Justiça obriga que médicos de postos de Campo Grande emitam receita impressa
Defensoria Pública invocou lei estadual de 2008 para que médicos não façam receita à mão
Os médicos que atendem nas unidades de saúde pública de Campo Grande serão obrigados a fornecer receitas e pedidos de exames digitados e impressos pelo profissional ou, em caso de atendimento emergencial, que seja feito em letra de forma. A determinação faz parte de decisão judicial contra o Município, em ação protocolada pela Defensoria Pública, para que se cumpra lei estadual de 2008.
A decisão é do juiz da 1ªVara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, Ariovaldo Nantes Corrêa, dada em 27 de outubro. Ontem (13), o município de Campo Grande foi oficiado eletronicamente da determinação.
Pela decisão, o Município ainda tem que suprir as unidades de saúde com computadores, impressoras, tinta e papel sulfite para cumprir a obrigação. A determinação de Nantes é válida somente para a rede pública, não se estendendo aos hospitais e outras instituições particulares que prestem serviço público, em contrato via SUS (Sistema Único de Saúde).
A decisão atende ação de obrigação de fazer protocolada pela Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul em abril de 2014. Na justificativa, o defensor Amarildo Cabral alegou que o sistema de saúde encaminha pedidos de exames e de remédios ou relatórios médicos feitos à mão, muitas vezes, ilegíveis. O sistema também dificulta até o trâmite judicial, caso alguém precise entrar com ação em busca do medicamento ou procedimento.
Amarildo Cabral cita que a Lei Estadual nº 3.629/2008 dispõe sobre a expedição de receitas médicas e odontológicas no computador, mas que a legislação ainda não havia sido regulamentada, o que afasta a efetividade.
Na ação inicial, constavam como parte, além do município de Campo Grande, o Estado de MS, a Santa Casa e o CRM (Conselho Regional de Medicina).
No decorrer do processo, a Santa Casa foi excluída da ação, ao comprovar que emite as receitas e laudos em papel impresso; o CRM e o Estado também tiveram o feito extinto, por conta da incompetência da Justiça Estadual e sob justificativa que a via eleita é inadequada para impor obrigação de regulamentação da lei, respectivamente.
Porém, em relação ao Município, a ação foi mantida. A prefeitura apresentou defesa, argumentando que a Lei Estadual 3.629/2008 é inconstitucional por se tratar de violação de competência. Também alegou que não existe previsão orçamentária para as despesas referentes à estruturação dos hospitais públicos, unidades e centros de saúde. A legislação ainda viola o princípio da livre iniciativa ao dispor sobre cancelamento de alvará de licenciamento do estabelecimento com punição dos gestores pela não obediência da norma.
No decorrer do processo, o então titular da Sesau (Secretaria Municipal de Saúde), José Mauro Filho, admitiu que nem todas as unidades são equipadas o suficiente. Também disse que a orientação dada aos médicos e que escrevem em letra de forma, no entanto, "há situações que o médico se abstém dessa orientação".
Na decisão, o juiz Ariovaldo Nantes rebateu as justificativas. Diz que o artigo 196 da Constituição Federal dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado, mediante “políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".
Segundo o magistrado, mesmo que a lei estadual não tenha sido regulamentada, o teor já apresenta os aspectos essenciais, sendo suficiente, por si só, a produzir os efeitos. “(...) de modo que a simples previsão de possibilidade de regulamentação não é, por si só, suficiente para afastar tal situação a ponto de torná-la uma lei de eficácia limitada, razão pela qual deveria estar sendo cumprida dentro do território do Estado de Mato Grosso do Sul desde a sua publicação no dia 28.12.2008”.
Por fim, segundo o juiz, a continuidade de emissão de receitas e pedidos de exames médicos de forma ilegível não viola apenas a lei, mas compromete atuação de outros profissionais da saúde. “(...) ofende, em última análise, o próprio direito à vida, pois pode culminar na dispensação incorreta de medicamentos ou realização inadequada de exames ou tratamento, comprometendo o quadro clínico dos pacientes, o que não se pode admitir”.
Sendo decisão de primeira instância, ainda cabe recurso. Em nota, a Sesau informou que as unidades estão sendo estruturadas e o município estuda uma forma de implementar sistema que seja possível expedir as receitas de maneira digital. Hoje o serviço conta com o sistema do Ministério da Saúde, o E-SUS, que faz o preenchimento automático da receita e o médico realiza somente a assinatura, mas ainda não é possível disponibilizar esse documento de forma digital.
Segundo a secretaria, o município tem investido de maneira significativa na reestruturação do parque tecnológico na área da saúde para atender as necessidades dos serviços. Neste ano, pelo menos 2,4 mil computadores foram adquiridos e estão sendo distribuídos, assim com impressoras.
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#matéria atualizada para acréscimo do retorno da Sesau.