Alfabetização, letramento, raciocínio lógico-matemático e IA
No Brasil, o contexto da educação é histórico e dramático, ocasionado por fatores econômicos, políticos, sociais e culturais que refletem uma perspectiva de segregação e de privilégios, desde o período da colonização. Isso tornou o ensino seletivo, excludente, acarretando problemas graves na alfabetização, no raciocínio lógico-matemático, além de comportamentos inadequados, transtornos de aprendizagem, fracasso escolar, entre muitas outras situações no campo educacional e social.
Essas situações graves na educação aumentaram com a obrigatoriedade e expansão da escolarização básica e fundamental no início do século 20, com aparecimento de um grande número de crianças e jovens com dificuldades de aprendizagem, que a escola comum, a educação regular, não conseguiam lidar, apesar da evolução das teorias científicas educacionais, medicinais, modelos socioeconômicos, filosóficos, entre outros, que valorizam os direitos humanos.
Portanto, este artigo busca refletir sobre conceitos de igualdade de oportunidades e de condições necessárias eficientes, desde o nascimento, na construção do conhecimento, nas relações socioculturais, na busca do respeito e direito à diferença e justiça social, e analisar a falta de alfabetização e raciocínio lógico-matemático consolidados para utilizar de maneira adequada o espaço virtual.
Uma pesquisa recente de um site de tecnologia mostra que os brasileiros estão passando um total de nove horas e 13 minutos por dia nas redes sociais, se destacando mundialmente. Ficam atrás somente da África do Sul, e o levantamento ainda mostrou que o seu uso abrange usuários entre 16 e 64 anos.
Outro levantamento preocupante é a pesquisa TIC KIDs Online, do Comitê Gestor da Internet no Brasil, que mostra que em 2022, a população com idade entre 9 e 17 anos era usuária de internet, e o celular, o dispositivo mais usado pelas crianças e adolescentes.
O uso crônico de telas, segundo estudo recente de pesquisadores da Universidade de Hong Kong, prejudica a neuroplastia das crianças, compromete a formação e reorganização de redes neurais do cérebro, além de poder afetar o desenvolvimento cognitivo, gerando dependência, prejudicando a linguagem, o raciocínio lógico-matemático, a criatividade, a diminuição da atenção e da concentração, dificultando os relacionamentos entre pares, entre muitos problemas, como os acadêmicos.
Além disso, o demasiado uso da internet criou problemas nas relações sociais e afetivas entre familiares, amigos e, em muitas outras circunstâncias, pela ausência de comunicação física verbal e/ou oral entre os seres humanos e de forma perigosa, como fake news, influencers digitais, entre outros, que desinformam, ludibriam e espalham ignorância de forma implacável e perversa.
Logo, é preciso analisar se esta quantidade de horas no seu uso está adequada, uma vez que, nesta fase de vida das crianças e jovens, ocorrem os processos de aprendizagens fundamentais para adquirir conhecimentos para seu desenvolvimento futuro e das gerações seguintes.
Entretanto, as crianças e jovens das escolas públicas, na sua maioria, são provenientes de diferentes culturas e realidades socioeconômicas desfavorecidas, que dificultam a alfabetização consolidada, ou seja, não a utilizam socialmente com significado, com finalidade prática, social e de forma lógica.
Na época que surgiu a IA, 1950, já existiam muitas teorias sobre o desenvolvimento humano e aprendizagem que proporcionaram grandes contribuições com programas e avaliações na área educacional, social e cultural, principalmente para alfabetização e raciocínio lógico-matemático.
Os mais destacados foram:
- Ivan Petrovich Pavlov (1849-1936), nascido em Riazan (Rússia), fisiologista, biólogo, psicólogo e epistemólogo, defendeu a Epistemologia Genética e a Teoria do Conhecimento, com o objetivo de desvendar os mistérios da aprendizagem. Pesquisou a salivação dos cachorros, percebeu que esses animais começavam a salivar antes de verem a comida e concluiu que a aprendizagem ocorre quando os estímulos são apresentados de forma conjunta, ficando associados. É o chamado Condicionamento Clássico ou Condicionamento de Pavlov.
- Burrhus Frederic Skinner (1904-1990), outro cientista, psicólogo e filósofo norte-americano, desenvolveu a teoria baseada na ideia de que o aprendizado ocorre na mudança no comportamento manifesto, tendo como conceito o Condicionamento Operante, ou seja, considera os estímulos como reguladores das aprendizagens, os quais se resumem em estímulo e resposta (E-R). Quando o estímulo (E) produz uma resposta (R) desejada é recompensado com elogios, boa nota, sentimento de realização, satisfação. Entretanto, quando a resposta (R) ao estímulo (E) é indesejada ou ocorre novamente, pode ser punida, com objetivo de diminuí-la.
