A prática em sala de aula da Lei 11.645/2008
No ano em que se completam dezesseis anos da criação da Lei Federal 11.645/2008, a qual tornou obrigatório o ensino da história e da cultura dos povos indígenas em todas as escolas brasileiras de educação básica, vários desafios ainda se fazem presentes quanto ao cumprimento da mesma.
Neste mês de agosto, onde comemoramos no dia 9 último o Dia Internacional dos Povos Indígenas, algumas reflexões tornam-se muito importantes, quando temos a ciência de que grande parte do país ainda desconhece a temática indígena com relação à história e cultura dos 305 povos originários hoje existentes no Brasil.
Um primeiro ponto a ser considerado tem a ver com as formações de professores/as, tanto a inicial como a continuada, meios pelos quais sejam capacitados os/as docentes para que se tornem facilitadores/as no aprendizado da temática indígena pelos/as alunos/as nos espaços escolares Brasil afora. A sala de aula torna-se assim um estratégico ponto de partida, no intuito da promoção de um maior conhecimento da temática indígena aos/às brasileiras.
Um outro destaque, em termos de desafios à prática da Lei 11.645/2008, relaciona-se com a produção de material de qualidade, atualizado e que auxilie, na prática, no combate a inúmeros estereótipos criados ao longo dos anos com relação aos/às indígenas. Um exemplo disso é o pensamento ainda bem propagado de que os povos originários não estão inseridos nos centros urbanos do país. Neste exato momento, em Campo Grande, capital do estado do Mato Grosso do Sul, encontram-se quase vinte mil indígenas e grande parte da população local desconhece esse fato. Materiais pedagógicos que expressem a realidade dessas populações indígenas nos contextos urbanos do Brasil são um exemplo do que professores/as necessitam para seus planejamentos de aulas voltadas ao ensino da temática indígena.
Um outro desafio quanto ao cumprimento da Lei 11.645/2008 tem ligação direta com o desejo de grupos contrários ao ensino da temática indígena em sala de aula, uma resistência que objetiva perpetuar as populações indígenas às margens das tão almejadas "ordem e progresso" para o país. Esse obstáculo no cumprimento da Lei em destaque faz com que, por exemplo, a questão da demarcação de terras indígenas, algo assegurado pela Constituição Federal de 1988, seja visto pela sociedade como algo relacionado a um crime quando povos indígenas lutam no momento pelas suas terras ancestrais e de origem. O cumprimento da Lei 11.645/2008, portanto, é um meio de resistência à uma orquestração de séculos que visa diminuir e apagar a existência indígena no país.
A prática em sala de aula da Lei 11.645/2008 é também o sinônimo do combate a preconceitos, ao racismo, à discriminação e à depreciação os quais são submetidos os povos originários do Brasil. Superados os desafios ao cumprimento dessa Lei, maior será o alcance das informações pontuais e corretas relacionadas à cultura dos/as indígenas e à sua história de existência e de resistência nesses últimos 524 anos desde o primeiro contato com os colonizadores no final do século XV.
Por fim, quando cumprida a Lei acima citada, vários resultados surgem, tais como políticas públicas relacionadas aos povos originários e maior conhecimento por parte do país a respeito da grandeza e riqueza da história e cultura dos/as indígenas destas terras. Que muito mais aulas sejam ministradas tendo como tema central a continuidade da escrita autônoma da história de existência e de resistência dos povos indígenas do Brasil.
(*) Kleber Gomes é indígena Terena, professor na Reme (Rede Municipal de Ensino) em Campo Grande/MS e mestrando em Ensino de História da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS).
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