Professor transforma quintal em construção maluca e abre espaço para visitação
Lugar virou espaço para aventura em um bairro que há tempos é lembrado pela violência
Quando a hora de mudar de cidade chegou, o quintal alegre e gigante de casa ficou no passado. Mas a saudade fez o professor de Filosofia Pablo Oliveira, de 47 anos, morar numa área distante e construir sozinho um quintal cheio de cores e brinquedos para reunir amigos. Com naves espaciais, arvorismo, mirantes e até um barco gigante na porta de casa, Pablo provou que criatividade não tem limite.
Natural de Aquidauana, há 18 anos ele vive em um terreno de 500 m² no bairro Portal da Lagoa, área rural da cidade que há tempos estampa manchetes de jornais como um loteamento irregular, seguido de problemas estruturais e tomado pela violência. Mas para mudar essa realidade, pelo menos, para as mais de mil famílias que vivem na região, Pablo tem intenção de fazer a diferença.
"Morei muito tempo em chácara, em Aquidauana, mas quando vim pra cá essa alegria toda me fazia falta. Quando me casei, em 2000, comprei este espaço que não tinha nada, só mato".
Pablo construiu uma casa e passou a cuidar do quintal para brincar com o filho. Com a separação e a ida do menino com a mãe para Porto Velho, ele diz que precisava dar um novo destino ao quintal que sobrava. "Foi quando eu tive a ideia de explorar o quintal da forma mais criativa possível. A ideia dos brinquedos com recicláveis eu tive há dois anos".
Em contato com as cooperativas, o professor passou a comprar materiais recicláveis para colocar sua ideia em prática. "Seleciono as peças, lavo e depois começo a transformar".
Pablo diz que sempre teve o "espirito da criatividade". Chegou a trabalhar em um agência de Publicidade e Propaganda onde ganhava para criar, mesmo sem formação publicitária, e resolveu trazer o talento para o dia a dia. "Eu me desenvolvi com a arte muito rapidamente, não posso ver uma coisa que já quero transformar".
E a transformação começa do jeito mais inusitado, na frente de casa, na Rua Enzio Massi. Pablo construiu um barco em cima de um ponto de ônibus para que a estrutura se tornasse um ponto de contemplação. Utilizando madeiras, PVC e outros objetos comprados de catadores, o barquinho é o que mais chama atenção no bairro. "As crianças ficam malucas, passam admiradas, gostam de ver a paisagem".
Para subir é preciso uma escada que Pablo só coloca quando há presença de adultos. "Aqui é um espaço para a família, também não deixo as crianças subirem sozinhas, a proposta é que elas venham com os pais para se divertirem e aproveitarem da criatividade".
Há semanas, o local chegou a ser divulgado como "parque de diversões", mas Pablo esclarece que é apenas um quintal. "É um quintal de aventura. Parque é uma coisa muito maior e não temos estrutura para isso".
Ainda no ponto de ônibus, Pablo decidiu trabalhar com a leitura. Usando duas estruturas de hidrantes, o objeto guarda livros e revistas que ficam à disposição de quem passa na rua. "Aqui tem pouco movimento, mas direto vejo a criançada sentada e lendo por aqui".
Já no quintal ele foi além. Fez a imaginação chegar a três metros de altura com a construção de dois mirantes ligados por uma ponte de madeira, amarradas com cordas e cabos de aço entre árvores do cerrado. Antes mesmo da entrevista, ele já esperava a equipe em um dos mirantes com café quentinho na mesa. Foi preciso coragem para subir as escadas e andar na ponte bamba até o professor. Uma aventura gigantesca para quem tem medo de altura até ao subir em cadeira.
Com o vento, o barulho das árvores é o que acalma no alto e o canto dos pássaros viram melodia. Para o professor, são detalhes que trazem chance de fazer poesia e filosofar. "Eu consigo até meditar aqui em cima. É um cantinho em que a aventura te permite repensar na vida, ver o poder que a nossa natureza tem e o quanto a gente pode usá-la para fazer o bem".
Mesmo sem nenhuma formação em Engenharia ou Arquitetura, Pablo garante que a construção é segura. "Foram dois anos fazendo tudo nos mínimos detalhes. Também contei com ajuda de pessoas que entendem de construção para deixar tudo bem firme".
No chão o quintal é tomado pelas naves espaciais feitas com recicláveis. Pedaços de ventilador, latarias de carro, eletrodomésticos, tudo vira brinquedo transformado nas mãos do professor.
Uma ala de robôs também interage com as visitas. Feitos com aspirador de pó, furadeiras e até aparelho de inalação, os objetos acedem luzes, fazem barulhos e inspiram a criançada.
O que parece acumulação para uns, é objeto de transformação para Pablo. "Escolhi viver de um jeito diferente, através da arte. E nosso bairro é lamentavelmente conhecido por coisas ruins. Isso me deixa triste porque há famílias incríveis aqui. Então eu acredito que um morador pode fazer diferença no seu bairro sem esperar o braço do Estado".
Quem tiver interesse de conhecer o local, o telefone para contato é (67) 99144-3309.