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19 de Abril: Dia Nacional de todos os povos indígenas do Brasil

Por Kleber Gomes | 19/04/2024 13:30

Hoje, 19 de Abril, celebramos por todo o Brasil, o Dia Nacional dos Povos Indígenas. É uma data especial, na qual unimos todas as forças e inspirações para fazer com que o país conheça muito mais a respeito de nossa história de existência e de resistência. Tempo também de grandes reflexões e de ações pontuais e estratégicas relacionadas ao nosso movimento indígena em solo nacional.

Pela segunda vez, o Brasil olha para o 19 de Abril como o "Dia Nacional dos Povos Indígenas" e não mais o "Dia do Índio", como a data era conhecida até o ano de 2022. Essa mudança ocorreu em julho retrasado por meio da aprovação da Lei Federal 14.402/2022. A palavra "índio" foi considerada problemática por se tratar de um termo genérico e não considerar a diversidade dos 305 povos indígenas hoje no país. Nesse Dia especial, reforçamos a nossa luta por sobrevivência desde o início da colonização do Brasil até os genocídios modernos.

Com muito orgulho e vivacidade, em cada canto deste país, temos mostrado, neste Abril Indígena, a força de nossa história de existência e de resistência, por meio de informações e detalhes sobre aquilo que somos e temos em cada povo indígena presente nessa imensidão toda de terras chamada atualmente de Brasil.

Somos não somente um povo, mas sim vários. Prosseguimos mostrando ao Brasil que os 305 povos indígenas na atualidade, possuem costumes, crenças, identidades, artes, histórias e culturas singulares. Dessa forma, juntos e juntas, os/as indígenas lutamos em unidade na escrita autônoma de nosso futuro.

Segundo números do último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o de 2022, somos hoje no Brasil 1.693.535 indígenas. Esse número expressivo do quantitativo da atual população indígena no país revela o quanto estamos bem vivos e presentes em cada canto do Brasil. Apesar de termos sido alvos de tantas ações mortíferas e destrutivas nestes últimos 524 anos, sobrevivemos, de forma corajosa e perseverante.

Apesar de todas as ações diretas e indiretas, ao longo cinco séculos, as quais visaram apagar por completo os nossos idiomas, persistimos, com ações de luta e resistência, ao ensinar, falar e divulgar as línguas dos povos originários deste país. São 274 línguas indígenas existentes na atualidade no Brasil. Nossa garra não deixará que esses idiomas se percam com o tempo.

O Brasil tem hoje os seus povos indígenas em cada um dos 26 estados e também no Distrito Federal. Por todos esses lugares, os/as indígenas têm seguido bravamente a escrita de sua história de existência e de resistência. O Amazonas é o estado do Brasil com a maior população indígena, com 1.693.535 de pessoas. Não há como falar a respeito dos/as indígenas e se esquecer dos povos indígenas em contextos urbanos. Não importam os lugares nos quais estejamos, ambientes rurais, matas, rios, grandes ou pequenas cidades, sempre seremos os povos originários destas terras. Clamamos por mais respeito, mais honra, mais dignidade, aos/às indígenas que vivem hoje em contextos urbanos pelos mais variados cantos do Brasil.

Este Abril Indígena tem sido a oportunidade de o Brasil conhecer mais um pouco a respeito da religiosidade dos povos originários destas terras. Por aqui estamos há mais de 10 mil anos e, bem antes das crenças além-mar terem chegado por aqui, tínhamos já um conjunto completo e rico de crenças, práticas e costumes em nosso entendimento sobre a natureza, a espiritualidade e a visão do amanhã. Os povos originários, assim como em outras áreas, merecem todo o respeito e a honra com relação àquilo que pensam, creem e ensinam a respeito do sagrado.

Prosseguimos também em busca de quebras de estereótipos e de inverdades a nosso respeito. No ano de 1500, não houve uma "descoberta" do Brasil. Quando os portugueses por aqui chegaram, iniciaram uma fase destrutiva e exploradora ao extremo contra nossas terras, culturas, identidades e história. A colonização foi algo muito violento e desumano, só não sendo mortal por completa a nós devido à força e à garra da resistência imprimida por nossos/as ancestrais.

O Brasil tem aprendido, mesmo após longos anos nos quais perduraram o racismo, o preconceito, a depreciação e a discriminação, a usar nos dias atuais os termos corretos com relação a nós. Ciências como a história e a antropologia trouxeram novas páginas na forma como o país trata hoje os povos originários destas terras. Não somos bugres, índios, mestiços, misturados, cafuzos, caboclos, pardos. Somos, sim, os povos indígenas destas terras.

Os indígenas expressam no corpo e no rosto a identidade cultural que possuem. As pinturas são as marcas de muitos povos e são distintos para cada ocasião. As tintas provêm de elementos naturais, como o urucum e o jenipapo e perduram na pele de 15 a 20 dias. As pinturas indígenas, assim como nossas danças, músicas, artes, religiões e idiomas, são também o símbolo bem vivo da existência e da resistência dos nossos 305 povos originários do Brasil.

