Isabê e a angústia de uma arte “presa” na pandemia
Afetada pela pandemia logo após criar seu ateliê, Isabê usou o contexto como motor de sua arte
Era começo de março quando visitamos o recém-criado Ateliê Refazenda, no bairro Santa Fé. A artista Isabê realizava um sonho: ter o próprio espaço de criação, além da possibilidade de trocar experiências com outras pessoas que porventura visitariam o local.
A pandemia veio como um copo de tíner jogado em em suas telas, transformando o sonho em uma jornada solitária, mas disruptiva do ponto de vista artístico.
“Acho que ninguém saiu o mesmo desse ano. O primeiro fator é justamente o distanciamento social, a própria arte em si exige trocas. Transferir o que antes era especial do coletivo e do espaço público pro privado foi difícil, eu sinto muita falta das pessoas. O ateliê mesmo foi aberto semanas antes da pandemia e a quarentena começar em peso e a proposta inicial do espaço era ser um espaço cultural na cidade. Foi um soco no estômago em todos os sentidos, financeiros, psicológicos, emocionais”, diz Isabê.
A angústia causada pelo contexto foi terreno fértil para a artista, que começa a mostrar um belíssimo trabalho nascido nesse período em seu Instagram.
“Essa semana comecei a publicar uma nova série que produzi na quarentena e que surgiu de uma angústia enorme com relação as queimadas no Pantanal. Senti que o descaso foi superior à valorização da natureza e o esquecimento geral do impacto das nossas ações no meio ambiente gerou consequências, eu senti o fogo queimando como um chamamento mesmo, acho que todo mundo se sentiu assim. A gente esqueceu que também é bicho e que bicho precisa de outras gentes. Precisa de colo, de água, de sombra. Então não só como artista, acho que esse ano me mudou como bicho”,
É difícil falar sobre o estilo de Isabê, apesar ser claro que há um próprio. Ela retrata muitas figuras, misturando sentimentos e sensações, algo bem original.
“Minha mãe sempre pergunta quem são as pessoas, eu não sei responder (risos). Sabe aquela história de que você nunca sonha com um rosto que você já não tenha visto? São rostos que eu já vi um dia na vida e acho que de certa forma o cérebro arquivou. Alguns trabalhos têm referências fotográficas com relação a forma mas ainda assim não são pessoas específicas. Tudo é referência né, nada vem do nada”.
As coisas devem continuar como estão durante um tempo, e as redes sociais devem continuar fazendo o “papel” das exposições presenciais, tão vitais para os artistas.
“As redes sociais são muito tentadoras mas muito distantes do que é realmente participar de um quadro ao olhar pra ele. Você rola o feed e pronto, passou. Você vai ver mais rostos e mais pessoas falando e nenhum tempo foi realmente dedicado. Já o trabalho-vivo é o negócio. Você se locomove, a sala tem um clima, um cheiro, uma luz. E aí que vem a solidão do processo, não saber como foi a experiência do trabalho com as outras pessoas. Pra compensar a falta de "exposição" eu produzi muito, isso foi ótimo. Acreditar na arte como uma ação mesmo”, finaliza a artista.
Confira o trabalho de Isabê em seu Instagram (clique aqui).
Curta o Lado B no Facebook e no Instagram. Tem uma pauta bacana para sugerir? Mande pelas redes sociais, e-mail: ladob@news.com.br ou no Direto das Ruas através do WhatsApp do Campo Grande News (67) 99669-9563.