Da riqueza à falência, em mercado só ficou o que está no carrinho na calçada
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É uma das cenas que chama atenção quando a gente vira à rua por engano. Ou passa a procurar outro comércio. Na rua Estevão Alves Corrêa, em Aquidauana, o que sobrou do Mercado Xodó está na calçada. Não tem quem não veja os carrinhos de supermercado já enfejurrados que servem de vitrine para os produtos ‘sobreviventes’ do estabelecimento: alface, abóbora e laranja pelo preço de R$1. A placa que anuncia carne de carneiro e de porco raramente é posta. Só quando tem mesmo.
Por trás do mercado modesto já tiveram vários clientes que inclusive usavam os carrinhos para o leva e trás de compras. Há 30 anos, o dono José Donizete dos Reis, leu a palavra ‘xodó’ numa revista, gostou e decidiu que este seria o nome do comércio meio vermelho, meio rosado. “Antigamente vendia de tudo um pouco”, recorda o proprietário.
Mineiro, de 58 anos, mas instalado há décadas em Aquidauana, hoje Zé diz que vive do que os carrinhos guardam: alface, abóbora e laranja. “Foi dívida, separação, acabou casamento, mercado. Está assim de 2005 para cá”, explica em poucas palavras.
Com o tempo ele se abre e diz que por José Donizete ninguém o conhece e que ele em Aquidauana é o Zé Galinha. Apelido que ganhou por vender galinhas na cidade na década de 80. Daqueles tempos, só ficou mesmo um pequeno sítio que dá as frutas e verduras que abastecem ‘xodó’ e o mercadinho.
A propaganda acaba fazendo com que cliente leve pé de alface para casa. “Eles param, compram pelo impulso”, descreve. Quando pergunto se ali, entre gôndolas quase vazias e um cenário de abandono, ele trabalha sozinho, vem a resposta que está na ponta da língua. “Eu e Jesus. Jesus me dá saúde e eu trabalho”, fala.
Zé Galinha foi rico. “Era bem melhor, eu já fui rico. Mas foi tudo negócio mal feito e hoje ando de mototáxi, à pé”, descreve. Quando surge maior confiança ele acrescenta que na década de 90 tomou um calote de R$ 100 mil. “Se eu tivesse parado, eu tinha recuperado, mas entrei na mão de agiota, de banco e foi para o pau”, resume.
O prédio que abriga o xodó até daria uma grana, mas a estrutura guarda muita burocracia e um rolo dos grandes, que ninguém assume comprar. “Até aparece, mas vê o que tem e desiste”, completa.
A falência parece ter servido de lição. Zé Galinha diz que aprendeu que a vida é assim mesmo. “A gente só sabe as dificuldades quando passa. A vida, como pude aprender, é assim”.
Os pés de alface são vendidos por R$ 2. Já a laranja sai por R$ 1,30 o quilo e a abóbora, por R$ 1,50, também o quilo.
No fim das contas, o mercado Xodó abre de segunda a segunda, até em domingo e feriado a partir das 6h30 da manhã.