Juíza concede liberdade a médico procurado por crime sexual
Salvador Walter Lopes de Arruda ganhou cartaz de procurado em abril deste ano, mas estava foragido desde 2020
Denunciado por pacientes em casos de importunação sexual e erro médico, ginecologista e ex-diretor do Hospital Regional, Salvador Walter Lopes de Arruda teve a liberdade provisória concedida pelo juíza May Melke Amaral Penteado Siravegna, da 4ª Vara Criminal de Campo Grande. A decisão é em relação à acusação de outubro de 2016, pelo crime contra a dignidade sexual.
Na decisão do dia 26 de maio deste ano, a magistrada cita o comparecimento espontâneo do réu, informação do endereço onde pode ser encontrado e o compromisso de participar dos atos processuais, por isso, “não subsistem os motivos para manutenção do decreto de prisão preventiva”.
A juíza determinou então que o alvará de soltura de Salvador seja expedido e que o médico apresente defesa prévia nos autos em dez dias, além de manter o endereço atualizado. Segundo os autos, atualmente, o ginecologista está residindo no Bairro Campo Belo, em São Paulo, onde faz tratamento de saúde.
Procurado – Em abril deste ano, a Polícia Civil, através da Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher), divulgou cartaz de procurado com a foto de Salvador. Na ocasião, o ginecologista estava com mandado de prisão em aberto desde 2020 e respondia a pelo menos quatro processos na esfera criminal, todos em segredo de Justiça.
Em março deste ano, o médico seria julgado pelo crime de importunação sexual. Entretanto, devido aos casos estarem sob sigilo, não é possível apurar como se deu a condenação. No mesmo mês, o CRM-MS (Conselho Regional de Medicina do Estado de Mato Grosso do Sul) e o Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo), cidades onde o médico possuía inscrições ativas, aplicaram penalidade de censura pública ao ginecologista. A decisão foi divulgada no Diário Oficial da União.
Importunação sexual - Arruda é considerado foragido da Justiça desde 26 outubro de 2020, conforme mandado expedido pela 4ª Vara Criminal de Campo Grande no processo por importunação sexual. Nesta ação, protocolada na Justiça em 2021, foi denunciado por paciente e colegas de trabalho por abusos em clínica e hospital que atendia na Capital. O mandado de prisão é válido até outubro de 2034.
Antes disso, o ginecologista já era alvo de outras denúncias de pacientes que reclamaram sobre o atendimento prestado e erros cometidos durante cirurgia, como o esquecimento de compressa de algodão no mesocólon (expansão do peritônio).
Na lista de processos pesquisadas pelo Campo Grande News, consta um em que o médico foi absolvido pois não havia testemunhas que comprovassem a versão da paciente. No dia 20 de maio de 2015, a mulher, então, com 30 anos, foi até a Clínica Hospitalar Santa Rita de Cássia, no Jardim Monumento, para ser atendida por conta de alterações no ciclo menstrual e incômodos na região pélvica.
A mulher foi com o marido, mas entrou sozinha no consultório. Após o exame, diz ter se surpreendido com as perguntas do médico. “Como você gosta de tr***?”. Ao questionar o motivo da pergunta, respondeu: “Para descontrair”. Na saída, diz ter sido abraçada por ele, que ainda segurou seu rosto com as duas mãos e a beijou na boca.
No processo, Arruda negou autoria, dizendo que houve desentendimento; ela queria ser operada e ele se negou a fazer o procedimento. A paciente teria falado que iria ‘ferrar com a vida dele’. O juiz da 5ª Vara Criminal, Waldir Peixoto Barbosa, seguiu o princípio do in dubio pro reo (na dúvida, a favor do réu). O médico foi absolvido em maio de 2020.
Logo após a absolvição, o médico foi denunciado por outra paciente, com relato muito semelhante ao caso anterior, a professora, então com 28 anos, foi até a Associação Santa Rita de Cássia para ser atendida em agosto de 2020. Na ocasião, Salvador teria dito palavras de baixo calão, beijou a paciente e pediu para que ela esperasse o fim do expediente que ele lhe daria carona.
O processo foi aberto em 2021, na 1ª Vara Criminal de Campo Grande. A professora reuniu depoimentos de testemunhas, entre elas, de ginecologista que relatou assédio semelhante, uma forma de mostrar que o comportamento é recorrente. Salvador se manteve em silêncio na ação e responde por infração ao artigo 215 do Código Penal (importunação sexual). O último andamento é de outubro de 2022, em que o médico foi intimado a apresentar defesa.
Erro médico - Além dos relatos de importunação sexual, Salvador Arruda já foi denunciado em processos por erro médico. Auxiliar de serviços gerais, entrou com ação em fevereiro de 2020, por conta de atendimento ocorrido no dia 16 de agosto de 2015, na Santa Casa de Campo Grande. Descreveu parto demorado e doloroso, que durou quase 17 horas, em atendimento que começou com o acusado terminou com outra médica.
Como ainda sentia dor, após 15 dias da cirurgia, fez exames e descobriu que havia massa no abdômen. Uma semana depois, ainda com dores, diz ter pedido a Arruda por atendimento. “É só uma massa, toma vergonha na cara e vai para academia!”.
Somente após outro exame descobriu, conforme denúncia, que se tratava de resto de placenta. Neste processo, o juiz da 2ª Vara de Fazenda, Ricardo Galbiati, manteve como réu a Santa Casa e a Prefeitura de Campo Grande. O magistrado também diz que o crime de reparação de danos prescreveu, mas manteve perícia para aclarar “pontos controvertidos” nos procedimentos. Os médicos foram retirados do polo ativo, mas a conduta culposa ou dolosa poderá ser reavaliada no decorrer da ação.
Parto doloroso e traumático também foi relatado em ação que corre na 3ª Vara Cível Residual. Neste caso, o atendimento foi na Maternidade Cândido Mariano, envolvendo Arruda e outra médica. A cirurgia aconteceu no dia 4 de fevereiro de 2019. A mulher, então com 21 anos, reclama da demora do procedimento, doloroso, e da conduta de Arruda. Novamente, os médicos foram retirados do polo ativo, mas a conduta e responsabilidade ainda podem ser reavaliadas.
Em junho de 2016, outro processo por erro médico. A paciente, hoje com 49 anos, passou por histerectomia (remoção cirúrgica do útero). Após o procedimento, a mulher passou 11 dias internada, ficou 16 dias com sonda e passou a presentar infecções e incontinência urinária. O processo ainda tramita na 10ª Vara Cível, agora, pendente de perícia documental.
No mesmo ano, novamente Arruda foi denunciado por conduta durante parto, realizado no dia 16 de outubro de 2013. A denunciante tinha 28 anos quando foi à Santa Casa para o parto da filha. Seis meses depois da cirurgia feita pelo ginecologista, passou a sentir dores. Demorou 18 meses até conseguir pelo SUS cirurgia ginecológica exploratória, o que aconteceu em 2015. Foi descoberto “material heterólogo compatível com compressa cirúrgica de algodão” no mesocólon (expansão do peritônio).
Arruda chegou a ser mantido como corréu na ação, conforme andamento na 2ª Vara de Fazenda Pública, mas foi retirado do polo ativo. Santa Casa e Município de Campo Grande foram sentenciados a pagar R$ 36,322 mil por danos morais e estéticos.