Limite de construção em terrenos abre polêmica com cifra astronômica
MP quer limite básico em toda área urbana, Planurb defende modelo escalonado e sindicato alerta que prefeitura será maior imobiliária da cidade
O limite de construção por terreno em Campo Grande abre polêmica com cifras astronômicas no plano diretor, que define o planejamento do futuro da cidade. O protagonista do impasse é o coeficiente de aproveitamento, número que, multiplicado pela área do lote, indica a quantidade máxima de metros quadrados que podem ser construídos.
Na prática, regiões que tem o coeficiente 6, o maior da cidade, pode cair para um. Neste cenário entra, por exemplo, o entorno do shopping Campo Grande, rota das torres de apartamentos.
O MP/MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) defende a aplicação do coeficiente 1 (único) em toda a área urbana. De forma resumida, em um terreno de mil metros quadrados se aplicado o coeficiente 1 pode-se construir mil metros. Acima disso, os chamados lotes virtuais deverão ser comprados da prefeitura.
De acordo com a promotora Andréia Cristina Peres da Silva, a proposta tem amparo do Ministério das Cidade, urbanistas especialistas no tema e na legislação. “O Ministério Público defende essa proposta para maior justiça social em Campo Grande. Não é justo um bairro antigo, como o Jardim Noroeste, que tem mais de 30 anos, não ter infraestrutura. Mal tem asfalto. Ou é pé na lama ou o pó quando não chove”, afirma.
Segundo a promotora, o município alega não ter dinheiro, situação que poderia ser resolvida com a venda dos lotes virtuais. “O Estatuto das Cidades prevê esse instrumento legal, que é muito importante. Traz justiça no trato da propriedade imobiliária. Justiça urbana”, afirma a promotora. Segundo ela, o Ministério Público olha para a cidade com os olhos da sociedade e não do mercado imobiliário.
Utilizando o mesmo artigo 28 do Ministério das Cidades, a Planurb (Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano) defende coeficiente diferenciado conforme a área urbana e traça um futuro sombrio caso seja adotada a proposta do MP/MS, que sugere o coeficiente básico único.
“O estudo que nós temos mostra que o coeficiente básico 1 para toda a área urbana é antieconômico. Se for aplicado, o prejuízo é de R$ 22 bilhões na infraestrutura urbana. Traria um maior adensamento nas áreas periféricas, que têm infraestrutura urbana e social insuficiente. Mas se coloco as pessoas onde tem asfalto, luz, coleta de lixo, transporte coletivo vou promover justiça sócia e maior efetividade na ocupação dos vazios urbanos”, afirma a diretora-presidente da Planurb, Berenice Maria Jacob Domingues.
Segundo ela, o coeficiente diferenciado permite arrecadar mais IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), ISS (Imposto sobre Serviços) e ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis), além de promover a compactação dos bairros e menor desmatamento por hectare.
As zonas da cidade – A divisão atual de 13 zonas, com limite de coeficiente de aproveitamento 6, passaria, pela proposta da Planurb, para cinco zonas urbanas, com coeficiente que varia de 1 a 5. “O coeficiente de aproveitamento é o número de vezes que você pode construir dependendo da área do terreno. Se tem mil metros e o coeficiente é 4, você pode construir quatro mil metros”, afirma a diretora adjunta da Planurb, Vera Bacchi, que é arquiteta e urbanista.
Neste modelo de zoneamento, a zona 1, região do entorno do shopping Campo Grande e Centro, fica com coeficiente 5, com possibilidade de comprar mais um lote virtual. Na zona 2, o coeficiente é 4, com possibilidade de comprar mais dois. Nesta região entram bairros como Cabreúva, Monte Líbano e Planalto.
Na zona 3, o coeficiente é dois, com possibilidade de comprar mais dois. A área inclui Aero Rancho, Chácara Cachoeira e Tiradentes. Na zona 4 - que tem bairros como Coronel Antonino, Maria Aparecida Pedrossian e Nova Lima, o coeficiente é 2, com a possibilidade de comprar mais um.
Na zona 5, o coeficiente é 1 e sem possibilidade de compra. A lista de bairros tem Caiobá, Chácara dos Poderes, Lajeado, Los Angeles, Mata do Segredo, Nova Campo Grande, Núcleo Industrial, São Conrado e Tarumã. “São áreas mais frágeis, mais periféricas e não tem quase nada de infraestrutura”, diz Vera.
A compra dos lotes virtuais, que permite construir mais do que o coeficiente da região, leva o nome de outorga onerosa do direito de construir e é calculada a partir do valor de avaliação do terreno. Conforme o Estatuto das Cidades, os recursos serão aplicados em regularização fundiária, projetos habitacionais de interesses sociais e criação de espaços públicos de lazer e de unidades de conservação.
Imobiliária ou prefeitura? - “A cidade inteira só vai poder construir o terreno físico e todos terrenos virtuais são transferidos para os municípios. Para construir mais de um terreno, vai ter que comprar do município. Vai desaquecer o setor imobiliário da cidade, fica mais caro para construir. A prefeitura vai ser a maior imobiliária da cidade, com 1 milhão e 30 mil lotes”, afirma o presidente do Secovi (Sindicato da Habitação), Marcos Augusto Netto, também contrário à proposta do Ministério Público.
Segundo ele, a proposta da Planurb permite que 90% dos 383.143 imóveis cadastrados na prefeitura possam ter construção de duas vezes o tamanho do terreno. “Desses 383 mil, 344.828 vão pode construir um terreno físico e um virtual. A população tem que saber que vai ser prejudicada”.
Marcos Augusto afirma que Campo Grande pode ser o quarta cidade do Brasil a adotar coeficiente 1 em toda área urbana, num universo de 5.570 municípios. O plano diretor está na Câmara Municipal.