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Comportamento

Gêmeos, Henrique e Helena vão conhecer seu "Tô" pelas histórias que o avô deixou

Seu Tô não chegou a ver os netos, mas as crianças vão conhecê-lo pelas histórias e banhos de chuva

Paula Maciulevicius | 07/01/2017 07:05
Gêmeos, Henrique e Helena vão conhecer seu "Tô" pelas histórias que o avô deixou
Seu "Tô" com os filhos: Carla, Paula, Vitor e a esposa Maria Ines (primeira e única namorada desde os 14 anos) na praia em 1991. (Foto: Arquivo Pessoal)

Paula engravidou três anos depois de perder o pai. O sonho do seu "Tô" era de ser avô para poder brincar de mangueira e levar os netos para tomar banho de chuva contrariando o possível "não" dos pais. Veterinário, Heitor Heleno de Souza Faria tinha 64 anos. À época, lhe deram três meses de vida, mas ele desafiou com otimismo o câncer no cérebro e sobreviveu mais de um ano. 

"Brincalhão e sério ao mesmo tempo". A descrição carrega consigo uma risada, talvez a mesma que a Paula menina tenha dado em todas as vezes que o pai soltava bolhinhas de sabão. Funcionária pública federal, são as histórias que ela e a família guardam na memória, que vão dizer aos filhos gêmeos de Paula: Helena e Henrique, quem era o avô.

"Ele era carioca, se formou e veio para Mato Grosso do Sul. Minha mãe também veio depois e eles se casaram. Eles namoravam desde os 14 anos, foram os únicos namorados um do outro", conta Paula Gonçalves Faria, de 35 anos.

Gêmeos, Henrique e Helena vão conhecer seu "Tô" pelas histórias que o avô deixou
Veterinário, diversão do pai era juntar as crianças e brincar com água no quintal.

Com o tempo, os familiares se estabeleceram todos aqui e os três filhos de Heitor já nasceram em Campo Grande: Paula, Vitor e Carla. O apelido "Tô" vem de "Totô" dado pelos colegas de faculdade no Rio de Janeiro.

Quando seu Tô descobriu a doença, a filha que tinha um certo problema de relacionamento, passou a vê-lo de outra forma. "Ele ficou muito otimista. A gente brigava muito, eu não compreendia muito ele e a doença aproximou a gente. Ele ficou uma pessoa muito doce", recorda.

Não se sabe se a doçura vinha pela área do cérebro afetada pelo câncer ou porque foi a forma mais natural dele lutar contra a doença. "Todo mundo fala que uniu ainda mais a nossa família. A doença deu uma chance para a gente e meu relacionamento mudou muito", relata. 

Gêmeos, Henrique e Helena vão conhecer seu "Tô" pelas histórias que o avô deixou
Uma das histórias que ele repetiu mil vezes foi de que quando ganhou um campeonato de twist, o que lhe deu o status eterno de bom dançarino.

Seu Tô não chegou a ver os netos. Henrique e Helena nasceram no início de dezembro. "O sonho dele era ser avô. Queria porque queria um neto. Tentei engravidar sete anos, quando eu ia fazer o tratamento de fertilização, descobrimos a doença dele e fiquei na maior dúvida", conta. 

Os três meses dados pelos médicos foram transformados em mais de um ano. Heitor passou por uma cirurgia complicada, de risco e saiu dela falando. Depois de partir, Paula se separou, casou de novo e quando fez o tratamento, engravidou de gêmeos.

"Eu acho que ele deu uma ajudinha e onde estiver, tenho certeza de que está feliz. O tempo todo eu fico pensando que se ele estivesse aqui, ia curtir. A dor se transformou nisso numa saudade gostosa", narra. 

Os gêmeos ainda têm só um mês, mas quando crescerem, vão ouvir toda narrativa de quem era o vô "Tô". "Vou contar todas as histórias que ele contava mil vezes e as brincadeiras que fazia", promete a mãe. 

O quintal de casa era o lugar preferido da família e o que traz as melhores lembranças da infância. "Quero passar essa parte para os meus filhos e a minha sobrinha. Os banhos de mangueira, as bolhinhas de sabão. Me lembro muito dele brincar com água, fazer cachoeira e sempre que chovia, os pais diziam 'não pode', mas ele não, era: 'vamos todo mundo tomar banho de chuva''", lembra Paula.

Gêmeos, Henrique e Helena vão conhecer seu "Tô" pelas histórias que o avô deixou
Paula com os netos de Tô, que vão conhecer o avô pelas histórias.

Sem saber o final das histórias, o pai misturava todos os contos infantis, o que deixava as crianças bravas e hoje traz saudade à Paula adulta. "Ele contava tudo errado ou misturava uma com a outra", ri. 

Além das historinhas, as próprias vivências também eram relatadas infinitas vezes. "Contava mil vezes a mesma coisa, que um dia ele venceu um campeonato de twist no Social Clube. Ele se achava um ótimo dançarino. Também contava que jogou futebol com o Didi dos Trapalhões", recorda.

Essa eles não conseguiram confirmar, mas que ele tinha uma amizade com João Barone, baterista dos Paralamas. "Uma vez eles vieram fazer show na exposição e nós fomos com a família. Ele dizia que ia entrar porque era muito amigo. A gente nunca acreditou e ele botou todo mundo para dentro do camarim. Era verdade mesmo", gargalha Paula. 

E antes que a gente pergunte o que ficou de quem partiu, a filha se antecipa como quem sabe o que fazer para passar o legado adiante: "São essas as histórias do seu Heitor que vão ficar". 

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