Esses dois cientistas pertencem à Teoria Behaviorista, que teve início em 1913 (século 20), com um manifesto criado por John B. Watson (1878-1958), psicólogo norte-americano que lançou as bases teóricas do Behaviorismo Metodológico, que repudia a noção de consciência e se baseia em estudos feitos por meio da observação do comportamento, pois esse último seria visível e passível de observação, ao contrário dos processos internos da mente.
O Behaviorismo foi adotado por diversas instituições e sociedade, como escolas, empresas, grupos de trabalho, entre outros contextos, criando a Teoria Clássica dos Testes (TCT) e a Teoria de Resposta ao Item (TRI).
O TCT é um conjunto de técnicas baseadas na quantidade de acertos, não exigindo pressupostos rigorosos, pois o todo coerente é o mais importante, enquanto o TRI é instrumento exclusivo da psicologia para análise da inteligência, Quociente de Inteligência (QI), criado pelo psicólogo alemão Willian Stern, em 1912, como medida de raciocínio de um indivíduo.
Esses três estudiosos acima mencionados pertencem à Teoria Comportamental, pois entendem o educando como um ser que responde aos estímulos exteriores e não considera o que ocorre em sua mente.
Portanto, a aprendizagem é entendida como uma mudança de comportamento e não leva em conta o estudante como ser cognoscente e questionador, mas sim como um memorizador de conteúdos e muitas vezes sem compreender seus significados.
Concomitante à Teoria Comportamental, houve outros cientistas, estudiosos, que defenderam o desenvolvimento humano e aprendizagem como uma estrutura com dois polos, ou seja, o educando como sujeito cognoscente, histórico-social e o processo de construção do conhecimento, ocorrendo em interação recíproca com o professor e seus colegas, num movimento dialético e sem interrupção das construções acabadas, sanando as lacunas e necessidades.
Um dos cientistas que defenderam esta posição teórica foi Jean Piaget, nascido em Genebra, Suíça (1896-1980), biólogo, psicólogo e epistemólogo, considerado um dos mais importantes pensadores do século 20.
Piaget, ao contrário dos três anteriores, defendeu uma abordagem interdisciplinar para a investigação epistemológica e criou a Teoria do Conhecimento com base no estudo da gênese psicológica do pensamento humano, lidando, principalmente, com as necessidades para os processos de construção do conhecimento, que se dá durante a infância e a adolescência.
Essa teoria defende uma metodologia educacional, na qual o conhecimento é adquirido por meio da interação do indivíduo com o meio ambiente em que vive, pois são agentes ativos e cognitivos, que se comprometem com a construção do seu próprio conhecimento, integrando a nova informação no seu esquema mental de maneira significativa.
Logo, os alunos são o centro da aprendizagem e, assim, obrigados a interagir uns com outros e a terem as suas próprias experiências, assumindo um papel ativo no processo de aprendizagem, realizando experimentos, observações, adicionando novos conhecimentos baseados no que já conhecem, obtendo mais informações sobre o mundo ao seu redor. A Teoria do Conhecimento de Piaget divide o desenvolvimento cognitivo em quatro estágios principais: Estágio sensório-motor (desde o nascimento até cerca de dois anos); Estágio pré-operacional (de dois a sete anos); Estágio Operacional Concreto (de sete a 11 anos) e Estágio Operacional Formal (11 anos ou mais). Nesta fase, são capazes de usar a lógica para resolver problemas, planejar seu futuro.
Durante esses estágios, as crianças e jovens constroem o raciocínio lógico-matemático essencial para a compreensão conceitual, para estabelecer relações entre as informações e resolução de problemas das funções executivas, como: atenção, organização, memória, habilidades temporais e espaciais, que os levam a ter a capacidade de perceber e de se relacionarem com o mundo de forma pensante.
O raciocínio lógico-matemático é essencial para construir uma base para as demais aprendizagens, como a argumentação e a interpretação, efeitos que repercutem, além das aulas de matemática, mas em toda a jornada escolar, pois viabilizam a construção de significados dos conteúdos aprendidos, e não decorá-los, além de lhes dar autonomia na busca de novos conhecimentos, fundamentais para sua maturidade intelectual, social, cultural, entre outras.
