Preso em condomínio de luxo, “patrão” é condenado a 6 anos na Máfia do Cigarro
Grupo atuava por temporadas, trocou celulares "bombinhas" por smartphone e cooptava policiais
Preso em condomínio de luxo em São Paulo, Carlos Alexandre Goveia, 42 anos, “patrão da Máfia do Cigarro”, foi condenado a seis anos de prisão por organização criminosa. O grupo atuava por temporadas, com cooptação de policias. A estratégia para escoar as mercadorias ainda contava com placas dos caminhões ocultas por pano preto e substituição dos celulares “bombinhas” (que faz chamada sem ser identificado) por smartphones.
A sentença da Justiça Federal de Naviraí é relativa à operação Teçá, mas Carlos, conhecido como Kandu, já foi alvo da Nepsis e da “Marco 334”, ações de repressão ao contrabando de cigarro oriunda do Paraguai. Agora, a Justiça decretou nova prisão.
“Diante da evidente vontade deliberada de furtar-se à Justiça Criminal e considerando o poder aquisitivo do réu que restou demonstrado quando de sua prisão (aquisição de identidade falsa, veículo de alto valor de mercado, mansão em região nobre), a prisão cautelar se faz ainda mais necessária para assegurar a aplicação da lei penal”.
Carlos Alexandre estava foragido até novembro do ano passado. Ele foi preso pela PF (Polícia Federal) em condomínio de luxo na cidade de Paulínia (SP). A sentença destaca sua posição hierárquica de dono da carga ilegal.
“Trata-se de integrante de organização criminosa que atuou em função hierárquica elevada, isto é, tratava-se de um dos líderes do grupo criminoso denominado ‘Máfia do Cigarro’, cuja atuação rendeu a internalização ilegal de milhões de maços de cigarros em território brasileiro”.
De acordo com a denúncia do MPF (Ministério Público Federal), a PF identificou a estruturação de uma nova organização criminosa após a operação Nepsis, deflagrada em 22 de setembro de 2018. O grupo definiu as rotas e atuava por temporadas.
“Ou seja, alternando períodos de intensa atividade com períodos sem nenhuma movimentação. Cada temporada de atividade durava em média 20 a 30 dias”.
Os caminhões ingressavam no território brasileiro com as placas cobertas por um tecido de cor preta, retirado somente quando o veículo passava por Juti, a 311 km de Campo Grande. O controle da frota era feito por meio de grupos de WhatsApp.
O acerto com os policiais tinha um “prazo de validade”, correspondente ao período previsto para a próxima temporada. Durante este tempo, os policiais que aceitassem a vantagem indevida eram informados de uma “palavra-chave”, que deveria ser dita pelo motorista caso algum caminhão da organização criminosa fosse abordado.
Uma rede de olheiros ainda monitorava viaturas e veículos particulares de agentes nas imediações da Polícia Federal de Naviraí.
A carga ilegal viajava por Iguatemi, Caarapó, Dourados, Rio Brilhante, Nova Alvorada do Sul, Campo Grande, Jaraguari, Bandeirantes, São Gabriel do Oeste e Chapadão do Sul.
Protocolada em fevereiro de 2020, a denúncia do MPF era contra oito pessoas, mas foi desmembrada, resultando na condenação neste mês de Carlos Alexandre e Hemerson Lopes da Costa, 36 anos. A acusação elencou 13 flagrantes de apreensões de cigarros.
Segundo o documento, Hemerson ficava no Paraguai e comunicava os horários para entrada dos caminhões em Mato Grosso do Sul, fazia acerto com os policiais cooptados, além de realizar pagamentos dos integrantes da organização e cobranças em nome do grupo. Ele foi condenado a seis anos, com regime inicial semiaberto. Hemerson é monitorado por tornozeleira eletrônica. A sentença do juiz federal Rodrigo Vaslin Diniz foi publicada ontem.
Defesa – De acordo com o advogado Joan Carlos Xavier Biserra, a defesa vai entrar com pedido de habeas corpus contra o novo mandado de prisão de Carlos Alexandre Goveia. A última medida é para que ele recorra em liberdade. “Já está próximo da progressão de regime na Nepsis”, afirma Joan Carlos.
Carlos Alexandre está preso no Centro de Detenção Provisória de Hortolândia (SP). “Conseguimos evitar a transferência para o Sistema Penitenciário Federal porque eram fatos de 2016, 2017. Tanto o juiz de Ponta Porã quanto o de Naviraí entenderam por deixá-lo no sistema estadual, a mais de mil quilômetros da fronteira”.
A defesa refuta a posição de liderança de Carlos Alexandre, aponta que as imputações são genéricas e que outros indicados como “patrões” em outras operações foram absolvidos no TRF 3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região). O advogado, que também representa Hemerson, vai recorrer da sentença, sob alegação de pontos controversos.