Após 27 anos, barbeiro vai mudar de endereço e levar mascotes Dilma e Erundina
O salão é uma portinha na Rua 15 de Novembro, ao lado do Camelódromo, em frente ao Mercadão. Dos dois lados há tapumes, por isso ele passa até despercebido. Na frente, uma plaquinha informa o preço do corte de cabelo: R$ 10,00. Há algum tempo também informava, na escrita a giz, que ali trabalhavam profissionais qualificados. Mas como alguém sempre apagava o recado e escrevia palavrões, o dono acabou com a propaganda.
Era um quadro tão simples, com uma afirmação tão séria, que servia de cena capaz de gerar um sorriso pelo contraste com a casinha simples que abriga o salão, um dos tantos localizados no Centro da cidade.
Sérgio Ferreira de Lima, de 45 anos, trabalha e mora no mesmo lugar desde 1988. Já faz parte da paisagem em um dos pontos mais movimentados de Campo Grande. O proprietário pediu o ponto e, depois de 27 anos, o endereço dele vai mudar. Ainda meio sem rumo, pretende conseguir um novo local para morar, mas longe do Centro, para levar suas duas companheiras, as cadelinhas Dilma e Erundina, uma prova da tendência política de esquerda.
Ele decidiu que ia ser cabeleireiro ainda cedo, aos 18 anos, fez um curso profissionalizante em Campo Grande para se dedicar à área. “Era década de 80, assim como hoje, as pessoas queriam fazer concurso, trabalhar para o governo. Eu pensei: tem que ter gente para fazer as outras coisas, vender a pipoca do cinema e cortar o cabelo. Eu escolhi fazer isso porque eu gosto. Não para ganhar dinheiro, por isso até hoje eu não tenho”, brinca.
As paredes são azuis e a “decoração” fica por conta das dezenas de tesouras e escovas penduradas na parede. Ao longo dos anos ele foi mudando, deixando o salão mais confortável. Porém, não mais bonito, já que, segundo ele, "homem não liga para essas coisas", e a clientela hoje e 90% masculina.
Sérgio jura que atende cerca de 20 clientes por dia. Gente que passa por ali e aproveita o pouco tempo e o preço barato para "passar a máquina" na cabeça. Mas também há clientes que colecionam anos de fidelidade, como Nélson Souza, de 46 anos, que contabiliza 23 no mesmo salão.
“A primeira vez que eu vim, foi porque era perto do ponto de ônibus e então fazia parte do meu caminho, bem no Centro, ai gostei do trabalho e fiquei freguês”. Desde então, volta todos os meses. Em março, o corte de cabelo foi ao som de Milionário e José Rico.
Mas o cliente, se quiser, pode opinar na escolha da música ou procurar a foto do corte de cabelo preferido no computador. Sérgio conta que apesar da cara de antigo, "tudo ali funciona com ajuda da internet", comenta com orgulho de estar “inteirado” com a rede.
Outro diferencial do salão é a geladeira com cerveja vendida a preço de custo. Vez por outra, ele abastece para agradar aos clientes. A ideia é que eles se sintam a vontade. Até por isso ele trabalha de bermuda. “Aqui não tem formalidades”.
Até o fim do mês, ele continua morando na casa e trabalhando no salão, que no espaço da garagem. Depois, Sérgio espera já estar em outro prédio, onde também seja possível montar um salão, mas desta vez na periferia. Ele conta que em 2012 fez um curso para se atualizar no Senac, que é mais voltado para o público feminino e nunca usou o que aprendeu, talvez seja o momento.
“Quem sabe agora eu vá usar. Apesar que eu gosto de atender os homens. Eles são vaidosos, mais básicos”. Sem conseguir avisar todos os clientes dá mudança o cabeleireiro deixa um recado: ”Eu quero agradecer a todos que foram meus clientes nesses anos e pedir desculpa quando eu não fui 100%”, comenta, sem saber ainda para onde ira mudar.