Gabriel viu na arte do preto e branco a chance de vencer depressão
"Gaphomet" venceu depressão por meio dos desenhos e serigrafias; com amigos artistas, fez coletivo e hoje trabalha com estamparia
"Monocromático, brega e sem graça”. É assim que Gabriel Martins, o artista Gaphomet de 22 anos, se descreve. Antes de descobrir o jeito natural para elaborar desenhos e pinturas em preto e branco com uma "carinha" de anos 80, ele passou por uma tristeza absoluta, a depressão. Mesmo com dificuldades na vida, inclusive pela doença, nunca desacreditou de si.
Após consecutivas tentativas, entrou para o curso de Artes Visuais da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e atualmente trabalha ao lado de um coletivo de amigos na arte da serigrafia, fazendo camisetas e estampas "maneirinhas" – se encontrou.
"Cresci num bairro sem muita estrutura, em uma escola pública com condições precárias e zero contato com a arte. Então quando comecei a faculdade, meu horizonte se expandiu em muitas maneiras. Descobri que podia expressar o que eu sentia por dentro em qualquer superfície, com diferentes tipos de técnicas e materiais", revela.
Sua primeira crise depressiva veio mais jovem ainda, sem conseguir passar no curso que tanto queria, à espera da dispensa militar e sem pretensão de emprego. Da sua mãe, ganhou o único incentivo: um curso de pintura a óleo. Por pouco mais de 1 ano, essa foi a sua única interação social com pessoas fora da família. "Foram tempos difíceis. É difícil de explicar o que eu sentia. Só alguns anos mais tarde consegui suporte psicológico com ajuda da terapia", relembra.
Após consecutivas tentativas no Enem, passou na federal. "Joguei no papel, na lona ou na tela do computador por meio da arte todas as tristezas e raivas acumuladas. Comecei de maneira tímida a criar um personagem pra falar sobre os meus sentimentos: um astronauta", revela.
Só de ver uma luz no fim do túnel foi algo libertador", diz.
Inicialmente de forma anônima, só depois que Gabriel teve a coragem de mostrar o seu rostinho e falar abertamente dos seus "fantasmas". "Costumo desenhar o que sinto, o que me toca, o que me deixa apaixonado ou revoltado. Já disseram que o que eu faço é poesia visual, e sinceramente, gostei de ouvir isso", brinca.
Com estética ligada ao preto e branco, alto contraste e referência ao punk dos anos 80 e 90, Gabriel conta que se adaptou melhor aos desenhos monocromáticos. "Minha adolescência foi acompanhada do rock, do movimento punk mais agressivo. Os fanzines 'sujinhos' me encantavam, com marcas de xerox, os flyers feitos a mão, tudo incrível. Depois conheci o hardcore, em especial o melódico. A partir daí criei minha própria linguagem", explica.
"Comecei de forma simples, com uso de lápis e papel para, só depois, fazer traços em carvão vegetal e até mesmo ganhar uma mesa digitalizadora. Apanhei muito para chegar no resultado de hoje, que agora sim me agrada", confessa.
"Peita Eu" – Com uma dupla de amigos também artistas, Gabriel se encontrou na serigrafia, isto é, na arte das estamparias em camisetas "descoladas". "A ideia surgiu em 2019, justamente pela carência desse tipo de trabalho nos grupos sociais em que fazíamos parte", observa.
Levando o projeto até um professor do curso, sempre no final das aulas a galera se reunia para aprender novas técnicas e movimentar a cena. "A proposta da Peita Eu é realmente ter um coletivo de artistas, com traços, estilos e temáticas diferentes uns dos outros. Assim, possamos atingir mais pessoas e fazer nossos desenhos circularem na forma de estampas em camisetas".
Além de Gaphomet, os artistas Ana Julia Montagna, Victor Macaulin e Rodrigo Bevenuto também integram o grupo que, até antes da pandemia, utilizam os eventos culturais da cena alternativa para dar visibilidade ao coletivo e fazer vendas.
Todas as peças são de corte único e sem gênero. Segundo Gabriel, a nova coleção está para ser lançada muito em breve, entre o final deste mês e início de março. As camisetas irão custar R$ 60,00, com etiquetas personalizadas com logo da marca e bandeira do artista que produziu. Pedidos podem ser realizados via perfil no Instagram.
Na série “Descomplicando a Serigrafia”, também disponível nas redes sociais de Gaphomet, vira e mexe coloca esporadicamente coisas que aprendeu sobre o estudo e prática da técnica de forma gratuita.
Ainda, uma campanha de financiamento coletivo foi lançada para contribuição no seu tratamento psiquiátrico da depressão, além de contar sua história detalhadamente.
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