Aquelas mulheres valentes de Dourados. Um noivado trágico
Ele e ela viviam lá pelas bandas de Dourados, o florescente distrito que possuía as mais ricas terras da fronteira. Por lá, as mulheres são valentes. Vivendo em um ambiente de lutas, se defendiam - ou agrediam - pondo de lado a proteção masculina. Diversos casos confirmam. Uma, por questão de uma herança, prostou morto o tio, que exercia o cargo de subdelegado, homem de bravura muitas vezes confirmada. Outra, vendo seu lar invadido por dois indivíduos que sem mais nem menos queriam tomar-lhe a propriedade, feriu ambos a balaço. Em um deles, acertou três tiros, todos na boca. Apresentou-se à prisão, defendeu-se com rara energia, provou ter agido em legítima defesa e foi liberada.
Foram casar em P.Porã.
Mas voltemos aos noivos. Na véspera do casório, que se realizaria em P.Porã, embarcaram em caminhões, acompanhados pelos pais, padrinhos e alguns convidados. Era uma sexta-feira. No sábado, perante o juiz de direito, foram oficialmente declarados marido e mulher. Depois dos abraços costumeiros e das lágrimas treparam todos nós caminhões e empreenderam o regresso.
Um radiador e muitas mortes.
Após algumas dezenas de quilômetros, o veículo que conduzia os noivos parou. O radiador estava seco. Tão seco quanto os festeiros. Ninguém recusou a primeira rodada de vinho. Difícil era encontrar um caminhão que não tinha defeito no radiador. Era, também, um nunca acabar de rodadas de bebida para as pessoas. A comitiva imitava o radiador. Bebendo a cada vez que o caminhão era detido. Pela altura do rio Dourados, a embriaguez e os ânimos estavam altos. Antes da ponte, tornaram-se violentos. O chofer matou o noivo. Um padrinho matou o chofer. Ninguém sabe quantos mortos ficaram estendidos no chão.
A viúva virgem valente.
Três "V". Esse o apelido da noiva. Viúva, Virgem e Valente. Assim, por um golpe brutal e inesperado, aquela noiva gentil e tão confiada no futuro, transformou-se em uma mulher tristonha, sem um sorriso nos lábios pálidos. A alma eternamente velada pela viuvez. Viúva, mas viva. Sua valentia, digna das mulheres de Dourados, a livrou das balas alucinadas de uma viagem que fez o percurso da alegria à tristeza. Todo habitante de Dourados a conhece. Ou pelo menos a conhecia.