Joice não imaginava ter uma festa de 15 anos e se emocionou com surpresa
Adolescente moradora da favela no Noroeste já tinha perdido a esperança, mas aniversário teve príncipe e troca de sapatos.
Os sonhos são mesmo indestrutíveis. Eles resistem aos caos, às dificuldades e às tragédias. Joice Camile Santos de Oliveira sabe bem disso, principalmente, depois de ganhar uma baita festa de 15 anos. A adolescente moradora da favela do Noroeste jura que quando pediu a festa imaginou um bolinho com balões.
Com direito a príncipe na entrada, valsa com o pai e até a tradicional troca de sapatos, a comemoração superou a imaginação de Joice. A garota trata seu aniversário como “a festa”. Sempre que perguntam algo sobre a comemoração ela faz questão de frisar que não foi um simples evento. Com os olhos ainda brilhantes, a menina lembra que teve direito a tudo, como em festas de filmes.
Ela faz parte do Projeto Recriar criado pela pastora Maria Izabel conta com muitos voluntários. Ela conseguiu arrecadar doações de bolo, decoração, docinhos, dia de beleza, roupas, sapatos e o jantar. A festa foi no salão do projeto.
Oito pessoas moram no barraco montado na comunidade, os pais de Joice e mais cinco irmãos de 14, 12, 7, 4 e um bebê. Ela lembra que apesar da vontade de ter uma festa já tinha se conformado com a situação financeira.
“Pensei que seria um bolinho com alguns balões, mas vivi um sonho. A gente mora na favela, mas também tem vontades. Via outras meninas tendo festa e pensava que eu também queria viver aquilo. Mas como meu pai e minha não tinha condições eu já tinha perdido as esperanças. Foi, então, que eu cheguei a falar para a pastora e para a Thamara que gostaria de ter uma festa de 15 anos. Elas disseram que fariam a festa e nem acreditei muito. Não foi uma festa qualquer, foi ‘a festa’, nunca imaginei”, pontua Joice.
Joice levou toda família e chamou todos os amigos parta a festa que reuniu cerca de 100 pessoas no último dia 10 de maio. O príncipe da festa foi o primo de Joice, que também frequenta o projeto. “Minha família gostou muito, minha mãe agradeceu muito a Deus e a pastora e todos que ajudaram. Agora as outras crianças estão loucas para fazerem 15 anos”, disse.
A adolescente conta que mais de ter tido o sonho realizado, o projeto transforma sua vida a cada dia. Ela garante que em dois anos, as ações realizadas pelo grupo mudaram sua forma de viver, apesar de todas as adversidades.
“Muitos que chegam aqui ficam presos, tímidos. Eu mesmo só ficava na minha e se mexesse comigo eu já queria brigar. Agora eu aprendi a socializar e a conversar com as outras pessoas. Se não tem projeto já fica todo mundo triste em casa”, conta.
Arroz e salsicha – O projeto começou há dois anos com um pacote de arroz, um pouco de salsicha e óleo. Na garra, mãe e filha foram desenvolvendo as ações até o trabalho social ganhar forma e, claro, muitas crianças.
Mas a ideia não é tão nova assim. A pastora e missionária Maria Izabel trabalhou dez anos na evangelização no Presídio de Segurança Máxima. Foi dentro das muralhas da unidade, conversando com detentos, que via que o problema surgiu na infância. Maria decidiu trabalhar na prevenção, para acolher as crianças.
Ela lembra que durante seu trabalho como missionária, nem a situação de miséria em pontos da África a chocou tanto quanto a escassez, pobreza e abandono de crianças da comunidade existente no Noroeste.
“Se as crianças são o futuro, como as abandonadas poderiam dar bons frutos? Mas como, se o presente e decadente? A maioria do projeto mora no lixão desativado. Então percebi que minha atitude poderia ser uma prevenção. No caso da Joice, ela foi a primeira a chegar. Eu conheço a história dela e me emociono em saber que já mudou”, conta.
Muitas crianças do projeto já são bateristas e pensam em faculdade. A pastora Maria Izabel costuma dizer que não trabalha com crianças carentes, mas com realezas e incentiva as crianças.
Um deles é chamado de grande empresário. Abdias Ferreira Cardozo de 10 anos ajuda a mãe a vender sabão. Ele, os pais e parte dos irmãos moram no lixão desativado.
“Eu estudo de manhã e ajudo minha mãe na venda do sabão. O sabão líquido é R$ 7, mas a gente também vende mandioca com casca a R$ 3 e sem casca a R$ 3,50. Aqui moram três irmãos e mais dois estão em Anastácio, mas já são maiores. Viemos para cá porque lá estava muito difícil o desemprego”, disse.
“Estamos recuperando as famílias também. Já internamos uma mãe que tinha problemas com o álcool e eu “encho o saco” dos amigos para conseguir pagar a clínica. Hoje temos uma pessoa recuperada, pois prometemos aos filhos que ela seria restaurada. Tinha criança aqui que o sonho era ser presa na cela do pai e isso me chocou, mas isso está mudando. Lá na África as crianças ficam sozinhas porque os pais morreram, aqui não, elas ficam órfãs de pais vivos. Mas eu também choro de alegria, pelas mudanças. Sei o nome de todos e faço questão. As pessoas não respeitam as crianças, não ouvem as crianças, mas isso tem de mudar”, disse emocionada.
Neste domingo, barbeiros da Vintage foram até o projeto para cortar os cabelos da criançada. “Uma das minhas clientes é voluntária no projeto e na quarta recebemos um convite. Na hora, decidimos participar. Nós já estávamos procurando algo para ajudar crianças e enquanto tiver ações aqui vamos participar”, disse o barbeiro, Fernando Gabriel, de 20 anos.
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Confira imagens do aniversário e fotos da Marina Pacheco durante o projeto neste domingo:
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