Outro cientista, Henri Wallon (1897/1962), francês, com formação em filosofia e psiquiatria, retratou seu interesse pela psicologia interacionista, principalmente da infância, se destacando, fundamentalmente, na educação dos menos privilegiados, atuando como presidente da Comissão de Reforma Educacional da França.
Neste período, propõe o famoso Plano Longeviy-Wallon, que reconhece que o fator orgânico é a primeira condição para o desenvolvimento do pensamento, porém ressalta a importância das influências do meio e não desconsidera que o desenvolvimento e suas potencialidades psicológicas dependem do contexto sociocultural.
Nessa mesma época, o mundo ocidental teve contato com os principais psicólogos experimentais russos, que defenderam teorias muito diferentes dos behavioristas, mas muito identificadas com a Teoria do Conhecimento e Interacionista de Piaget.
Consideravam insuficientes os resultados do desenvolvimento e aprendizagem, como um estado hereditário e suas possibilidades de desenvolvimento eventual, por meio da instauração de comportamentos corretos e compensatórios. Os mais expressivos foram:
- Alexei Leontiev (1903-1979), psicólogo e filósofo, criou a Teoria da Atividade, que defende que o desenvolvimento de uma criança é determinado pelo processo educativo e a aprendizagem acontece nas relações entre os sujeitos cognoscentes num determinado contexto sociocultural;
- Alexander Luria (1902-1977), um dos principais neuropsicólogos da neurociência cognitiva e da neuropsicologia, pois seus estudos para o diagnóstico são efetuados por investigação eletrofisiológica, baseados na atividade elétrica do córtex, permitindo constatar que os reflexos de orientação e de adaptação a uma situação (característica da atividade nervosa superior), ao ser perturbado por excitação verbal ou solicitação, podem ser igualmente afetados, apresentando uma inércia e/ou uma fragilidade viscosa;
- Lev Vygotsky (1896-1934), fundador da abordagem sociointeracionista, também chamada Psicologia histórico-social, uma vez que a formação da criança se dá numa relação direta entre ela e o meio sociocultural, que interfere de forma decisiva no aprendizado, sob a direção e a ajuda dos adultos. É definido por ele como Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), ou seja, que define o nível de desenvolvimento atual e o potencial, exposta num contexto dinâmico na interação entre duas pessoas, e a criança passa a interiorizar o ensino, tornando-o função psíquica interna. Logo, ZDP é a esfera interpsicológica, pois os significados são construídos de forma coletiva, porém assimilados individualmente.
Segundo Vygotsky, o teste que a criança é capaz de realizar com a ajuda do adulto, como são aplicados no mundo ocidental, separa “continuum métrico o normal e o anormal”, que ocasiona estratificação social, legitima a hierarquização das orientações escolares, não permite as inter-relações como princípios de neutralidade e como método de avaliação, pesquisa somente os aspectos negativos do intelecto, quando o que se deve colocar em relevo é a capacidade de aprender. Ou seja, a boa aprendizagem é aquela que está na frente de seu desenvolvimento: “[…] só o bom ensino é que precede o desenvolvimento” (Vygotsky, Aujourd´hui).
Segundo esse cientista, há ritmos diferentes de desenvolvimento e aprendizagem, porém, não são sintomas de déficits, mas sim da falta de estímulos, que ocorrem, principalmente, pela ausência de variedades de objetos portadores de texto, em particular livros, revistas, ausência de ações sociais de produção, da internet, além de virem de famílias com grande número de analfabetos, entre outras situações constrangedoras na sua formação de vida, que são fundamentais para uma alfabetização e raciocínio lógico consolidados.
As teorias de Piaget e de Vygotsky apresentam pontos divergentes, uma vez que o primeiro privilegia a maturação biológica, por aceitar que os fatores internos preponderam sobre os externos, seguindo uma sequência fixa e universal de estágios, elaborados espontaneamente pela criança. Nessa teoria, o nascimento do simbolismo só pode ocorrer após alcançar um determinado nível de habilidades mentais, como classificar, seriar e pensar com responsabilidade, não podendo ser trabalhadas só com o auxílio da linguagem.
Vygotsky salienta o contrário, pois a criança já nasce com funções psicológicas elementares e, dependendo do ambiente social, interação com adultos ou crianças mais experientes, adquire conhecimento do mundo inteiramente humanizado de objetos concretos, por meio da linguagem, em qualquer forma que ela se apresente, de maneira construtiva para desenvolver o ato de pensar.
