Escondida no Centro, há 80 anos Terezinha vive em casa entre plantas e cores
Mesmo em um ponto movimentado do Centro, Tereza consegue acordar com a natureza por perto.
Uma risada gostosa, o cheirinho das plantas e o carinho do cachorro Bingo. É assim que as visitas são recebidas na casa de dona Terezinha Martins Sobral, de 80 anos, que vive praticamente escondida numa das ruas mais agitadas de Campo Grande. O clima rústico e antigo é reforçado pela arquitetura original da construção nos fundos de um terreno que nunca é visto da rua.
Depois do portão, é preciso atravessar um longo corredor e descobrir que mesmo estando em um ponto movimentado do Centro, Tereza consegue acordar com o som dos passarinhos e o barulho das folhas que balançam com o vento. “Às vezes eu esqueço que moro no Centro. Aqui dentro sinto uma paz tão grande”, descreve a dona.
Os números antigos na fachada e os detalhes da arquitetura já anunciam que ali encontraríamos uma personagem que também conta a história da cidade. Nascida em Campo Grande, Terezinha é a única pessoa mais velha da família ainda viva. Todos os cinco irmãos já faleceram e ficaram os sobrinhos, um deles, arquiteto, admirado pela tia. “É o Mario Sérgio Sobral, ele sabe lindamente de arquitetura e ama essa casa”.
Mas quem cuidou da reforma e de detalhes tão delicados que hoje descrevem a residência de Terezinha não foi Mário, mas o sobrinho Luiz Carlos Sobral, que partiu há alguns anos, depois de ser atropelado no Centro. “Eu brinco que ele era um arquiteto de coração. Tinha a marcenaria como profissão e fez todas essas portas e janelas que você está vendo”.
Nas memórias, além da vida inteira vivida ali, uma parte da parede com o tijolo original aparente segue intacta, para ser história. “É gostoso poder conservar as memórias. Luiz gostava muito disso também, por isso, renovamos a pintura, mas nunca quisemos trocar o azulejo da cozinha”, diz calculando 50 anos para o revestimento braço com detalhes rosas.
Terezinha conta que foi secretária do ex-governador Wilson Barbosa Martins durante 14 anos e depois mudou-se para o Rio de Janeiro para trabalhar em um banco. Hoje, ela divide o tempo entre a casa campo-grandense e a carioca, ambas com aspectos antigos e rodeado pelas plantas para não perder o clima de natureza que sempre fez parte da casa. “Durante anos moramos na casa da frente, mas com o tempo ela foi ficando enorme só para mim. Mario e Luiz então compraram essa casa no fundo, que já existia, mas só precisava de uns reparos”.
Para dar vida aos ambientes, o sobrinho escolheu pintar cada cômodo de uma cor, onde pudessem morar e trabalhar de forma criativa e ao mesmo tempo ter um lugar para desacelerar o ritmo em uma cidade que só cresce. “Ele sabia das cores como ninguém. E eu também sempre gostei muito de arte, então fiz curso de decupagem em alto relevo e passei a fazer objetos de decoração para a casa”.
A sala é cor de rosa, o corredor amarelo, a varanda azul e, a edícula no fundo, é verde. Para compor a decoração, muitos móveis de madeira, todos feitos por Luiz. Na parede da área externa, caixotes formaram um paredão para abrigar as plantas e um banheira antiga foi colocada no quintal para Terezinha plantar o cheiro verde.
A casinha parece abraçar a dona que se sente em um lar confortável. “Se eu morasse em apartamento não viveria tão bem. Essa casa é o meu refúgio diário”
O muro baixo ainda permite um bate papo com a vizinha, que também vive em uma casa com décadas de história na mesma rua. “Quando nasci aqui, não havia quase nada, a cidade terminava ali na Afonso Pena. Com o tempo foi crescendo, as casas antigas se transformando em comércios e a gente resistiu”.
Outro motivo importante que leva Terezinha a viver por ali é o valor histórico. “É uma pena Campo Grande não saber conservar tantas memórias. Vejo muita casa sendo derrubada ao invés de ser restaurante e manter sua história. Aqui tenho sorte, as casas continuam antigas e pelo visto os donos não querem mudança, mas eu prezo muito por isso”.