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Artes

"Joelma" pedala pelo Centro para depois contar no teatro o que sabe da vida

Naiane Mesquita | 19/11/2015 22:18
"Joelma" pedala pelo Centro para depois contar no teatro o que sabe da vida
Fábio Vidal como Joelma durante intervenção urbana no centro de Campo Grande (Foto: Marcos Ermínio)

A bicicleta azul, que parece sair de outra década, leva para lá e para cá, a mulher de cabelos longos e pretos, sobrancelha fina e feições fechadas. O trajeto de Joelma poderia ser na pequena cidade de Ipiaú, no interior da Bahia, onde nasceu e voltou adulta, mas é realizada em Campo Grande, sob olhares curiosos de uma população com pressa.

"Joelma" pedala pelo Centro para depois contar no teatro o que sabe da vida
Algumas pessoas tentavam entender o que acontecia enquanto Joelma pedalava para a cidade. Um aviso sonoro seguia o ator explicando a data e horário da peça

Joelma é interpretada pela ator baiano Fábio Vidal, que tentou ao máximo extrair os gestos e a “alma” de sua inspiração de mesmo nome. Uma das primeiras transexuais do Brasil e da Bahia, a personalidade da cidade interiorana do nordeste sempre povou a memória do cineasta e diretor Edson Bastos, que cresceu na mesma localidade que sua inspiração.

“Minha formação é o cinema e no meu trabalho como cineasta é trazer esses personagens da minha cidade para o cinema. Comecei a pesquisar a vida de Joelma desde 2006”, afirma o diretor.

A intervenção que Fábio fez na tarde de ontem em Campo Grande, passeando com a bicicleta pela cidade divulgando a peça, se assemelha a um comportamento da personagem no passado baiano. “É como ela fazia. Até hoje ela chama a atenção na cidade, é impossível não parar para observar, ela sempre usa roupas coloridas, a forma de ela falar é sempre expressiva. Ela sofria bastante preconceito”, ressalta Edson.

"Joelma" pedala pelo Centro para depois contar no teatro o que sabe da vida
O diretor e idealizador do projeto Edson Bastos

Encontrei Fábio nos bastidores da peça, que estreou ontem na cidade e segue com apresentações até domingo, às 20 horas, no Teatro Aracy Balabanian.

Caracterizado como Joelma, Fábio parece incorporar desde então os traços da personagem, com exceção de quando fala sobre o temperamento forte dela. Baseado em fatos reais, mas com a liberdade de uma ficção, diretor e ator precisaram transformar alguns trechos para compor o filme e a peça.

“O Edson já tinha me falado, ela não vai querer te receber, vai durar uma hora, uma hora e meia até convencê-la. Eu imagino que ela não teve uma vida fácil, ela foi muito agredida, tem um temperamento muito na defensiva. E foi exatamente assim, quando cheguei na casa dela, expliquei que era o ator e fui recebido com um 'lá vem esse povo tirar minha tranquilidade'”, ri.

"Joelma" pedala pelo Centro para depois contar no teatro o que sabe da vida
Fábio precisou vencer o temperamento de Joelma para interpretá-la no filme e na peça

Fora isso, as expressões durante as pedaladas pelas cidades onde a turnê da peça acontece são muito variadas. Em Campo Grande, as pessoas pareciam confusas, as vezes mais preocupadas com o trânsito ou o ônibus, alguns acenavam, outros acompanhavam com o olhar. Enquanto, o Lado B esteve com Fábio não houve ofensas.

Mas, em Cuiabá foi diferente. “Tem todos os tipos de reações, a última experiência em Cuiabá foi de muito estranhamento, de rostos fechados, agressivos. Eu trabalho muito com a questão do olhar, se me olham de uma forma eu retribuo do mesmo jeito”, frisa.

"Joelma" pedala pelo Centro para depois contar no teatro o que sabe da vida
Gal Costa faz parte da trilha sonora do peça

Aos 71 anos, Joelma só deixou de sofrer o preconceito na cidade natal após a exibição do filme e depois com a criação da peça. “Essa aproximação é muito benéfica. Quando entendemos que em menor ou maior grau que pertencemos a minorias, ter a consciência que a formulação de pensamentos, de opiniões são estabelecidas por uma cultura, não sou eu que tenho de forma nata, isso é determinado por crenças e pensamentos que vem pronto da família, da escola, do meio em que vive, de como a mídia apresenta o assunto”, acredita.

Para o intérprete de Joelma estamos em uma guerra. “É uma barricada, uma frente de guerra política com esse tipo de trabalho, quando a gente estabelece ideias de respeito ao outro, respeito as diferenças, ao que você não entende, não compreende, não querer a morte, não ter aversão ao que seja desconhecido”.

A peça tem tradução em libras e legenda em português. O preço dos ingressos é de R$ 10,00 (inteira) e R$ 5,00 (meia-entrada). O Teatro Aracy Balabanian fica na rua 26 de agosto, 453, centro.

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