Portanto, para Vygotsky, pensamento e linguagem são processos interdependentes desde o início da vida, pois a aquisição da linguagem pela criança modifica suas funções mentais superiores, dando forma definida ao pensamento, e possibilita o aparecimento da imaginação, o uso da memória, planejamento da ação, pela interação sociocultural.
Muitos estudiosos e cientistas, baseados nas teorias de Piaget e Vygotsky, criaram metodologias com instrumentos, práticas pedagógicas, para serem utilizadas pelos educadores, à construção do conhecimento de seus alunos de forma significativa e pensante.
Aqui, destacar-se-ão duas psicólogas argentinas, Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1984), que revolucionaram o processo de construção da escrita, com grande impacto à alfabetização, e Maria Montessori (1907), médica italiana e autora do Método Montessoriano.
Emília Ferreiro e Ana Teberosky, baseadas na teoria construtivista de Piaget, provaram que as crianças passam pelo mesmo processo da construção histórica da linguagem escrita pela humanidade: desenho, pré-silábico, silábico-alfabético e alfabético.
Durante esse processo, há uma lógica individual, resultado da abstração reflexiva de ações, como classificar, ordenar, estabelecer correspondência, interpretar, compreender, ou seja, um processo cognitivo, desenvolvendo a escrita, não vinculado à fala, fundamental à interação social na escola ou fora dela.
O Método Montessoriano reforça as posturas pedagógicas das psicólogas acima, pois compreende que as crianças são naturalmente curiosas e capazes de aprender de maneira independente, ao serem inseridas em ambientes adequados, por meio de materiais pedagógicos, que incluem aspectos cognitivos, sociais, emocionais e físicos, promovendo o desenvolvimento logístico, fundamentais à alfabetização e raciocínio lógico matemático consolidados.
Em 1986, a linguista Mary Kato, na perspectiva psicolinguística, cria o termo “letramento”, ou seja, habilidade de saber ler e escrever de acordo com o contexto das práticas sociais que envolvem a leitura e escrita, as quais são pautadas pela linguagem, que é produto cultural e social.
Essas estudiosas contribuíram, de maneira fundamental, para a alfabetização e/ou letramento, raciocínio lógico consolidados, para entender e escrever criativamente, contextos, informações variadas, bem como interpretá-los, com significado e em diferentes formatos, inclusive utilizar a IA de forma adequada e pensante.
A IA apareceu em 1950, criada por Alan Turing, o “Pai da Inteligência Artificial”, matemático e cientista britânico que começou a estudar a possibilidade de criar máquinas que pudessem “imitar” o pensamento humano.
Turing criou o Jogo da Imitação, que consistia numa interação verbal com três participantes: um era o juiz e os outros dois seres humanos, um homem e uma mulher que não se viam nem se ouviam, em salas isoladas, comunicando-se apenas por meio de textos datilografados. O objetivo era ludibriar o juiz.
Em seguida, Turing substitui um dos seres humanos por um computador, que mantinham uma conversa entre si. O juiz analisava o conteúdo e tentava distinguir qual era a máquina e qual era o ser humano, conforme as respostas recebidas. O resultado sugeria que a máquina poderia exibir comportamentos inteligentes, equivalentes aos do ser humano, nesta interação verbal.
Mesmo com desconfianças da comunidade científica, foi concebido um dispositivo chamado “Máquina de Turing”, modelo abstrato de um computador, enorme e lento, capaz de fazer somente cálculos simples.
Assim, se iniciou a era da Inteligência artificial (IA), o campo da ciência da computação, dedicado ao estudo e ao desenvolvimento de máquinas e programas computacionais capazes de reproduzir o comportamento humano na tomada de decisões e na realização de tarefas, desde as mais simples até as mais complexas.
É uma ferramenta tecnológica importante, pois trouxe avanços significativos para diferentes campos do conhecimento, tanto na teoria como na prática da informática, medicina, economia, transportes, comunicação social e cultural, entre muitas outras.
Seu funcionamento se dá por meio da coleta e da combinação de um grande volume de dados, seguido da identificação de determinados padrões, mediante a utilização de algoritmos pré-programados, o software que consegue tomar decisões, realizar tarefas de maneira autônoma, por meio de assistentes de voz, mecanismos de pesquisa, proporcionando inúmeros e importantes avanços, principalmente à ciência.