Nesse dia celebramos conquistas e avanços de nossos povos. Por todas as partes do Brasil, vários e várias indígenas têm se formado nos mais diferentes cursos. Sem deixarmos nossas identidades e nossas culturas, temos assumido vários postos de trabalho e prestado com excelência serviços da mais alta qualidade para a sociedade brasileira. Já somos vários/as advogados/as, médicos/as, professores/as, políticos/as, enfermeiros/as indígenas. Isso demonstra, com fatos e no dia a dia, o enorme potencial que todos/as nós temos de estudar, de nos capacitar e de seguirmos adiante na busca e na concretização de nossos sonhos.

Muitos e muitas indígenas atualmente têm nos enchido de orgulho, pela ascensão que tiveram recentemente. No último dia 6, nosso parente Ailton Krenak foi empossado na Academia Brasileira de Letras (ABL), sendo o primeiro indígena a alcançar essa importante cadeira na maior e mais conhecida academia intelectual do Brasil. Temos uma Ministra de Estado, à frente da importante e inédita pasta, Ministério dos Povos Indígenas, nossa parente Sônia Guajajara. Esses postos alcançados por nossos parentes Ailton e Sônia mostram o enorme potencial que todos/as os/as indígenas temos de alcançar todos os postos, os lugares e os ambientes que desejarmos.

O dia também é de desafios e de lutas. O Abril Indígena de 2024, mais uma vez, reforça a importância de o Estado brasileiro se comprometer, na prática e de forma concreta, com a demarcação de todas as terras indígenas. As terras indígenas são para nós vida, celebração, identidade e memorial de nossa história e ancestralidade. Tentaram, de vários modos, nos destruir por completo, retirando de nós nossas terras e nos retirando de nossas terras. No entanto, estamos mais vivos e resistentes do que nunca, prosseguimos nas reivindicações por nossos territórios.

Nesses 524 anos de convívio com as ações destrutivas que, de várias maneiras, tentaram nos apagar por completo, seguimos na resistência, ao continuarmos a escrita da história de nossa existência. Há quem diga que não, no entanto, vemos claramente ações deliberadas no sentido de ou nos colocarem às margens do Brasil atual ou de, descaradamente, continuarem as tentativas de nossa destruição total. Para toda e qualquer ação atual que atente contra nossa vida e dignidade, seguem nossas respostas impregnadas de garra, luta e persistência.

Temos lutado por todo o país pela criação de novas escola indígenas, através das quais nossos saberes, nossa culturas, nossas artes e nossos idiomas sejam perpetuados e cada vez mais conhecidos pelos/as brasileiros/as não indígenas. Por exemplo, Campo Grande capital do Mato Grosso do Sul, com quase 20 mil indígenas e perto de 30 comunidades indígenas, ainda não conta com uma escola indígena. Temos batalhado para que, em breve, essa escola seja criada nessa cidade.

A política de saúde para os povos indígenas é um dos temas mais delicados e problemáticos da política indigenista oficial. Sensíveis às enfermidades trazidas por não índígenas e, muitas vezes, habitantes de regiões remotas e de difícil acesso, as populações indígenas são vitimadas por inúmeras doenças, tais como malária, tuberculose, infecções respiratórias, hepatite e doenças sexualmente transmissíveis.

Desde quando foi criada a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), no ano de 1967, diferentes instituições e órgãos governamentais se responsabilizaram pelo atendimento aos povos originários. As diretrizes foram alteradas em inúmeras momentos , mas, com exceção de casos pontuais, na maior parte das vezes, a situação sanitária entre os/as indígenas foi algo insatisfatório.

Somos os povos originários destas terras do Brasil e prosseguimos com nosso compromisso milenar da defesa e da preservação do meio ambiente.

Somos os/as guardiões/ãs das florestas, das matas e das águas de todos os cantos deste imenso país. Nossa existência e resistência estão diretamente ligados a tudo aquilo que segue preservado na natureza. Vemos a vida e temos a vida em cada pequeno traço e detalhe que compõem o meio ambiente em todo o solo brasileiro.

Por todos os cantos do Brasil, nós, povos originários destas terras, temos nos unido e nos articulado mais e mais, a fim de que nossos direitos sejam respeitados. Em cada parte do Brasil, os/as indígenas estão a romper o silêncio que, por tempos, foi nos imposto e assim buscar que cada brasileiro/a saiba muito mais a respeito de nossa existência e resistência. Nunca mais um Brasil sem nossa voz e ação! Essa é a força do 19 de Abril.

Por meio da nobreza desta nossa data festiva, convidamos os brasileiros e as brasileiras a um entendimento de que o Brasil é terra indígena e, dessa forma, buscamos uma maior compreensão e respeito a tudo aquilo que somos. A todos/as os parentes (termo carinhoso que usamos para nos referir a um/a outro/a indígena) espalhados/as por esse país continental, feliz Dia Nacional dos Povos Indígenas.

(*) Kleber Goemes é Indígena terena, professor na Rede Municipal de Ensino (REME) de Campo Grande/MS e mestrando do ProfHistória da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)

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