibilidades e espaços abertos para os povos indígenas, ela defende que é sempre necessário que haja ainda mais locais.

“Algo que sempre me incomoda nos espaços da arte é que muitas das vezes nossa arte chega primeiro do que nós, povos indígenas”, diz Aline. Explicando sobre, ela detalha que muitas pessoas não indígenas vão até as aldeias, pesquisam sobre as artes, a cultura, se apropriam e não geram devolutivas para a comunidade, “ganham edital se apropriando desses conhecimentos que são do nosso povo e não dão espaço para nós artistas”.

Outro ponto defendido por ela é que há uma categorização generalizada dos indivíduos enquanto artesãos, “sim, temos artesãos incríveis em nossa comunidade e em muitas outras comunidades indígenas, porém também temos muitos artistas incríveis tanto no ramo da música, da moda e, assim como eu, nas artes visuais e audiovisual”.

A partir dessas pautas, Aline explica que, de forma geral, sempre tenta levar o conhecimento ancestral de seu povo. “Nossa cosmologia, o nosso entendimento de como devemos cuidar da nossa terra, a dor e a luta da mulher indígena. Tudo o que me atravessa, a beleza da nossa cultura, a forma comum de todos esses conhecimentos se mistura dentro de mim desses três povos (guarani, kaiowá e terena) e coloco em minhas obras”, relata.

E, completando o raciocínio, ela diz que o conhecimento de seu povo conseguiu vencer o tempo, passando de geração em geração, chegar até ela. Por isso, hoje é seu momento de absorvê-lo e repassá-lo, mas também mostrando um pouco disso para o mundo.

“Vejo que em nosso estado sempre houve um apagamento histórico da cultura indígena. As pessoas nos colocam como figuras estáticas paradas no tempo, mas não, nós estamos aqui. Vejo que, nesse momento, é necessário que minha voz seja traduzida na língua do colonizador de uma forma que possa ser ouvida e vista para ser transmitida para além da minha aldeia com tudo o que tem nos atravessado”.

Para acompanhar os trabalhos de Aline, seu perfil no Instagram é @kunataiyvotyju.

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