A IA garantiu maior eficácia na organização produtiva e facilitou a realização automatizada de uma série de tarefas dentro das empresas e no cotidiano, por meio da internet. É um auxiliar na rotina de milhões de usuários, adotada de maneira quase integral, por muitas pessoas por meio da utilização de dispositivos inteligentes em casa e no trabalho. Consequentemente, o século 21 está testemunhando um crescimento assombroso da IA e, em particular, das redes sociais com enormes benefícios, como a rapidez da comunicação, informações, programas, entre muitas outras situações de maneira ilimitada. O processo de inferência, supostamente humano, já está entre as máquinas, faz parte da vida cotidiana.
Nessa perspectiva nasceu a figura do agente de IA, que serve tanto para o desenvolvimento de programas do computador quanto para o operador do software, devendo respeitar a privacidade, a segurança à dignidade humana, com transparência, sem discriminação e estabelecer total responsabilidade no uso da linguagem adequada e lógica.
Entretanto, há muito debate a respeito dos limites éticos da IA e do papel que desempenham na sociedade atual, como assistentes de voz, reconhecimento facial, algoritmo de redes sociais, além de elevados custos de produção e implementação.
Há possibilidade de ocasionarem desemprego estrutural, além de treinar o algoritmo a repetir padrões e discursos danosos, antiéticos e falhas de controle que implicam ameaças àqueles que a controlam e fazem uso delas, além de riscos de segurança na coleta do armazenamento de dados pessoais, entre muitas outras situações.
Porém, não se pode deixar de mencionar que a IA exerce influência de forma significativa na educação, pois varia a maneira como os alunos aprendem a pensar para desenvolver habilidades, resolução de problemas, na busca do conhecimento, levando-os ao desenvolvimento no processo educacional.
A IA, com a internet, ajuda os professores na sua atuação como mediador, nos planos de aulas, correção de provas, após seu horário de aulas, além de obter bases profissionais e científicas atuais, tanto na avaliação, como na intervenção educativa de seus alunos, tanto na educação infantil, como no ensino fundamental, usando, por exemplo o Chatbot.
Chatbot são programas e aplicativos que simulam conversas humanas, levando os usuários interagir com eles, para consultas simples e/ou sofisticadas, responder a perguntas, fornecer informações, entre outros usos importantes.
Neles se podem desenvolver ações, programas, práticas pedagógicas, de vários estudiosos, psicólogos, médicos e educadores, entre muitos outros, que contribuíram, de forma fundamental, à aprendizagem das crianças e adolescentes, na alfabetização consolidada e no raciocínio lógico-matemático, descritas neste artigo.
Portanto, para utilizar IA, no caso a internet, é fundamental que qualquer indivíduo tenha alfabetização e/ou letramento, raciocínio lógico consolidados, que começa desde o nascimento, entendidos como sujeitos cognoscentes, histórico-sociais.
Entretanto, segundo o levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2021, cerca de 4,1 milhões de estudantes da rede pública não tinham acesso à internet, número que representa 12% dos alunos totais do País, sendo as regiões Norte e Nordeste as mais afetadas. O celular, aparelho mais utilizado para acesso aos recursos digitais, só estava disponível para 64,8% dos alunos da rede pública. A pesquisa mostrou ainda que a cada 20 alunos sem acesso à internet, 19 são de escolas públicas.
Portanto, há uma pobreza digital, originada pelas diferenças socioeconômicas no Brasil, que é um dos recursos ao processo da alfabetização consolidada e na capacidade lógica de pensar de forma crítica, que são propriedades cerebrais, exclusivas do ser humano, usadas virtualmente.
Outro problema grave que esta falta de alfabetização e/ou letramento e ausência do raciocínio lógico consolidados causam é o analfabetismo funcional.
As estatísticas do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) de 2020 indicam que cerca de 29% dos brasileiros entre 15 e 64 anos são considerados analfabetos funcionais, ou seja, embora saibam ler e escrever em um nível básico, têm dificuldades em compreender e interpretar textos mais complexos. Isso quer dizer que não entendem o que leem e não conseguem, por meio da escrita ou oral, passar em seus discursos, ideias, pensamentos de forma clara, objetiva, significativa e crítica.
Sete em cada dez que cursaram apenas os anos iniciais do ensino fundamental, 21% chegam apenas ao nível elementar, permanecendo na condição de analfabeto funcional, além de ter grande dificuldades em realizar operações matemáticas simples.
