A união faz a Bolsa ou transforma pântano em riqueza
Essa é uma história pouco conhecida: a Bolsa de Valores foi criada em um pântano. Pântano e Pantanal são sinônimos, não nos esqueçamos. Há mil anos, a Holanda era um pântano. Um quinto do atual território holandês ficava embaixo da água. O resto sofria com enchentes, ano sim e no outro também. No que dependesse da natureza, não era para ninguém morar nesse lugar. Fora meia dúzia de pescadores, ninguém morava mesmo.
Aqui não aceitamos feudalismo.
Essa foi a sorte grande do lugar que viria a ser chamado Holanda (agora, Países Baixos). O feudalismo não fincou raízes por lá. Enquanto no resto da Europa os agricultores viviam em um sistema de semiescravidão, trabalhando para poucos e gordos latifundiários, também conhecidos como nobres, na encharcada Holanda, muitos eram donos do próprio nariz. Plantavam, pescavam, vendiam e compravam por conta própria. Mas aquela região não era uma comunidade hippie medieval. Mas o modelo de trabalhar em troca de casa e comida não pegou. Boa parte do trabalho, afinal, era tirar a Holanda debaixo da água, para plantar e criar vaca. Só conseguiam com muito trabalho coletivo. Os holandeses aprenderam a se unir. Construíram represas, milhares de canais para drenar as águas e moinhos para drená-las. Sempre juntos, sempre coletivamente.
A circulação de moedas bombava.
Em vez de trabalho em troca de casa e comida, os holandeses pagavam salários. O grande efeito do salário foi construir um comércio pujante. No resto da Europa a moeda era particularidade dos gordos e inúteis nobres. Pobre não sentia nem o cheiro de uma moedinha. Quando o renascimento começou a dar as caras na Europa, a Holanda já tinha largado na frente.
Sai pra lá nobre inútil.
A Holanda da coletividade virou república em 1.581. A primeira na Europa depois da queda de Roma. Mil anos depois. Amsterdam controlava um comércio maior que a somatória da França e Inglaterra. Com esse clima, os estudos eram fundamentais para um povo tão unido. E foi um livro que levou a Holanda ao passo seguinte. "Relatos de uma viagem pelas navegações dos portugueses no Oriente" veio a público em 1.596. Mal a obra tinha saído, criaram seis empresas para explorar as especiarias asiáticas. Eram as "Companhias das Índias Holandesas".
E surge a Bolsa de Valores.
Cada navio que partia, inicialmente, poderia ou não voltar cheio de especiarias. O investidor jogava um "tudo ou nada", ficava milionário ou falia. O governo republicano holandeses olhou sua história e propôs: ao invés de poucos investidores nas viagens à Ásia das especiarias, todo nos Andes poderia colocar algum dinheirinho nessa possibilidade de lucro. Diminuía substancialmente o risco da empreitada. Ideia exótica para uma Europa que mal tinha saído da Idade Media, mas natural para um país que surgiu do esforço coletivo. A população virava sócia das viagens. Vendiam milhares de papéis no mercado. Em qual mercado? Construíram um mercado em Amsterdam e deram o nome de "bourse" (bolsa). Um país jamais será rico dividido. Só o esforço coletivo doma um Pantanal, leva à riqueza. O Brasil comemora efusivamente sua desunião.