Senhor que vive na janela da casa de madeira do Piratininga já morou no Iraque
![Senhor que vive na janela da casa de madeira do Piratininga já morou no Iraque Senhor que vive na janela da casa de madeira do Piratininga já morou no Iraque](https://cdn6.campograndenews.com.br/uploads/noticias/2020/03/10/1ooe3uh0ujkq0.jpg)
Dono da casa de madeira mais antiga do bairro Piratininga, não tem vizinho que não sorria para seu Almir. Senão for na primeira vez, será na segunda e se ainda assim, o sorriso não abrir, na terceira vai. Confiante de que a alegria é o que embeleza o rosto e a vida, seu Almir passa as manhãs na janela de casa, ora acompanhado da esposa Eurides, ora só. Mas sempre com a curva do riso no rosto.
De idade, Almir tem 68. De vida naquela casa, 46. Verdinha, de “tauba”, a fachada ostenta um dono que já morou até no Iraque. Em um ano, o encarregado trabalhou em 850 quilômetros de asfalto de Bagdá até a fronteira da Síria. Pelo menos é isso que ele conta.
“Eu vim do Sergipe para Belo Horizonte fazer um teste na Mendes Júnior para ir para o Iraque. Passou 20 dias de aula, pra aprender assim, a língua mais ou menos. É que eu ia lidar com estrangeiro”, lembra Almir Carvalho de Queiroz.
![Senhor que vive na janela da casa de madeira do Piratininga já morou no Iraque Senhor que vive na janela da casa de madeira do Piratininga já morou no Iraque](https://cdn6.campograndenews.com.br/uploads/noticias/2020/03/10/58l5p6xnvove.jpg)
Em 1981, ele deixou a mulher e os três filhos aqui. “E era assim, num dia você ensinava a fazer isso, no outro, mandava fazer a mesma coisa e eles já não sabiam”, lembra. As pausas para orações no dia também não lhe saem da memória.
E até mesmo quando foi para o Iraque, a casinha de tábua continuou ali. Construída por Almir ao lado dos sete irmãos e dos pais, em 1969, quando a família chegou em Campo Grande. Se ela continua igual até hoje? Pouca coisa mudou. Saiu a marcenaria de seu Almir, a garagem virou quarto improvisado e só o que não sai dali, é ele na janela.
“Eu trabalhei o Brasil inteiro, morei em São Paulo, Belo Horizonte, Aracaju, Belém do Pará...” O sotaque não nega, Almir é baiano de nascimento, do município de Porto Seguro.
“Por que ela é verde? Ah, porque eu gosto”, simplifica a vida. Todo dia, é a mesma coisa na casinha de madeira. Seu Almir levanta 5h da manhã e compra pão para a casa dele e as outras quatro dos irmãos que ocupam a mesma quadra e são todos vizinhos.
“O que eu acho da minha casa? Ela é minha, é boa e me guarda. Tem gente que me pergunta: por que você não quebra isso aí? Eu não tenho condição, não sei dever e não compro fiado. Nessa minha vida eu aprendi que tendo cantinho pra repousar quando for frio e chuva, já é o suficiente”, ensina.
Já são 43 anos de casados com dona Eurides e o segredo? É ser romântico, garante o senhorzinho, que tasca um beijo de tirar gargalhada de quem vê a cena. “E olha que ela fotografou”, se surpreende Eurides Maria Soledade Queiroz, de 69 anos.
Quem passa pelas manhãs pelo bairro, conhece o casal e não tem quem eles também não saibam quem é. “Desde o menor ao mais pequeno”, brinca Almir. “É para ver alegria e fazer alegria nas pessoas. Eu falo com aquelas que sorriem e as que não respondem, eu oro por elas”, diz.
“Na primeira vez dou oi. Ela vira a casa. Na segunda: oi, tudo bem? Nem responde, mas na terceira, só olhar que já diz bom dia”, narra. O diálogo aconteceu mesmo e ele conseguiu o que queria, arrancar o riso.
“É que é assim, se for gente sorridente, vai ter vida longa minha filha. E isso eu sempre tive comigo, de chamar os outros de filha, filho, minha filha”. É, além do sorriso, tem carinho na porta da casa de madeira mais antiga do Piratininga.