Inteligência artificial não é a vilã das eleições
O debate na imprensa sobre as eleições municipais deste ano elegeu sua nova vilã: a inteligência artificial.
Há alarme sobre o uso de IAs generativas para manipulação fraudulenta de áudios e vídeos de candidatos e sobre o direcionamento de conteúdo para persuadir eleitores.
Tal alarme levou o Tribunal Superior Eleitoral a propor nova resolução com regras sobre uso de IA por candidatos e partidos políticos.
Mas a IA seria realmente vilã? As ameaças levantadas residem na disponibilização e acesso a conteúdo abusivo nas mídias digitais. Portanto, em primeira linha, o problema está no comportamento malicioso dos candidatos e, em segunda, na eficácia da moderação de conteúdos pelas plataformas.
É importante não confundir a regulação da IA com regulação de partidos ou de plataformas digitais.
É verdade que deepfakes gerados por IA potencializam a desinformação, particularmente com conteúdos escandalosos próximos ao dia da votação. Mas o vilão é o manipulador humano, não a máquina.
Por outro lado, a IA pode ser usada por eleitores para obter, resumir e simplificar programas eleitorais ou informações sobre candidatos. E por candidatos para construir o discurso de campanha em múltiplas variações e gerar áudios e vídeos legítimos, com redução de custos em relação à produção humana, favorecendo-se aqueles com menos recursos.
Assim, a IA pode contribuir com o engajamento de eleitores e trazer mais equilíbrio ao campo de disputa, fortalecendo o processo democrático.
Além disso, sem auxílio da inteligência artificial para personalizar conteúdos, os eleitores ficariam perdidos em um mar de informações irrelevantes para suas escolhas eleitorais, e a moderação de conteúdo pelas plataformas, inclusive para a integridade do processo democrático, seria impossível.
Assim, em vez de restringir, o melhor caminho é trazer mecanismos de transparência sobre o uso de IA pelos candidatos em suas comunicações, como a introdução de marcadores digitais. Mas, para um ambiente eleitoral saudável, é fundamental que a imprensa evite o sensacionalismo ou abordagens enviesadas que venham a identificar a tecnologia como fraude.
Certamente muitos áudios e vídeos produzidos com IA, desde ajustes como filtros estéticos, cenários de fundo, obter fluidez da fala ou visual empático, até a produção de vídeos e áudios sintéticos com diferentes conteúdos, serão legítimos.
(*) Juliano Maranhão é professor da Faculdade de Direito da USP e diretor do Instituto Legal Grounds.