Esse alto índice de analfabetismo funcional, especialmente em países em desenvolvimento como o Brasil, é um dos grandes desafios para a adaptação à nova realidade do trabalho impulsionada pela IA, pois é necessário compreender um conjunto de habilidades para entender seu significado de maneira crítica, eficaz no seu dia a dia, no trabalho, na tomada de decisões, aproveitando os benefícios e oportunidades oferecidos por ela.
Portanto, saber escrever e entender o que lê de forma lógica, seu pensamento na prática social, é fundamental para utilizar IA.
É importante lembrar que evolução da IA não deixa de ser artificial, pois linguisticamente significa “inteligência que surge de um dispositivo artificial, produzido pela mão do homem”, ou seja, é a capacidade de criar soluções tecnológicas para simular a inteligência humana, realizando determinadas atividades de maneira autônoma graças ao processamento de um grande volume de dados que recebem de seus usuários, seres cognoscente, históricos e sociais, presentes em todos os momentos da vida.
Portanto, é um campo de estudo multidisciplinar que abrange várias áreas do conhecimento de modo quase autônomo e não termina ao finalizar a escola primária, fundamental, universitária, pós-graduações e especializações, pois cientistas famosos usam a tecnologia da IA, em prol de descobertas científicas em todas as áreas fundamentais do conhecimento humano.
Não se pode esquecer, entretanto, que o conhecimento começa ao nascer, portanto a formação profissional de professores de educação infantil, fundamental, licenciaturas e especializações não elimina a necessidade de obtê-las, de forma presencial, além de fazer estágios supervisionados nas escolas, nas salas de aulas de 300 horas, exigidas por lei, que infelizmente, não estão sendo realizados. Essa ausência de estágios compromete a compreensão das diferentes realidades sociais, culturais, existentes dentro da escola e da sala de aula, pois impossibilita a observação e conhecimento das diversidades, realidades e necessidades educacionais dos estudantes.
O professor é o mediador que cria instrumentos para desenvolver o processo ativo e mental dos alunos, para resolver problemas, elaborar hipóteses, questionar e ser encorajado a conduzir suas próprias pesquisas, se tornando criativo, autônomo na resolução de problemas e manuseio de tecnologias digitais.
Entretanto, nas escolas públicas, em sua maioria, apesar de todas as teorias e práticas e ações pedagógicas descritas anteriormente sobre aprendizagem, grande parte dos professores não as conhecem ou não as praticam, ou seja, não ocupam seu principal papel de mediador na busca do conhecimento de seus educandos. Apresentam uma posição vertical, pois não conhecem a realidade e necessidades de seus alunos, e as famílias também não participam, ocasionando indisciplinas, desinteresse, fracassos escolares e evasão.
Nesse aspecto a internet, que proporciona os cursos a distância na formação dos educadores, está sendo nociva, pois os impossibilita conhecer a verdadeira realidade de seus futuros alunos, além de não poder discutir de forma presencial, entre seus pares e o supervisor de estágio, as dúvidas, as questões observadas na escola e na sala de aula.
Logo, o investimento na educação básica e fundamental exige políticas públicas urgentes, cabendo à escola, família, sociedade e governos, o importante papel de transformar os espaços e contextos escolares em ambientes, onde os estudantes tenham a possibilidade de pensar para desenvolver o seu conhecimento de forma crítica, utilizando IA.
A frase do filósofo e físico René Descartes (1595-1650), “Penso, logo existo”, deve ser uma constante no ato de mediação dos pais e educadores à construção de qualquer conhecimento dos estudantes, principalmente na faixa etária de zero aos 12 anos.
É importante lembrar que a natureza criou o homem com cérebro com capacidade cognitiva descrita por Piaget, em um processo histórico-social defendida por Vygotsky, que jamais poderá ser substituído pela IA.
IA é um conjunto de tecnologias que permite aos computadores executar funções avançadas, inovadoras e eficazes, que os seres humanos não conseguem, porém não pensa por si só, pois pode tomar decisões incorretas, como, por exemplo, desenvolver armas que atingem qualquer alvo, pois não tem capacidade mental de discernir, além daquela para a qual foi programada.
O ato de pensar é humano e começa desde o nascimento, com raciocínio lógico-matemático, alfabetização e/ou letramento consolidados, para alcançar seu pleno potencial, ou seja, pensamento crítico, lógico, social, criando um ambiente de aprendizagem inclusiva, responsável na busca do conhecimento num mundo cada vez mais digital.
(*) Sahda Marta Ide é professora aposentada da Faculdade de Educação (FE) da USP (Universidade de São Paulo).
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