Ainda é possível usar a contribuição única para triplicar a aposentadoria?
Um termo criado pelo professor Márcio Hartz faz bastante sucesso e desperta a curiosidade das pessoas. Trata-se do “Milagre da Contribuição Única”, uma forma de triplicar o valor da aposentadoria com uma única contribuição sobre o valor máximo.
Muitos brasileiros têm essa possibilidade em mãos e nesse artigo vamos aprofundar esse assunto, de forma que todos entendam: como isso acontece? Como pode ser feito? Quem tem esse direito? Ainda pode ser feito? E diversas outras dúvidas que serão esclarecidas aqui.
O que é o “Milagre da Contribuição Única?
Essa alternativa surgiu com a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103 de 2019, em 13.11.2019. Portanto, não é uma invenção ou “jeitinho brasileiro”, na verdade, é uma possibilidade real de triplicar a aposentadoria com apenas uma contribuição paga ao INSS antes do pedido de aposentadoria, com base no teto da previdência social.
Ele é possível para segurados não aposentados ainda, que tenham, até julho de 1994, 15 anos de tempo de contribuição ou quase isso, podendo incluir para a soma deste período, tempo como segurado especial (trabalhador rural em regime de economia familiar), tempo de serviço público, inclusive no exército, e tempo de aluno aprendiz.
Como a possibilidade existe para as aposentadorias da regra de transição por idade, é preciso que o homem esteja com 65 anos de idade, ou próximo disso, e a mulher com 61 anos de idade, ou próximo disso.
Algumas pessoas que já se aposentaram pelas novas regras de aposentadoria e não tiveram os descartes realizados, podem ter direito a revisão de suas aposentadorias, mas nesse caso é preciso fazer cálculos e analisar o processo administrativo de aposentadoria do segurado.
Não é cabível para...
- Para segurados que não tem tempo de contribuição antes de 1994;
- Que pensam na possibilidade de se aposentar apenas com uma contribuição. É importante não gerar confusão, pois a contribuição única é uma regra de cálculo e não apenas uma contribuição em toda a vida trabalhista;
- Para quem já se aposentou antes de 13 de novembro de 2019 (Reforma Previdenciária).
Como funciona o cálculo da aposentadoria após a reforma
O cálculo das aposentadorias após a reforma da previdência é feito da seguinte maneira:
Primeiro, faz-se a média de todos os salários de contribuição referentes aos períodos a partir de julho de 1994 até a data do pedido de aposentadoria. Para fazer a média é preciso corrigir todos os salários de contribuição antes pelo INPC. A média é chamada de salário de benefício.
Encontrada a média, que chamamos de salário de benefício, aplica-se o coeficiente base de 60%. Esse coeficiente é aumentado em 2% a cada ano de contribuição a mais, além de 15 anos para as mulheres e 20 anos de contribuição para os homens.
Quando acontece de o segurado ter mais tempo de contribuição do que o mínimo exigido, é possível descartar os menores salários de contribuição para aumentar o valor total de seu benefício, desde que permaneça com o tempo mínimo necessário para cumprir a exigência para o tipo de aposentadoria escolhido.
Um exemplo sempre ajuda a entender
Uma mulher que conta com 20 anos de contribuição e 61 anos de idade hoje, pode se aposentar na regra de transição por idade. Como ela possui 5 anos a mais de tempo de contribuição que o mínimo exigido para esta regra, ela pode “descartar” 60 meses de contribuição cujos salários tenham sido mais baixos, para ficar somente com os maiores salários e obter uma média mais alta.
Sobre a média é aplicado o coeficiente de 60%, já que sobrou para ela somente os 15 anos, não mais que isso.
Nota-se que quanto mais tempo de contribuição tem, mais descartes podem ser feitos, aumentando a média. Mas ao mesmo tempo é preciso ficar atento aos descartes, já que quanto mais anos de contribuição possuir, maior será o coeficiente aplicável.
Sem descartar nada, a média dos salários de contribuição ficou em R$ 2.200,00 e descartando os menores salários, a média dela ficou em R$ 3.800,00.
O coeficiente para o caso dela ficar com os 20 anos de contribuição, sem qualquer descarte, é de 70% (60% + 2% ao ano que ultrapassa 15 anos), portanto neste caso a aposentadoria ficaria em R$ 2.200,00 x 70%= R$ 1.540,00.
Por outro lado, caso ela faça o descarte, o cálculo é feito a partir da média de R$ 3.800,00 x 60% = R$ 2.280,00.
Ficou fácil de entender a diferença que pode fazer a possibilidade de descarte das menores contribuições e a importância dos cálculos com o exemplo.
O pulo do gato…
Bem, o pulo do gato agora ficou fácil.
Para chegar ao salário de benefício, que é a média sobre o qual se aplica o coeficiente de 60%, entram para o cálculo somente os salários de contribuição a partir de julho de 1994, lembra? Os salários de contribuição referentes aos períodos até junho de 1994 são simplesmente ignorados para fins de cálculo do valor da aposentadoria.
É por isso que se o segurado tem 15, 20 ou 25 anos de contribuição antes de julho de 1994, os valores de contribuição não importarão, já que não entrarão no cálculo da média.
Então pensa aqui comigo em outro exemplo:
Um homem, nascido em 1956, chegou aos 65 anos em 2021. Já tem a idade necessária para se aposentar atualmente. Trabalhou em um banco entre julho de 1972 e junho de 1994 e depois foi demitido.
Em 1996 este homem abre uma empresa e inicia suas contribuições como sócio administrador da empresa, sempre pelo salário mínimo, tendo contribuído por mais 10 anos.
Com 32 anos de contribuição ao todo, este homem poderia se aposentar com 84% (60% + 24%) da média, mas considerando que todas as suas contribuições a partir de julho de 1994 foram sobre o salário mínimo, sua aposentadoria seria de um salário mínimo. Isso porque ninguém se aposenta com menos que o salário mínimo.
Mas se ele fizer uma só contribuição sobre o teto máximo do INSS (R$ 6.433,57), antes de pedir a sua aposentadoria, poderá descartar todas as contribuições sobre salário mínimo, e aplicar o coeficiente somente sobre a contribuição feita sobre o teto, resultando em uma aposentadoria no valor de R$ 3.860,00.
A aposentadoria subiu de salário mínimo para R$ 3.860,00 com uma única contribuição a mais antes do pedido de aposentadoria.
Como funciona o simulador de aposentadoria do INSS?
No INSS Digital é possível fazer simulações e gerar o histórico com vários detalhes e informações de lugares que você já trabalhou. Nessa ferramenta é possível somar o tempo e ter noção da quantidade de tempo trabalhado, e conseguir visualizar quantos anos você possui antes e depois de 1994, que pode ser fundamental para a dinâmica do planejamento e para avaliar se no seu caso é possível ou não fazer uso da contribuição única para triplicar sua aposentadoria.
Porém, mesmo com todas as ferramentas disponíveis, é sempre interessante consultar um especialista para evitar confusões e alguns erros que podem influenciar nas decisões cruciais para o seu futuro. Não tome as decisões sozinho e não faça contribuições e estratégias arriscadas, sem antes consultar um advogado, para ter certeza de todas as possibilidades para melhorar sua aposentadoria.
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Priscila Arraes Reino (*), advogada especialista em direito previdenciário e direito trabalhista, palestrante e sócia do escritório Arraes e Centeno. Visite nosso site clicando aqui