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Em Pauta

Teus melhores inimigos o saúdam

Mário Sérgio Lorenzetto | 29/05/2017 07:11
Teus melhores inimigos o saúdam
Teus melhores inimigos o saúdam

Saudações de amigos, saudações de fãs são pequenas. Saudações dos inimigos são monumentais. Raros homens, através da história, foram reverenciados pelos adversários. Francesco Totti, 41 anos, 10 parafusos e uma placa de aço nas pernas, jogador lendário da Roma é a última expressão de futebol que se extingue a partir de hoje.

No Estádio Olímpico todos os ingressos foram vendidos em poucos minutos desde que foi divulgado que no domingo seria sua ultima apresentação. Muitos "tifosi" de pé. Todos chorando copiosamente. A emoção do estádio transbordou pelo mundo. Há tanto tempo debutou "il Capitano" que nem sequer a metade dos jogadores do campeonato italiano haviam nascido.

Nenhum grande jogador do mundo ganhou tão pouco dinheiro e campeonatos como Totti. Em 25 anos, defendendo exclusivamente a Roma, ganhou um único campeonato Italiano, duas Copas da Itália, duas Supercopas da Itália e um Mundial. Quiseram Totti no Real Madri e no Milan, onde poderia ter ganho inúmeros títulos e cobrir de ouro sua família. Mas seu amor pela Roma - e pela cidade de Roma - o converteram em um desses raríssimos homens que são "Hommo", homens raros. A lenda de Totti acaba. O rei de Roma aposentou.

Saiu da Lazio, time também de Roma, arquirrival da Roma, a maior reverencia: "Os inimigos de toda vida despedem-se de Totti". "Você conquistou nosso respeito. Um apertão de mãos a um adversário que, depois de tantos anos, deixa o terreno de jogo. De parte de teus melhores inimigos". Um torcedor da Juventus de um longínquo rincão brasileiro também saúde o grande jogador e homem exemplar. Pobres meninos milionários do futebol, jamais serão um Totti.

Teus melhores inimigos o saúdam
Teus melhores inimigos o saúdam

O único professor de matemática do mundo que chegou a ser tão famoso quanto um jogador de futebol

Nos anos 70 e 80 do século passado a matemática fazia sucesso entre os jovens. A influência vinha dos livros de um desconhecido com nome exótico. Malba Tahan era um autor lido no mundo todo. Pelo nome adotado nas capas de seus livros, todos entendiam que era um árabe. Ledo engano, Malba Tahan era brasileiro. "O Homem que calculava", sua obra mais conhecida, estava nas prateleiras de todas as livrarias e em muitas residências.

Julio Cesar de Mello e Souza, seu verdadeiro nome, escreveu 69 livros de contos e 51 sobre matemática. Em 1995, venderam mais de dois milhões de seus livros. "O Homem que calculava", escrito em 1949, mostrava sua fascinação pela cultura árabe, ensinando a matemática mediante a narrativa da vida do calculador Beremiz Samir. Belos contos cheios de enredo e problemas matemáticos. Esse livro, em 2001, já estava na quinquagésima quarta edição no Brasil.

Malba Tahan sempre foi um crítico arguto dos métodos de ensino brasileiro, especialmente os utilizados na instrução de matemática. Afirmava: "o professor de matemática é um sádico, que ama fazer parecer tudo mais complicado". Ele estava muitas décadas à frente dos educadores brasileiros. Julio Cesar foi o único brasileiro que teve uma norma legal redigida especialmente para que ele usasse seu pseudônimo na carteira de identidade.

Ele era um humanista. Longe da política e das ideologias, dedicou sua vida à causa dos hansenianos. De cabeça aberta e sem preconceitos, editou, durante dez anos, a revista Damião, que pregava o reajustamento social desses doentes. A dedicação era tão grande que, em seu testamento, pediu que lessem, à beira de seu túmulo, uma última mensagem de solidariedade aos hansenianos. Quanta diferença!

Teus melhores inimigos o saúdam

O analfabetismo matemático é vergonhoso e mina o futuro

Há anos vimos a impotência de um importante candidato à presidência da República de fazer uma simples divisão, ele não entende de casa decimal e é completamente ignorante em matemática. Sempre imaginei que se me dessem a oportunidade de questioná-lo em um debate na televisão, lhe perguntaria quanto é 6x9 ou quanto é 13 ao quadrado.

O pior foi assistir ao vídeo em que ele confirma as suspeitas que o cercavam de inventar números para as desgraças do país. Quantas crianças passando fome? Ele respondia hora com o número absurdo de 30 milhões, hora com 20 milhões. Essa é a média de nossos políticos, a única conta que sabem fazer... Bem, deixa prá lá. Além deles, os empresários e funcionários públicos mais graduados, sofrem do mesmo analfabetismo matemático.

É incrível, mas é perfeitamente possível fazer parte da classe dominante brasileira e ao mesmo tempo ser tão ruim com números. Mesmo os que recebem a melhor educação que o país têm a oferecer. Recentemente foi observado um importante mandatário de nosso Estado se enrolando sobre o custo da contratação de policiais.

A maioria de nossa elite, econômica ou intelectual, são autoindulgentes, como se ser ruim em matemática fosse uma coisa sem importância, como se fosse ter uma queda por quibe ou pizza.
Poucos, dessa elite, acham bom ser analfabeto, mas acham bom ou pelo menos inócuo ser analfabeto matemático. Não é nada bonito. É vergonhoso. E se tiver uma posição pública ou empresarial de responsabilidade, perigoso. Muito perigoso. Suspeito que parcela de nossas mazelas decorrem desse analfabetismo de quem ninguém fala e poucos escrevem.

Seria altamente recomendável que todas as empresas e órgãos públicos cuidassem melhor de seus contratados, eles têm de conhecer razoavelmente matemática. Pode ser amedrontador. Um tanto preocupante. Mas seria um bom começo. Ainda tenho vontade de perguntar quanto é 13 ao quadrado para o "deus" da política nacional.

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